CAPÍTULO 1

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O que Kyle Blackwing chamava de destino, Archibald DeReifos, ex-monge Naomir, chamava de coincidência. Já o comerciante Atir percebia como oportunidade. Atir era um homem de muita energia, e o encontro entre eles foi um momento alegre. Encontrar um conterrâneo e conversar na mesma língua trazia conforto aos quatro lacoreses foragidos: Kyle, Archibald, Kiorina e Gorum.

O primeiro encontro ocorreu no dia anterior. Na ocasião, Archibald procurava por tinta e penas metálicas para escrever. Foi surpreendido por Alonzo, o braço direto do senhor Atir. O assistente não havia mudado muito, apesar de usar cabelos mais longos seus traços característicos eram os mesmos: magreza e olhos fundos acentuados por olheiras. Alonzo levou o rapaz até seu patrão que ficou muito feliz com o encontro inesperado. Atir contou tudo a respeito dos negócios e que estava morando em Dacs, há alguns meses. Apesar das boas relações que mantinha com os dacsinianos da casa Baltimore, acabou montando a sede da casa comercial Atir em Duir, a cidade portuária mais movimentada da casa Alekzandra. Tratava-se da cidade mais oriental de Dacs. Do porto de Duir saíam os navios dacsinianos que seguiam para as rotas do leste. Estas levavam a Tchilla e a região das Sete Tribos, o Império Keldoriano, as Selvas de Krös, Reinos do Vale Verde, e por fim, até o extremo oriente, os reinos bélicos de Orbech e Almodorask.

Estavam reunidos sob teto de um Lacorês, bebendo vinho dacsiniano, numa conversação bastante animada. O velho comerciante estava vermelho de tanto rir de uma das anedotas contadas por Gorum.  Ele estava sentado, curvado e desajeitado devido ao seu tamanho, incompatível com os móveis. Sempre coçava sua barba grisalha entre uma história e outra.

Um pouco antes, Archibald narrou toda história que tinham vivido desde a saída de Lacoresh passando pelas terras dos Silfos do Mar. Atir e Alonzo escutavam atentamente. Archibald era apenas interrompido por Kiorina que corrigia, quase indignada, detalhes da história. Ao mesmo tempo, Kyle resmungava sobre como ela conseguia se lembrar daqueles detalhes, ou mesmo, sobre a relevância dos mesmos. Como quando Archibald contava sobre a ocasião que Noran falecera ela interrompeu-o franzindo o cenho: – não estávamos em quinze Archie! Éramos treze. – E enumerou cada um dos membros do grupo naquela ocasião.

E assim, contaram sobre bons e maus momentos e muitas vezes os olhos da ruiva ficaram cheios d'água. Mas havia um assunto que escapava da discussão. Kyle introduziu o tema: – Sr. Atir, conte-nos a respeito da situação de Lacoresh.

Atir suspirou. Olhou para baixo pensando por alguns momentos. Removeu o turbante avermelhado revelando sua calvície avançada salpicada por algumas manchas escuras e pintas vermelhas. Era como se todo álcool e gargalhadas tivessem perdido o efeito. Colocou sobre o olho seu monóculo para enxergar bem o rosto de Kyle.

– Vou lhes contar sobre Lacoresh... Como disse antes, a situação era tal que já não era mais seguro para eu e meu pessoal continuarmos de portas abertas por lá. Nós sabíamos que uma mudança no poder estava por vir, não é mesmo Alonzo?

O braço direito estava com uma expressão severa e confirmou com um aceno.

– Eu adverti o Duque Dwain, pouco antes da guerra contra os bestiais, mas ele, teimoso, disse que eu estava imaginando coisas.

Kyle indagou surpreso – você e o duque são amigos?

Atir sorriu e respondeu irônico – digamos que nossa amizade não seria bem vista pela sociedade. Como dizia, não adiantou, o cabeça dura só dava ouvidos ao mago Alexanus.

– Ele foi meu professor – observou Kiorina.

– Sim, ele também faz parte da cúpula dos malditos necromantes, Srta. DeLars.

O queixo da moça caiu. Todos se viraram para Archibald quando disse exaltado – Faz sentido! Por isso fomos enviados naquela investigação. Ele deve ter convencido Heirich...

Oráculo EsquecidoOnde histórias criam vida. Descubra agora