(Outra vez eu estou em um trem, um trem vazio, que não possuí nada em volta além de areia cobrindo todo o lugar que o trem passa, e o céu está sempre laranja. O trem avança, e vultos aparecem do lado de fora, várias e várias vezes, fazendo parecer que na verdade, é o mesmo vulto que vem se repetindo durante o trajeto, e o céu passa de laranja para vermelho, um vermelho escuro, e de repente, minha pele derrete de pouco em pouco, enquanto eu me desespero com aquilo, e então, eu olho para o lado...)
- DANIEL!!! - E meu sonho acaba, e eu vejo Suyen em cima de mim, com suas mãos sobre meus ombros. - O que aconteceu? Você estava se debatendo, e está encharcado de suor! - Eu olhei sobre nossa cama. Os lençóis possuindo minha silhueta marcada pelo líquido salgado que havia saído de meu corpo enquanto eu dormia.
- Eu tive... Aquele mesmo sonho outra vez! - Eu pousava minha mão esquerda sobre meu rosto. Meu cansaço era enorme, mesmo despertando do sono de agora, e Suyen suspirava pesadamente.
- Você devia aproveitar que hoje é o seu dia de folga e ver um psicólogo! Não é normal ter o mesmo sonho por tantas noites em corrente!
- Não preciso de psicólogo! Não estou louco!
- Vai ficar se continuar assim! E lembre-se que nós nos casamos no mês que vem! - Suyen se levantava, arrumando uma muda de roupas, perto do guarda-roupas. - Se você continuar assim, esqueça que eu serei sua esposa! - Eu a observava, e então eu também suspirei, levantando e me sentando na cama.
- Que seja! Eu vou ver isso com algum psicólogo! Mas não pense irei fazer isso com frequência!
- Já é um começo! Inclusive, achei isso entre as roupas! Achei que tivesse jogado fora! - Suyen falava enquanto jogava um boneco na cama, e eu peguei o boneco que me era tão familiar. O boneco era Jack, o bobo da corte. Ele vestia uma roupa verde e vermelha e tinha uma bengala em sua mão direita, sem falar o enorme nariz em seu rosto e seus sapatos enormes e pontudos.
- E eu joguei! Tem certeza de que você não o pegou de volta sem querer?
- Por que eu traria para casa algo que foi para o lixo? Você deve ter se enganado e jogado outra coisa fora!
- EU JURO QUE JOGUEI ESSA PORCARIA FORA!!!
- LEVANTE A VOZ OUTRA VEZ E EU PASSO POR AQUELA PORTA E NUNCA MAIS VOLTO!! - Fechei meu punho em volta do boneco, que tentava dizer alguma coisa, apesar da bateria fraca devido ao tempo. Olhei para o boneco.
- Pequeno Jack! Eu não tenho mais idade para perder meu tempo com brinquedos! - Me levantei, ainda com Jack em mãos, indo até o banheiro e higienizando minha boca, lavando meu rosto em seguida e tomando um banho, colocando alguma roupa limpa. - A comida está pronta?
- Não tive tempo de preparar nada, mas ainda tem o resto do arroz de ontem! Se quiser, você pode pegar alguns pedaços de presunto e esquentar tudo junto!
- Uma empregada daria mais lucro que uma esposa!
- COMO É??
- ... Nada! Não foi nada! - Eu fui para o andar de baixo, evitando mais conflitos desnecessários, mas Suyen parecia não ter encerrado.
- EU ESTOU ARRUMANDO TODA ESSA CASA DESDE AS OITO DA MANHÃ, ENQUANTO VOCÊ FICA RONCANDO NESSA CAMA!! VOCÊ QUE VAI LAVAR ESSES LENÇÓIS CHEIOS DE SUOR?? NÃO, NÉ? É CLARO QUE VAI SOBRAR PARA MIM!! - Pude ouvir o suspirar de Suyen, seguido de lágrimas. - Não precisa comer o resto de ontem se não quiser! Pode pedir alguma coisa ou comer fora! Eu... Eu sin...
- Tem razão! Vou comer algo no caminho! Mais tarde eu volto!
E fechei a porta, batendo-a, e passei para a calçada, caminhando junto de outras pessoas que viviam suas próprias vidas com seus problemas. Bati a mão nos bolsos da calça e encontrei algumas notas de ienes, uma delas eu entreguei para um vendedor de rua que fazia temakis, para que eu pudesse matar minha fome, e de repente, de um dos prédios em volta, um desses limpadores de vidraça havia caído do suporte que era segurado por alguns cabos, e se segurava ainda balançando no ar. Uma pequena multidão surgiu em baixo do homem, talvez para ajudar ou apenas para ver o que aconteceria em seguida, e então, o homem conseguiu se levantar e voltar para o suporte pendurado. A multidão que havia se formado, logo também havia se dissipado, e eu caminhava para um dos consultórios presentes na cidade, com passos lentos, aproveitando o dia de folga do trabalho que eu tinha, não queria desperdiçar tal dia com algo tão sem sal como uma visita ao psicólogo. Chegando ao prédio, vi uma lixeira perto da entrada, e joguei Jack nela, me certificando que dessa vez ele ficaria ali. Entrei no prédio, e apenas uma moça estava na recepção, e quando cheguei perto, ela reparou na minha presença.
- Posso ajudá-lo, senhor?
- É, olá! Eu gostaria de me consultar com alguém que esteja disponível! - A recepcionista me olhou de baixo pra cima.
- Então você não tem hora marcada? - Neguei com a cabeça, com um sorriso sem graça. - Bom, senhor, todos os nossos profissionais só podem dar uma consulta com o agendamento do horário! Mas se preferir, temos alguns estudantes que estão quase formados e que receberam uma licença provisória para consultas voluntárias! Caso queira, você pode se encontrar com algum deles!
- O que? Eu vou ter que me consultar com alguém que nem é um psicólogo?
- É uma escolha sua! Você pode continuar com a mente fechada que você tem, ou engolir o orgulho e falar com alguém treinado para te ouvir e te aconselhar! - Eu ia retrucar, mas ela apontou para uma porta na direita. - Basta descer as escadas e virar para a direita!
- ... Certo! Que seja!
Fui até a porta e desci no prédio, e por algum motivo, as escadas não tinha fim, e o "virar para a direita" nunca chegava, e quanto mais eu descia, uma névoa vermelha surgia e ficava cada vez mais intensa, até que, sem querer, eu bati o rosto em uma parede, caindo para trás, de olhos fechados. Ao abri-los, a nuvem vermelha havia sumido, e eu vi que tinha chegado em uma parte do prédio que ligava as escadas e dois corredores, formado um "T" no térreo. Olhei para a esquerda, e havia uma placa dizendo que só os psicólogos profissionais estavam daquele lado, enquanto do outro lado, outra placa que, dessa vez, dizia que estudantes se voluntariavam para tal serviço. Levantei e passei por várias portas fechadas, com exceção da última, e antes de entrar, bati no batente da porta para chamar a atenção de quem fosse que estivesse ali dentro.
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Ficção GeralExplorações, registros, conhecimentos, comentários sobre tais coisas, eram coisas que Erina admirava no homem da sua vida, seu pai. Desde sempre, a garotinha do papai mostrava interesse na profissão do homem que cuidava da família, e em resposta, o...