Já havia passado um tempo desde que o silêncio havia se estabelecido outra vez, e enquanto Minashigo olhava pela janela do ônibus, eu me mantinha entretida com o que quer que estivesse tocando em meus fones, ao mesmo tempo em que olhava alguns dos passageiros fazendo o que quer que desse para fazer estando em um veículo em movimento. Com o mísero silêncio que surgia entre uma faixa e outra, um outro som surgia, e bem ao meu lado, e quando virei o rosto na direção do ruído, a vermelhidão no rosto de Minashigo e sua mão em sua barriga denunciava sobre o que era tal murmúrio, e nisso, Minashigo suspirou.
- Acho que agora eu vou querer um daqueles Golubtsis!
Um sorriso sem graça surgiu no rosto de Minashigo, e eu retribui da mesma forma enquanto abria a mochila para pegar um dos Golubtsis, entregando-o para ele. Ao fechar minha mochila, meu celular tocou, me surpreendo por ter sinal de rede em meio a estrada. Quando peguei o aparelho, era minha mãe me ligando.
- Tudo bem, mãe?
- Sim, filha! Só liguei pra saber como você estava!
- Estou bem, mãe! Eu ia ligar mais tarde! Pensei que estivesse ocupada nessa parte da manhã!
- E estou, mas sabe como coração de mãe é! Eu precisava de uma notícia sua ou não ia conseguir manter a calma!
- Eu estou bem, mãe! Pode ficar tranquila! Estou na fronteira entre a Finlândia e a Suécia agora!
- Então já cruzou dois países, é? Queria tanto que seu pai visse isso! Filha, vou ter que desligar, mas estou mais tranquila por saber que você está bem! Se cuida!
- Você também, mãe! - E do outro lado da linha, a chamada era encerrada, e olhando para o lado, Minashigo me observava de canto de olho, e ao perceber que eu olhava diretamente para ele, desviou o olhar. - O que foi?
- Nada! É que... Foi meio inesperado isso!
- É, eu também achei! Eu deixei pra ligar pra minha mãe mais tarde, mas ela quem ligou primeiro!
- Não, eu falo sobre ter rede aqui! Já faz mais de duas horas que estamos na estrada e, teoricamente, não deveria ter sinal de linha!
- Ah, então é isso! Confesso que eu me espantei com isso também haha! - Eu coçava a nuca com a mão direita, envergonhada, enquanto guardava o celular no bolso com a esquerda. O silêncio voltou, e sem eu perceber, eu estava sorrindo enquanto pensava no que estava quase dizendo, até realmente dizer. - Pra alguém que não falava muito, você falou bastante na casa de aluguel e no metrô!
- E pra alguém que deixa para os outros se abrirem, você está fazendo várias perguntas!
- Eu gosto de conhecer bem os amigos que eu faço! - Enquanto eu falava, Minashigo mordia o Golubtsi, e ao término da minha fala, o mesmo se engasgou com o pedaço em sua boca, por pouco tempo. - Céus! Tudo bem?
- Tudo! É só que... Amigos? Faz o que? Uns dois dias que nos conhecemos? Não é um pouco cedo pra nos considerarmos amigos? - Eu olhei pra Minashigo, expondo a expressão incrédula em meu rosto.
- Você me cobriu na noite passada!
- Você simplesmente desmaiou na cama! Devia ter ouvido o estrondo que você fez quando caiu no sono, literalmente!
- Você não iria pedir pra qualquer pessoa pra acompanhá-la em uma viagem que poderia levar dias!
- Sobre isso... Eu...
- E o que você disse sobre seu amigo e sua noiva? Eu duvido que você diria aquilo pra alguém que você sequer conhece!
- Você fala isso tudo, mas e quando você cuidou de mim lá na Rússia? - A expressão incrédula em meu rosto se fixou ainda mais ao ouvir aquilo.
- Você está praticamente se refutando ao dizer isso!
- Pensando por esse lado... Acho que você está certa mesmo! - Nisso, eu suspirei, deitando a cabeça para trás no banco.
- Deixa pra lá! - Fechei os olhos, levantando a cabeça na direção do teto do veículo, encarando aquilo ao abrir os olhos. - Essa viagem não está tão divertida quanto achei que fosse!
- Desculpa!
- Não! Tudo bem! Não é sua culpa! Eu que sou a culpada de achar que seria divertido fazer uma viagem pra saber onde meu pai está, sabendo que algo de ruim poderia ter acontecido com ele! Parece até que eu ainda estou nos meus quinze anos!
Olhei para Minashigo de canto de olho, e o mesmo coçava a nuca nervosamente, deixando óbvio que não sabia o que falar. Distraída, olhei para um dos grupos de passageiros que estavam sentados na parte de frente do ônibus, que subiram no veículo em uma das poucas paradas que o ônibus havia dado, levando algo enrolado em pano e pendurado em seus ombros. Talvez Minashigo tenha percebido a direção em que eu olhava, e seu ar indeciso deu lugar para uma expressão meio sem graça.
- Devem ser praticantes de Kendô!
- Como? - Me virei outra vez para Minashigo, lentamente, não por sono, mas pelo desânimo que havia surgido em mim.
- Não seria muito legal ficar andando por aí com uma espada, mesmo que seja de madeira, então eles enrolam em um pano pra disfarçar!
- Já praticou isso?
- Eu li sobre, e mesmo que os livros que eu li tenham instruções ilustradas, um cabo de vassoura não é o item mais equilibrado pra se treinar Kendô!
A risada veio de forma inevitável pra nós dois, e no mesmo instante em que virei meus olhos para a janela, o aviso de termos entrado na Suécia surgia no caminho, como um vulto, ao mesmo tempo em que algumas poucas casas começaram a surgir no caminho, estando difíceis de ver pela escuridão noturna, estando ainda mais escuro que na Finlândia. Tirei o celular bolso e olhei minhas anotações que constavam que a Suécia era uma hora atrás da Finlândia e oito atrás do Japão, e fazendo as contas, percebi que já era uma da tarde no país de onde vim, me sentindo um pouco culpada por não perceber a diferença de tempo e ter deixado minha mãe preocupada comigo, mas também me senti aliviada por termos tido contato, mesmo que rapidamente, juntamente de saber que ela também estava bem.

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General FictionExplorações, registros, conhecimentos, comentários sobre tais coisas, eram coisas que Erina admirava no homem da sua vida, seu pai. Desde sempre, a garotinha do papai mostrava interesse na profissão do homem que cuidava da família, e em resposta, o...