Eu... Eu ainda me lembro claramente... De como foi aquela noite. Meu pai já havia se sentado na mesa de jantar... E minha mãe terminava de por a comida sobre a mesa... E ambos ficavam incansavelmente me chamando para descer, enquanto eu estava em meu quarto, tentando arrumar o boneco que eu havia quebrado em um ataque de fúria. Sem saber o que fazer, escondi o boneco quebrado embaixo do meu travesseiro e fechei o quarto, indo até as escadas para descer ao andar de baixo... E por algum motivo, o baú branco e dourado, possuindo uma cruz vermelha desenhada, que estava no quarto de meus pais, emanava um brilho vermelho de dentro dele como nunca havia feito antes. Pensei em ir até ele, mas não era de hoje que meu pai me pedia para ficar longe do baú, e apesar de ficar irritado com aquilo, eu ainda o obedecia. Descendo as escadas, ambos meus pais já estavam sentados, me esperando, e eu puxei uma das cadeiras para me sentar também, com a cara irritada pela frustração da minha falha em concertar o braço direito que havia saído do boneco. Vendo meu rosto, meu pai me perguntou o motivo de eu estar daquele jeito, e eu não tinha feito questão alguma de responder, mas com as insistências de meu pai, e também, de minha mãe, eu desisti e expliquei a consequência de minha ira. Meu pai me repreendeu, como de costume, falando as mesmas baboseiras de sempre. Mesmo hoje, eu me lembro do "Askin, essa sua ira ainda vai lhe custar muito caro no futuro" sendo dito enquanto o dedo indicador de meu pai era apontado na direção do meu rosto, e de praxe, eu já não ligava mais para aquelas palavras repetidas, e também não ligava para a falta de atitude da parte de minha mãe. Como sempre, meu pai nos obrigava a orar antes de toda a refeição, e não foi diferente naquela noite, e talvez pelo fato de grande parte dos homens da família de meu pai serem descendentes de soldados da época das cruzadas, mas o fator religião prevalecia constantemente, me deixando com náuseas quando me lembro dos sábados e domingos perdidos no quarto com meu pai, que me fazia ler e reler várias vezes aquele maldito livro preto... Mas nessa noite... Essa noite foi diferente. Ao término da reza, alguns homens dos Nōbenbārein, uma das facções da cidade do sudoeste, invadiram nossa casa, jogando a mesa para o alto e agarrando meus pais pelos cabelos, enquanto eu caía perto das escadas, com um garfo em uma das mãos. Doraireddo, o líder do grupo que havia invadido cobrava algum tipo de comissão por proteção, o que infelizmente era normal para vários moradores que moravam no pior lado do Japão, e meu pai o repreendeu, dizendo outro de seus sermões bíblicos idiotas, e como castigo, Doraireddo mandou um de seus homens espancarem minha mãe, que no primeiro soco, teve seu rosto completamente distorcido, com sua mandíbula se descolando. Meu pai se levantou para protegê-la no mesmo instante, mas Doraireddo o impediu, jogando-o longe, e com outros golpes, minha mãe acabou não resistindo mais. Doraireddo cobrou meu pai outra vez, e eu me lembro do "Doraireddo, um dia, você estará na mesma situação que me encontro agora, e então, você entenderá toda a dor que sinto agora" que meu pai dizia, sucumbindo na própria raiva. Se apressando, Doraireddo sacou sua katana e passou a lâmina no pescoço de meu pai, que sangrou até a morte, e apontou a ponta da arma em minha direção enquanto dizia "peguem o garoto" para seus homens. Naquele momento eu me levantei, tendo dores nas costelas por ter sido jogado forte, com dificuldades para respirar, e quando eu chegava perto do andar de cima, um dos homens de Doraireddo havia me pego, e por instinto, eu enfiei o garfo em seu olho e o chutei ainda mais fundo, fazendo o homem cair e derrubar todos os outros que estavam atrás dele. A minha inocência falou mais alto, e eu resolvi me esconder no baú proibido do quarto dos meus pais, que por algum motivo, estava vazia... Ou parecia estar. Fiquei um tempo ali, ouvindo passos e gritos pela casa, e por causa da poeira que o baú havia acumulado, eu inocentemente espirrei, e então... Silêncio... E o baú se mexeu, ainda comigo dentro. Ele balançava violentamente, e ainda amedrontado, eu ficava em silêncio, esperando que o tremor parasse... E ele parou... E voltou outra vez, e em um último movimento, eu ouvi algo batendo em água... Era o baú, que estava sendo inundado por água... E não parava. Eu abri o baú e caí para o lado, em cima de vários ossos que, ao contar os torsos, passavam de no mínimo dez pessoas. Eu não sabia nadar, e cada movimento que eu fazia na água era inútil, me fazendo gastar mais fôlego atoa. Eu já estava aceitando meu destino, amaldiçoando Doraireddo e seus homens pelo o que fizeram, e então, um pano de dentro do baú flutuou para cima, boiando sobre a água, e outra vez, o brilho vermelho de dentro do baú emanava, ainda mais forte do que a primeira vez, e a fonte daquela luz era... Um braço? Eu o peguei, e estranhei o fato de que, mesmo parecendo pobre pelo tempo passado, não emitia qualquer tipo de sujeira na água, pela putrefação do membro. Com os poucos momentos de vida que ainda me restavam, eu percebi que o osso daquele braço estava solto da carne, estando fácil para até mesmo uma criança como eu ter a oportunidade para removê-lo, e quando eu o fiz... Tudo se apagou... E foi assim... Que eu morri.
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Fiksi UmumExplorações, registros, conhecimentos, comentários sobre tais coisas, eram coisas que Erina admirava no homem da sua vida, seu pai. Desde sempre, a garotinha do papai mostrava interesse na profissão do homem que cuidava da família, e em resposta, o...