Borges
Eu só me controlei naquele momento pra não assustar ela, porque eu não sou homem pra ouvir ninguém querer cantar de galo pra cima de mim e eu ficar quieto, não sou mermo. Mas pra não fazer besteira eu fiquei só no papo, coisa de gente ruim fazer um bagulho daquele.
Não sou de acreditar em energia, nesse mundo espiritual, mas a parada lá tava negativa pra caralho. A minha pretinha chorando o tempo inteiro por causa da mulher que diz ser mãe dela. Ainda teve o Braz, eu esperava que ele fosse dar um surto, seria menos pior do que o que ele falou. O cara olhou na cara dela e afirmou que eu vou partir o coração dela, até eu senti uma coisa ruim naquele momento, imagina ela.
Giro o volante na esquina de um restaurante aqui no morro mermo, abro a porta, segurando meu baseado e vou até o balcão, olhando o movimento fraco nessa parte. A senhora me olha e se levanta da mesa pra vir me atender.
Eu: Boa noite, tem strogonoff? - ela retribui e concorda, enxugando as mãos no avental azul claro, eu me sento no banco, puxando meu baseado até a boca e aponto pra frente com a cabeça - Bota pra levar então, pô.
Xx: É pra colocar arroz e batata palha? - confirmo, tirando a carteira do bolso, colocando em cima do balcão de mármore e ela sai do meu campo de visão, indo pra cozinha.
Passo a mão no cavanhaque, soltando o restinho da fumaça, pensando pra caralho. O que aquela piranha da Monique falou mexeu comigo, sempre mexe, eu sei qual é a minha conduta diante da situação que ela me botou, posso ser errado em muitas coisas, menos no que envolve a minha família.
A mulher olhar pra mim e falar que eu iria abandonar a pretinha grávida foi foda. Porque eu nunca faria uma porra dessa, quando aconteceu da Dandara engravidar, eu abri mão de muita coisa pra poder criar a minha filha. Fiz tudo que eu poderia fazer, porque eu seria pai e não era só no conceito, pai na prática também, o amor pela minha filha já tava em mim desde o primeiro dia que eu soube da existência dela, mas não aconteceu. Passo as mãos no rosto, segurando o baseado entre os dedos e suspiro fundo, sentindo a onda bater.
Em minutos, a mulher volta com a bolsa e eu deixo uma nota no balcão, indo embora pra casa dela. Já tomei banho, desci com a Evoque porque trouxe as caixas, sorvete e agora o strogonoff pra ver se aquela mulher para de chorar, o que ela chorou de ontem pra hoje, eu não choro em 1 ano, papo reto. Mas é a minha chorona, então nem vou reclamar muito.
Tiro a arma da cintura, coloco dentro do porta luvas e volto pra minha posição, trocando a marcha pra segunda quando viro na rua da casa dela. Acelero um pouco e paro na calçada do outro lado, apago os faróis e dou um tempo no carro, terminando de fumar meu baseado. Depois de um tempo, jogo a ponta no chão e abro a porta, sentindo o corpo pesado do cansaço que foi o dia de hoje.
Tiro as caixas da mala e vou colocando as duas na porta da casa dela, que ainda tá fechada. Coloco uma em cima da outra e depois volto pra pegar a sacola com o strogonoff e a outra com o sorvete, hoje essa mulher se cala a base de comida, quero ver ela chorar desse jeito, papo reto. Faço um gancho com os meus dedos e dou três batidas na porta, ouvindo o miado do gato lá dentro. Depois de um tempinho, ela aparece abrindo a porta, já vestida num pijama curto, que deixa a minha pretinha muito gostosinha.
Bianca: Eu achei que você não ia vim, demorou muito - ela se aproxima, passando os braços pelo meu pescoço e eu abaixo dando um beijo no pescocinho cheiroso, ela é chorona, mas é cheirosa, pô - O que são essas bolsas?
Eu: Vai ver que eu vou botar essas caixas pra dentro - ela estreita os olhos pra mim e eu aponto pra dentro, olhando o rostinho mais inchado pelo choro - Vai lá que tu vai ver o que é.
Pego as duas caixas e vou até o quarto, colocando no canto da parede. O quarto dela parece de criança, papo reto, é um bagulho todo bonitinho, a cama de casal, o banheiro, mas nas paredes tem aqueles adesivos grandes que tem desenho de uma boneca, é uma cacheada, parece com ela. Olho pra trás e vejo os olhos dela vermelhos, mas parece mais feliz já que tá comendo o strogonoff.
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Além do Impossível
Hayran KurguAmar não é olhar um para o outro, é olhar juntos na mesma direção.