Parte 2 – Gelo e ruínas
Nós partimos para Tuorc no dia seguinte. Nós todos. Ercan e Barrie foram juntos e Renoward decidiu levar Alyssa também, que se recuperava da faca no abdômen. Estava melhor que eu, entretanto. Fomos juntos porque não voltaríamos mais. E sabíamos disso. Só veríamos os campos verdes de Álix quando a guerra acabasse, se sobrevivêssemos a ela.
De certa forma, a guerra já havia começado. Estavam nos caçando com a maior força. A ideia era boa; mate os causadores e a causa está perdida.
Eu sabia que quanto mais gente, maior a chance de morte. Qualquer descuido era pouco, mas mantê-los em Álix não ajudaria em nada. Alyssa quase foi morta e os gêmeos só não estavam sendo perseguidos porque Ridgar não fazia ideia da existência deles. Qualquer um que tivesse entrado em contato conosco morreria.
Foram quatro dias de viagem. Dois apenas para cruzar Rafflésia. Se estivéssemos a pé, seriam doze, mas os pégasos nos davam grandes vantagens.
Nós chegamos na fronteira entre Tuorc e o reino dos rafflesianos no fim do terceiro dia, quando o sol já se punha e as aves deixavam o local gelado. A floresta era densa. Suas folhas tinham um mesclado de vermelho com o branco da neve. Eram realmente brancas avermelhadas, e os troncos possuíam uma tonalidade cinzenta.
Pousamos em uma clareira, onde montamos o acampamento e começamos a caçar e a limpar animais como a última refeição do dia. Aaden conseguiu algumas lebres para o jantar e eu atingi um esquilo que curiosamente estava por ali.
Os pégasos foram alimentados e, no fim de tudo, nos juntamos na roda perto da fogueira dividindo os poucos cobertores que levamos. Por mais que soubéssemos do frio, não conseguiríamos levar muitas coisas; a viagem seria longa demais. Por sorte, nossos trajes eram térmicos e ajustavam-se a qualquer temperatura. Só não podia ser ao extremo, como em Tuorc.
— Dizem que há linces por aqui — comentou Aaden.
— Geralmente ficam um pouco mais perto da cidade — disse Zylia.
— Eles entram na cidade? — perguntei.
A tenente deu de ombros, ajeitando-se um pouco mais ao lado de Aaden.
— Já vi alguns, mas acho que o número diminuiu.
— O rei de Tuorc não faz nada?
Sua expressão se fechou um pouco.
— Ayaz não costuma fazer alguma coisa. Ele só age quanto tem algum interesse.
— Ele assumiu o trono? — foi a vez de Alyssa perguntar.
Ela levantou a cabeça, deixando que a curiosidade falasse mais alto do que a dor.
Zylia assentiu.
— Faz alguns anos. Acho que alguns meses depois que você foi presa. Tuorc ficou tão reservado desde então, que não me lembro qual foi a última vez que ele fez negócios.
— Ayaz sempre foi assim.
A tenente observou a princesa antes de negar.
— Nem sempre.
Alyssa calou-se, como se entendesse e se lembrasse do porquê.
Os gêmeos já dormiam, amontoados um em cima do outro, enrolados na coberta que joguei por cima deles.
— Quando foi a última vez que o viu? — perguntou Alyssa, e apurei os ouvidos, por mais que quase não fosse necessário.
Zylia passou o olhar por todos antes de pousá-lo em mim. Então, encarou o chão, onde suas botas marcavam a neve. Tínhamos forrado uma lona, mas não havia teto para dormir sob. Era só torcer que não nevasse e continuar a jornada no dia seguinte.
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Arthora | A Espada de Vanella
Fantasy[Obra concluída ✔] Quando o relógio marca meia-noite, uma perigosa linhagem de monstros é desencadeada, revelando um lado obscuro da humanidade que Gaëlle jamais imaginou existir. À medida que a garota se lança em uma busca desesperada pelos misteri...