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Quando eu tinha doze anos, li em um livro roubado do meu pai que os seres humanos atingiam a maturidade por volta dos vinte anos. Isso, obviamente, dependeria das circunstâncias em que ele foi criado. Segundo aquele livro, nosso cérebro terminava de desenvolver aos vinte, o que significava que toda a sua personalidade e consciência já haviam se formado.

Eu nunca soube se aqueles estudos eram verdadeiros. Para ser bem sincera, qualquer coisa que vinha do meu pai, me trazia desconfiança. Só porque era dele.

Mas essas informações nunca saíram da minha cabeça. Por mais que parecessem distantes, e tão infinitamente mentirosas, eu tinha uma tendência ridícula a sempre me lembrar daquelas páginas amareladas.

Mas, eu não fazia ideia do quão certa estavam.

Disfarçadamente, revirei os olhos.

Malditos livros.

Meu pai podia mandar modificarem as páginas, mas por que mesmo ele perderia tempo com isso? Ele não me deixava chegar perto da biblioteca. Não quando estava em casa. Quando viajava, eu calculava os horários novos dos guardas descerem para os salões de treinamento e, enquanto os outros filhos do meu pai corriam para assistir, eu aproveitava os quinze segundos livres de corredor para atravessar toda a mansão e entrar na biblioteca.

Lembro-me de conseguir levar alguns para o meu quarto, de vez em quando. Passava horas tentando absorver um conhecimento que Markus não me permitia ter. E que talvez nem fosse verdadeiro.

Foi assim que descobri a existência dos Kedi, animais tão raros.

Mas ah, se descobrissem... Bom. As cicatrizes nas minhas costas carregam o preço do pouco conhecimento que eu tinha. Não só isso, é claro. Meu pai nunca deixaria de descontar a raiva dele apenas nisso.

Naquela manhã, enquanto eu caminhava atrás de Renoward, torcendo para que ele não desmaiasse com a dor e o sangue que escorriam dele, fiquei a pensar, subitamente, em algumas coisas que Markus já havia feito.

E, francamente, você pode achar o que quiser de mim sobre esse assunto, e o Imperador que me perdoe, mas meu desejo de matá-lo era enorme. Não era correto matar. Sabia disso. Porém, enquanto nos afastávamos da Cerca, senti vontade de caçá-lo e enfiar Vanella em sua garganta.

Mas uma coisa que também não era de conhecimento meu, era a grande necessidade que eu tinha de Yüksek. O grande Imperador, o Rei de todos os reis, meu Pai. Eu estava... com raiva dele também.

Mas a culpa não era dele. Nunca foi.

* * *

Segurei Renoward segundos antes que ele de fato caísse.

Com pouco equilíbrio, deixei que ele se apoiasse em mim. Minhas pernas tremeram com o peso e, por um segundo, pensei que levaria nós dois ao chão.

Baixinho, o chamei.

Mas houve silêncio.

Não estávamos longe da casa. Mais alguns passos, e chegaríamos lá, mas assim como eu, o soldado deveria estar exausto.

Durante todo o caminho, fomos nos escondendo, desviando de lugares públicos e evitando ruas muito cheias. A esse ponto, não aguentávamos mais nenhum passo, porém eu já conseguia ver o sobrado.

Quase derrubando-o, eu me sentei, trazendo o soldado para próximo do chão. O apoiei na parede, segurando sua cabeça e impedindo que batesse.

Seus olhos estavam fechados e o peitoral subia e descia de forma suave, mas fraca.

Arthora | A Espada de VanellaOnde histórias criam vida. Descubra agora