Havia uma goteira bem ao lado da minha orelha. Havia também, pairando no ar, cheiro de bolinhos, café e torrada. O vento estava frio e impaciente, mas eu sentia algo quente. Talvez fosse fogo.
Ou o significado de vida.
Uma vez, quando éramos crianças e Hale levou as primeiras chibatadas, observei meu irmão durante uma noite inteira. Eu não sabia se ele viveria e estava com medo. Por isso, acendi a velha lareira que usávamos, esperando uma reação de seu corpo imóvel.
Quando o calor do fogo o atingiu, Hale abriu os olhos. O corpo quente fazia com que seu sangue fluísse com mais facilidade. Fazia com que ele ficasse mais forte. Conforme eu o esquentava, meu irmão conseguiu ter mais disposição para me dizer o que fazer para que não morresse.
Eu abri os olhos. Acima de mim, o teto parecia pontiagudo demais. Havia mesmo fogo em alguma lareira, e sua luz projetava as sombras de alguém deitado em uma cama baixa, coberta por algum lençol. Um pouco mais afastado, quatro pessoas sentadas em cadeiras e uma mesa circular.
Testei os olhos. Abri e fechei as mãos.
Do outro lado, meus amigos conversavam baixinho. Havia alguém que eu não conhecia, de pé e de costas para mim. Seu cabelo era branco como a neve; grande, descia até a metade das costas em ondas quase perfeitas. Era cheio, mas pouco volumoso e tinha quatro tranças presas na parte de trás.
Apurei os ouvidos. Não conseguiria chamá-los então decidi ouvir.
— Quanto tempo? — Aaden perguntou. Parecia fazer tempo que não ouvia a voz dele.
— Uma semana — a garota dos cabelos brancos respondeu. Sua voz era bonita. Forte e firme, mas simpática e gentil.
Portos segurou uma palavra. Negou com a cabeça.
Zylia estava chorosa. Alyssa segurava firme, mas não conseguia esconder. Ayaz, de braços cruzados, apesar da linha de expressão em seu rosto de sutil preocupação.
O único que não estava na roda era Renoward.
— E vai durar até quando? — Alyssa roeu as unhas. Estralou os dedos. — Não podemos esperar para sempre.
— Eu não sei — disse a mulher. — Podem ficar aqui o tempo que precisarem. Eu insisto. Estou sozinha há muito tempo para não querer uma simples visita.
— Já passou do ponto de ser visita, Zahara. Estamos quase morando aqui.
A garota inclinou a cabeça.
— Aaden Portos, pensei que conhecia sua velha amiga. Você sabe que, se eu me importasse, já teria expulsado vocês daqui.
O soldado pareceu relaxar. Soltou os ombros, ainda um pouco hesitante.
— O principal problema aqui nem é esse — disse Zahara. — É se a amiga de vocês vai sobreviver.
— Ela tem resistido — disse Zylia, com os ombros caídos.
— Não é disso que estou falando. Gaëlle já está muito debilitada. Queimaduras recém curadas, facada no abdômen, cortes nas mãos e pés, dois grandes machucados nas costas, uma mordida no antebraço e agora a perna. Além da cicatriz de bala no braço direito e uma ferida do mesmo tipo no braço esquerdo que mal cicatrizou. Têm certeza de que querem continuar?
Zylia esfregou a testa.
— Não é bem uma escolha, Zahara. Muitos de nós dependemos disso. Os Arthorianos, os faunos, os Valyriunms... São muitas vidas.
A mulher balançou a cabeça.
— Sei disso. Meu povo enfrenta problemas, apesar de que a Torre não faz diferença nenhuma em nossas vidas. Mas caso tudo voltasse ao normal seria bom.
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Arthora | A Espada de Vanella
Fantasy[Obra concluída ✔] Quando o relógio marca meia-noite, uma perigosa linhagem de monstros é desencadeada, revelando um lado obscuro da humanidade que Gaëlle jamais imaginou existir. À medida que a garota se lança em uma busca desesperada pelos misteri...