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Capítulo narrado à parte de

Gaëlle Provence

Zylia cobriu o rosto quando as lágrimas começaram a escorrer mais forte. Aaden, com a raiva entalada em sua garganta, se aproximou e deixou que a amiga o abraçasse tão forte quanto conseguia.

Por mais que odiasse confessar, ele também estava com vontade de chorar. Evitava as mãos trêmulas para dar apoio a Zylia, mas sentia a mesma vontade que ela. Queria chorar por vê-la assim tão mal e porque sabia como era ser ameaçado e não poder fazer nada diante disso.

Zylia se encolheu em seus braços quando ele lhe tocou a cabeça. A via como uma irmã mais velha, apesar de que, se sua irmã estivesse viva, seria apenas um pouco mais velha que Gaëlle; bem diferente de Zylia.

Enquanto a tenente soluçava, ele acariciou sua cabeça em um gesto amigável.

— Eu queria que ele fosse para o inferno — Zylia sussurrou em meio as lágrimas.

— Eu sei.

Houve silêncio. Aaden não estava se sentindo capaz de comentar qualquer coisa, muito menos Zylia. Ela, por um momento, só quis deitar e dormir, esquecendo-se de tudo.

"Você tem até o solstício". Não queria ter até o solstício, não queria ao menos pensar em fazer. Mas era algo que não sabia decidir. Talvez ninguém soubesse se estivesse no lugar dela.

— Eu não quero cumprir o prazo, Aaden — disse, afastando-se. — O que eles querem é desumano.

O soldado engoliu em seco.

— Eu sei.

Mais um pouco de silêncio, enquanto Zylia batia as pestanas.

— Gaëlle acordou — disse ele, quebrando qualquer falta de som.

Ela ergueu os olhos, observando o soldado, tão impassível. Quase nunca o vira assim. Com Renoward já era costume, mas Aaden tendia a ser mais descontraído, mesmo em dias difíceis.

— Acordou?

Ele assentiu.

— Quis saber o que estava acontecendo, mas eu a mantive lá.

— Certo. Está certo.

Mais silêncio.

— Zylia...

A garota negou, já sabendo do assunto que ele perguntaria; conhecia Aaden muito bem. Conhecia todos ao seu redor muito bem.

— Melhor não.

— Você tem certeza?

— Aaden, qualquer resquício desse assunto em cima de Gaëlle pode piorar a situação.

— E os outros Valyriunms que Brendan citou? Acha que estão aqui?

— Estão aqui. São os gêmeos. Não é atoa que ele sentiu o cheiro.

Portos estava, pela primeira vez em bastante tempo, verdadeiramente impressionado.

— Eles sabem disso?

Zylia deu de ombros.

— Eu imagino que não.

Novamente, os dois ficaram sem saber o que comentar, presos no próprio mar de pensamentos enquanto o chão lustrado da casa de Renoward quase conseguia espelhar a imagem deles.

— E se você não cumprir?

A garota ergueu os olhos, observando o soldado com atenção.

— E se você for embora? Tipo, sumir e... talvez ir para outro continente.

Zylia negou.

— Não dá. Iriam atrás de mim, e mesmo se não fossem, conhecem você e o Renoward. Então descontariam a raiva em vocês, e isso não é algo negociável.

— O solstício é o prazo da Gaëlle — relembrou Portos.

Zylia sentiu vontade de chorar novamente.

— É o nosso para entregá-la também. E não podemos fazer as duas coisas ao mesmo tempo. — A garota encolheu os ombros, com as mechas prateadas entregando seu desejo de desaparecer. — Eu não sei o que fazer.

— Você pensa em fazer isso? Entregar Gaëlle?

— Já pensei nessa possibilidade, eu confesso. Mas eu não sei se sou capaz disso.

Mais uma vez, Aaden puxou a amiga para um abraço, com ternura. Ela retribuiu o gesto, agarrando-o como se essa fosse a solução dos problemas.

— Zylia... acha mesmo que ele vai matar seus irmãos?

A tenente lambeu os lábios enquanto remoía a sensação esquisita do peito.

— Se ele não matou ainda, está esperando um motivo. Conheço Brendan há mais tempo do que parece, Aaden. Ele é um mentiroso, sim, mas ele não vai deixar meus irmãos morrerem até que ele tenha um motivo.

Enquanto ouvia, Portos fechou os olhos. Ah, se pudesse ajudar...

Ter que decidir entre as duas opções não era fácil. Há muito tempo, isso assolava a cabeça de Zylia. Como poderia escolher entre a irmã de Hale, o cara que ela amou tão intensamente a vida toda, e seus irmãos, quem esteve com ela nos momentos mais difíceis até serem levados?

— O problema é que — continuou Zylia —, se ele matar meus irmãos, Brendan não vai pensar duas vezes antes de vir atrás de nós também.

— É muitas vidas em jogo.

— É. E o pior de tudo, é que está tudo sobre mim.

Arthora | A Espada de VanellaOnde histórias criam vida. Descubra agora