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Capítulo narrado à parte de

Gaëlle Provence

Os olhos ferozes do soldado observavam a garota ruiva por meio das folhagens.

Já estava posicionado havia alguns segundos. Prometera a si mesmo que não a observaria muito mais que o necessário, mas depois da conversa que tiveram mais cedo, ele não conseguiu evitar.

Dó era uma palavra errada para o que sentia. Não sentia dó de Gaëlle, mas não sentia algo bom também. Era como se estivesse confuso em relação a ela. Era como se não soubesse sentir mais.

As vezes era isso que ele pensava. Que coisa mais fútil!

Não queria sentir algo por alguém, mas Renoward não sentia nada por absolutamente ninguém. Era essa a sensação que tinha. Era isso que ele ponderava nas noites em que passava acordado.

Ah, quantas vezes já não havia ido até a presença de Yüksek para perguntar o que acontecia. Queria conselhos, mas era estranho. Não lhe parecia um assunto de muita importância. E o Imperador nunca respondia. Ou Renoward que não era capaz de escutar.

Porém, não sentiu nada quando Gaëlle atravessou os portões de vidro do Jardim, usando a inteligência que tinha para retirar a fechadura.

Ah, esses arthorianos. Tão inteligentes, mas tão metódicos e egoístas. Possuíam muitas falhas, mas não eram capazes de confessar. Eram tão terríveis quanto sulmanitas, entretanto não eram capazes de perceber. Renoward pensava que de nada adiantaria. Poderiam até tentar impedir a guerra, ou acabar com a escravidão, mas isso retornaria depois de cinquenta ou cem anos. Nenhum dos dois lados estavam dispostos a admitir que tinham falhas. Era uma guerra infinita e miserável, que tornaria Ulyan cada vez mais miserável.

O mundo dependia do funcionamento dos Sete Reinos e, se os Sete Reinos não funcionavam bem, Ulyan virava caos e destruição. Isso era óbvio para qualquer um.

E, por mais que o soldado soubesse de sua natureza arrogante, ele sabia que estava certo. Nada mudaria se eles não mudassem.

Renoward apurou os ouvidos.

Apesar de tudo, ainda funcionava como uma máquina. E não conseguia sentir remorso. Era bom no que fazia. Lutava bem, atirava bem, ouvia bem. Estava sempre atento a absolutamente tudo. Era a melhor arma que tinham, a melhor peça do xadrez. Se não fosse pego antes do tempo, seu time não teria problemas muito cedo.

Mas, do mesmo jeito, o príncipe guardava muitos segredos. E esse poderia ser o grande motivo para seu problema. Renoward não tinha certeza se tinha ligação, mas tudo o que escondia e guardava o envolvia em uma neblina escura. Ele era a junção do caos e da coragem.

O soldado se abaixou, com o dedo enluvado no gatilho, mas a arma apontada para baixo. Com o braço apoiado em sua perna, puxou o ar com força e tentou relaxar a mandíbula.

Havia poucas coisas que Renoward não compreendia. Sempre foi um homem esperto. Sempre pronto para tudo, sempre sabendo lidar com tudo o que caia em suas mãos. Mas estava errado em algumas coisas.

Infelizmente, sua vida se tornou um caos muito antes de ele ser apenas um menino.

Arthora | A Espada de VanellaOnde histórias criam vida. Descubra agora