Capítulo 8

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Carolina. - Rio de Janeiro, 16 de fevereiro, Complexo da Maré. 2:36 AM.

Olhei a entrada do camarote vendo Maria entrar com um vapor que eu já tinha visto uma vez quando estava andando na rua.

Eu ainda estava tentando entender como vim parar aqui. Maria foi bem insistente e eu acabei cedendo por curiosidade, eu neguei diversas vezes mas até Tamires me mandou vir dizendo que dormiria com meu filho e que eu precisava me divertir.

Acabou que bebi algumas doses além do planejado e a essa hora eu estava só no energético. Meu relógio biológico de mãe me faria ficar com sono antes da meia noite, mas o energético estava ajudando.

- E aí, chefe. Voltei. - o vapor cumprimentou Falcão que estava fumando do meu lado enquanto batia um papo comigo.

Ele era até legal, mas me irritava demais.

- Resolveram pelo visto né? - olhei pra Maria sem entender e ela fez um sinal de que me explicaria depois.

- Resolvemos! - ele olhou pra Maria que sorria. - Satisfação, Danone. Tu deve ser a famosa Carolina.

- Eu mesmo. Prazer! - falei e ele fez um toque comigo. Me segurei pra não rir do seu vulgo, quem levaria ele a serio assim?

- Eu já vou indo, Natan precisa de mim! - me levantei e abracei minha amiga sabendo que ela não voltaria pra casa comigo.

- Juro que amanhã te conto tudo! - ela falou baixinho no meu ouvido e eu beijei sua bochecha.

- Aproveita a noite, gata. Você merece!

- Te amo! - ela beijou meu rosto também e eu me despedi dos dois homens com um aceno.

- Calma aí, pô! A gente te leva. - Danone falou e eu neguei rápido com a cabeça.

- Não tem bronca, pode deixar! Não quero atrapalhar.

- Você não atrapalha, Lina. Vamos com a gente. - Maria falou.

- Eu te levo, já tô me mandando também. Podem ir tirar esse atraso de vocês. - Falcão falou já se levantando e tirando a chave da moto do bolso. - Bora, morena.

Eu o segui sem ter muita opção, e sabia que não atrapalharia ele porque moro na frente da sua casa e de qualquer jeito ele iria pra lá.

Cheguei perto da moto e esperei ele subir pra também sentar na garupa.

Subi e tapei a frente do meu vestido pra não aparecer nada demais, ele deu partida na moto e eu passei minha mão pra sua barriga sentindo a arma na sua cintura. Num impulso eu tirei rápido a mão mas ele puxou de volta colocando ali de novo.

- É só por precaução, não vou atirar em tu não. - ele falou alto por causa do barulho na rua mas eu ouvi.

Chegamos na rua de casa e ele estacionou em frente a minha. Desci da moto e arrumei meu cabelo.

- Tá entregue gatinha. - ele falou me olhando. - Trabalha amanhã?

- Eu fui demitida. - falei e ele comprimiu os lábios.

- Porra, foi mal. Tu vai achar outra coisa logo. - ele falou tentando me consolar. Mas eu ja tava bem tranquila com essa situação. - Vai lá no bar da dona Ana. Eles tão procurando gente pra trabalhar.

- Obrigada pela indicação, vou lá amanhã. Boa noite! - falei sem graça e ele assentiu me encarando.

- Fé aí, patroa.

Ele acelerou a moto e saiu me deixando confusa. Achei que ele voltaria pra casa. Dei de ombros e entrei na minha casa vendo um balde de pipoca e uma panela de chocolate na sala. Ri e fui catando tudo pra colocar na cozinha.

Deixei ali pra lavar de manhã e entrei no quarto do meu filho vendo ele e Tamires dormindo pesado. Dei um sorrisinho leve e corri pro banheiro pra tomar um banho e deitar.

(...)
Falcão. - Rio de Janeiro, Complexo da Maré. 03:18 AM.

Soprei a fumaça da maconha que eu tava bolando e senti a brisa começando a bater. Acionei no radinho pra DG descer aqui comigo na boca sabendo que Danone não apareceria aqui tão cedo.

- Qual foi, chefe? - DG chegou colocando a pistola em cima da minha mesa e se jogando no sofá.

- Descola pra mim umas informações. Quero tudo daquela mulher na minha mesa até amanhã. - ele me olhou estranho. - A minha vizinha, Carolina.

- Que isso, Falcão? Tá gamado? - ele me zoou e eu olhei feio pra ele.

- Só faz o que eu to mandando. Amanhã quero ver tudo o que tu conseguiu.

- Tá beleza. Era só isso? - eu assenti e mandei ele sair.

Terminei meu cigarro e olhei pro teto soprando a última fumaça.

Puta que pariu, curiosidade do caralho de saber de onde veio essa mulher. Ela parece esconder muita coisa e não se encaixa no contexto da favela, não sei o que ela tanto faz questão de ocultar, mas vou descobrir.

O sono não aparecia de jeito nenhum, não ia adiantar ir pra casa agora, e eu não queria voltar pro baile. Por isso comecei a contar armamento e estoque pra ver se tava tudo certo.

Terminei olhando o relógio vendo que já ia amanhecer. E aí me dei conta de que não dava mais pra ir pra casa, tenho trabalho demais a fazer.

Logo os vapores começaram a chegar e dei logo uma lista de cara pra cobrar. Já voltei pra tacar o terror nos que devem, quando eu tava na cadeia eu não podia cobrar, mas agora posso.

Peguei uma lista também pra ir cobrar os que tava com valor maior.

Bati na casa de um noia e quem abriu foi uma mulher baixinha que me olhava assustada.

- Cadê o Roger? - perguntei lembrando do nome que li.

- E...eu não sei... ele foi trabalhar. - ela falou e eu olhei pra dentro da casa vendo um cara jogado no sofá.

- Tá mentindo pra mim, dona? - ela negou rápido com a cabeça. - Quem é aquele ali? - apontei com o queixo.

- É meu marido. - ela se aproximou de mim e falou baixinho. - Ele vai me bater se eu falar que ele tá em casa, não faz nada, por favor.

Entendi o que ela queria dizer e invadi a casa pegando o cara de surpresa fazendo ele levantar.

- Cadê minha grana filho da puta? - cheguei perto dele e tirei minha arma da cintura.

- Porra, eu não tenho nada, Falcão. Releva aí, cara. - ele olhou ao redor. - Quer levar meus filhos? Pode levar como garantia, eu vou te pagar.

- Não! Roger, pelo amor de Deus. - a mulher gritou desesperada e com razão. Cara sem noção querendo dar os filhos pra bandido.

- Eu vou fazer o que com teus filhos, caralho? Tá ficando maluco? - eu perguntei me estressando. - Te dou uma semana pra arrumar a grana e se eu voltar aqui e não receber, tu já sabe teu destino. E se eu souber que tua mulher tá apanhando, vou voltar mais cedo. Tu tá ligado das regras aqui dentro.

Olhei de canto duas crianças me olhando com medo, mas não me compadeci. Só saí da casa vendo a mulher me acompanhar com os olhos e o tal Roger me encarava puto.

Voltei pra boca e desisti da lista que tinha pego pra cobrar, entreguei pra um vapor aleatório. Já tinha me estressado.

RENASCER [CONCLUÍDA)Onde histórias criam vida. Descubra agora