Capítulo 29

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Carolina. - Rio de Janeiro, 21 de abril, Complexo da Maré.

Acordei sentindo um cheiro de comida e percebi que Thiago não tava mais na cama. Olhei o relógio e vi que eram seis da manhã, precisava levantar pra arrumar Natan pra escola.

Sentei na cama e cocei os meus olhos que estavam pesados, eu queria dormir até não aguentar mais.

Levantei e fui pro banheiro fazer minhas higienes matinais, escovei os dentes e coloquei o mesmo short que eu tava usando ontem, trocando apenas a blusa, por uma do Thiago que achei por aqui.

Saí do quarto ouvindo vozes, identifiquei rapidamente como de Falcão e Natan que já tava acordado. Pelo visto, Falcão também desandava a falar de manhã cedo, Natan deve ter adorado. 

Fui me aproximando tentando ouvir a conversa deles e parei antes de virar no batente da porta da cozinha.

- A minha mãe faz nescau pra mim de manhã, mas não tem problema ser suco, tio. - Natan falou.

- Mas eu mando comprarem nescau pra ti, menor. Espera dez minutinhos. - ele falou e ouvi Natan concordando.

- Bom dia! - cheguei e Natan tava na mesa sentado comendo bananas cortadas numa vasilha, Falcão tava de pé perto da pia com o radinho na mão pedindo pra comprarem o nescau de Natan. Uma graça.

- Bom dia, mamãe. - Natan falou e eu sorri pra ele beijando sua cabeça, percebendo que ele tava com cheirinho de sabonete. - A senhora vai pegar minha farda lá em casa pra eu me arrumar aqui?

- Não amor, nós vamos lá pra casa pra você se arrumar pra aula. - ele assentiu e colocou um pedaço de banana na boca. - Ele tomou banho? - perguntei pra Thiago e ele concordou com a cabeça, me olhando de cima a baixo.

- Tomou, sozinho. É um rapaz já, pô. - ele falou e Natan ficou todo envergonhado.

- Tio Falcão me ensinou a vestir a camisa mamãe, me vesti sozinho. - ele falou todo orgulhoso e meu queixo caiu.

Como ele ensinou em uma manhã, o que eu tento ensinar há dois anos? Isso só me prova que meu filho dá mais ouvidos á Thiago do que pra mim. Me sinto uma palhaça.

- Fica com ciúme não, ensinei do meu jeito pro menor, de homem pra homem. - ele falou e estendeu a mão pra bater na mão de Natan.

- É isso aí, mãe. - Natan falou mastigando.

- Come logo antes de sair, princesa. - Thiago se aproximou e eu me sentei na mesa do lado de Natan. Peguei um pão com queijo e presunto, coloquei suco no copo e comecei a comer.

- Você não vai comer, tio? - Natan perguntou e encarou Falcão. - Quer banana? - ele estendeu o garfo com uma fatia da banana mas Falcão negou.

- Quero não menor, vou só tomar um café e já fico tranquilo. - olhei pra ele bebendo o suco percebendo que parecia ser de abacaxi, arregalei os olhos com Falcão me encarando.

- Tá ruim? - ele perguntou.

- Não, eu sou alérgica a abacaxi, mas tá tudo certo. - eu tranquilizei ele porque sabia que quando eu falava isso as pessoas ficavam meio desesperadas, mas não adiantou muita coisa.

- Alérgica como? Tu sente o que? - ele perguntou.

- Eu passo o dia vomitando e minha pele fica com umas pintinhas. - respondi já sentindo minha garganta fechar.

- Porra... Foi mal, eu não sabia. - ele foi falando e se aproximando.

- Admite que você queria me envenenar. - eu brinquei mas comecei a tossir. - Dá licença. - eu levantei sentindo a bile subir e sabendo que eu precisava comprar urgente meu antialérgico que há tempos eu não precisava usar.

Abri com força a porta do banheiro do quarto onde a gente tava e fui logo me debruçando no vaso sanitário pra colocar meu café da manhã pra fora, mesmo mal tendo comida no meu estômago.

Senti a mão de Thiago segurando meus cabelos em um rabo de cavalo enquanto eu botava quase minhas tripas pra fora.

- Puta que pariu, foi mal mesmo, Carol. Não sabia que tu era alérgica e se soubesse não teria nem pensado em fazer o suco. Foi mal, porra. - ele falou meio desesperado enquanto me via na situação mais desagradável que eu poderia estar.

- Tá tranquilo, Thiago. Já falei, tu não tinha como saber! - falei quando dei uma pausa.

- Mamãe? - ouvi a voz de Natan mas eu tava de costa pra porta ouvindo ele me chamar.

- Tua mãe tá bem não, menor. Vou te levar na sua casa pra você trocar de roupa e vou te levar na escola, beleza? - Falcão respondeu e eu continuei com a cabeça encostada no vaso tentando arranjar forças pra levantar.

- Tá bom, tio. - Natan falou e ouvi os passos dele se afastando.

- Tá melhor? - neguei com a cabeça e a gente ouviu batidas na porta da frente da casa. - Vou ali, já volto. Deve ser o bagulho que pedi pro vapor comprar.

Respirei fundo sentindo mais uma vez todo o líquido saindo pela minha boca. Eu odeio ficar assim, até o cheiro do abacaxi me deixa mal.

Que inferno.

Sentei no chão do banheiro mesmo e fui enchendo a banheira de novo pra eu entrar nela. Enchi com água gelada pra ver se melhorava minha fraqueza.

Lavei minha boca com enxaguante bucal pra não ficar com gosto de vômito, lavei o rosto também que já estava suando frio.

Vi no meu braço as primeiras manchinhas vermelhas e suspirei.

Falcão demorou uns vinte minutos mas voltou e eu já estava dentro da banheira com a água gelada congelando minha pele.

- Voltei, Natan já ta na escola. - ele falou. - Qual remédio que tu toma quando tá assim?

- Qualquer antialérgico forte que me derrube. - respondi devagar. - Mas eu não posso tomar agora, preciso trabalhar mais tarde e não posso dormir, dona Ana precisa de ajuda lá no bar e...

- Porra, Carolina, não né. Tu tá doente, pô. - ele falou e sentou na tampa do vaso fechada. - Avisa ela que hoje tu não vai poder ir, não adianta ficar se matando, tu mal aguenta ficar em pé.

- Também não é assim, Thiago. Não dá pra ficar faltando, eu preciso do emprego e não vou dar mancada. - eu falei de olho fechado e tranquila.

- Não! Tu vai ficar sussa aí, vou mandar comprar teu remédio, tu vai deitar e ficar quieta até melhorar. Amanhã tu volta pro trampo. - ele deu ordem e eu suspirei já sem muito argumento. - Relaxa aí, qualquer coisa grita. Tô indo pedir teu remédio.

Ele levantou e beijou minha boca sem mais nem menos, depois saiu do quarto e eu fiquei ali sozinha. Era pra ser só um almoço de domingo e agora eu tô aqui doente na banheira do quarto dele.

RENASCER [CONCLUÍDA)Onde histórias criam vida. Descubra agora