Carolina. - Rio de Janeiro, 26 de maio, Complexo da Maré. 00:20 AM.
O dia foi longo hoje.
Quanto mais eu pensava, menos passavam as horas. Depois do almoço Natan deu um cochilo e acordou ligado no 220 porque Falcão prometeu buscar ele pra jogar bola no campinho.
Eu arrumei Natan e esperei por Falcão, esperei a tarde toda e fiquei puta quando anoiteceu e ele simplesmente sumiu. Não respondeu minhas mensagens, não dava notícias, não tinha nenhum sinal de vida.
Eu conversei com Natan e dei graças a Deus por ter um filho compreensivo, falei que Falcão tava trabalhando muito e não conseguiu vir ver ele, mas que no dia seguinte voltaria. Mesmo sem saber a verdade, eu disse isso e me senti mal por não falar a verdade, que eu nem sabia o que era.
Depois de colocar Natan na cama, não preguei os olhos, não consegui dormir, estava começando a me preocupar. Eu iria matar Falcão se ele aparecesse na minha frente, eu estava irritada demais pra só deixar pra lá.
Ouvi duas batidas baixas na minha porta e fiquei nervosa, mas tomei coragem e abri a porta vendo a imagem de Falcão apavorado e Matheusinho desacordado no seu colo, todo machucado.
Todo o meu ódio evaporou naquele momento.
- Meu Deus, o que aconteceu com vocês? - eu perguntei tremendo e abri mais a porta pra eles passarem e Falcão colocou Matheuzinho no meu sofá.
Pouco me importei se sujaria, eu tava preocupada demais pra isso.
- Me ajuda, princesa. - ele pediu baixo sabendo que meu filho tava dormindo e passou os dedos entre os cabelos molhados de suor. - Acharam ele num beco lá fora do complexo, todo fodido. Acho que foi o informante do rival que fez isso porque Matheus não quis dar informação minha pra eles. Tu tem formação, ajuda aí ele.
- Tem que levar ele pro postinho, eu não tenho experiência na área, só me formei.
- Mas tu tem o conhecimento, o postinho vai questionar e querer avisar a mãe dele, quero preocupar ninguém não e nem quero ninguém no pé do meu ouvido falando. - ele se jogou no meu outro sofá cansado.
- Toma um banho, depois volta aqui. Eu vou checar os sinais vitais dele.
- Sei que porra é essa não, mas faz aí, a vida dele tá na tua mão. - ele falou me deixando mais nervosa. - Vou aqui em casa, conta dez que eu já volto. Vai precisar de alguma coisa? Vou no postinho buscar.
- Ele foi esfaqueado, vou precisar de todo material pra fechar. - eu falei e ele concordou. - Rápido, por favor.
Enquanto ele saía, eu coloquei dois dedos na mandíbula dele para checar os batimentos cardíacos e ver se ele ainda tava vivo. E fiquei mais aliviada ao ver que tava. Ele foi esfaqueado na perna e no braço, perdeu bastante sangue.
Peguei um pouco de algodão e mergulhei no alcool, pelo menos esses materiais eu tinha aqui em casa. Coloquei um pano na boca dele porque se caso ele acordasse gritando, abafaria o som. Comecei a limpar os ferimentos e dito e feito. Ele despertou aos gritos e eu segurei o pano na boca dele.
- Que porra é essa, Carolina? - ele perguntou desesperado.
- Eu só tô limpando, para de gritar porque se meu filho acordar, você que vai colocar ele pra dormir de novo. - eu falei e ele deitou a cabeça no sofá colocando o pano na boca de novo e aguentando a ardência do contato do álcool na pele dele.
- E aí, como que tá? - DG e Danone entraram com os insumos do postinho, provavelmente Falcão mandou eles. - O chefe mandou trazer pra ti e mandou te avisar que vai tomar um banho e vai voltar. - eles explicaram e eu só consegui assenti.
- Vocês vão me ajudar. Ele tá inquieto, e eu vou ter que costurar ele sem anestesia.
- O que? Porra, tu vai me matar Carolina! - ele falou alto e eu botei o pano na boca dele de novo.
- Fica quieto aí, pô. Deixa a patroa trabalhar! - Danone falou e eu ri com o apelido.
- Vai logo, caralho. - ele tirou o pano mas colocou de novo e eu comecei a fechar as feridas enquanto ele urrava de dor.
- Larga de ser chorão, porra. - DG falou e eu segurei a risada me concentrando pra não errar o que tava fazendo.
Costurei as duas feridas e passei um remedio que uso em Natan quando ele se machuca, espero que tenha algum efeito.
- Voltei, família. - ouvi a voz de Falcão que se aproximou da gente e checou Matheus que tava com os olhos quase fechados. - Acordou menor, agora conta o que rolou mesmo. - ele cobrou e eu me afastei pra que eles se resolvessem.
- Me ligaram dizendo que tava tendo tiroteio no beco da rua cinco lá fora, eu que tava na entrada do morro, fui lá checar. Mas tinham dois caras lá que já chegaram na maldade, meteram a faca em mim. Deixaram um recado pra ti.
- E aí, que recado foi? - Falcão perguntou e eu respirei fundo enquanto lavava minhas mãos.
- Ta aqui, colocaram um papel no meu bolso. - ele se virou com dificuldade e vi Falcão colocando a mão no bolso dele, lendo o papel e coçando a cabeça nervoso. Já reparei que esse é um sinal de nervosismo nele.
- Puta que pariu. - ele falou baixinho e eu troquei olhares com ele tentando entender. - Lê isso, irmão.
Ele entregou pra Danone que leu e encarou ele com medo também.
- É bom pra preparar teus homens, a Penha não vai ter dó. - DG leu em voz alta e eu levantei as sobrancelhas cruzando os braços.
- Os caras vão vir pra cima... - Falcão falou e respirou fundo.
- A gente tem equipe pô. Vamo ficar tranquilo, vamo agir na calada, sem provocar ninguém. - Danone falou e Falcão ficou pensativo.
- Vamo descansar pô, vou dormir por aqui pra ficar de olho em Matheusinho. Ele pode dormir aqui Carol? - Falcão me olhou.
- Claro, eu só não vou ter quarto livre, mas tenho o sofá. - sorri amarelo e ele assentiu.
- Amanhã nós vai pra tua casa, falar com tua mãe que teve um acidente ou algum bagulho assim. - Matheusinho balançou a cabeça com os olhos fechados e Falcão fez toque com os meninos se despedindo.
- Que noite... - eu falei e Falcão concordou com a cabeça. - Vou dar um remédio pra ele conseguir dormir e um analgésico pra dor, espero que passe logo.
- Faz isso, princesa. - ele beijou minha cabeça. - Vou ver meu menor, vacilei feio com ele hoje.
- Só não acorda ele, por favor. - eu pedi e ele riu indo na direção do quarto do Natan.
Peguei os remédios e ergui um pouco a cabeça de Matheus pra ele tomar sem se engasgar com a água.
- Valeu aí, Carolinda. - ri do apelido e ele sorriu também meio sonolento.
- Dorme bem, qualquer coisa tô no quarto. - eu falei e ele assentiu.
- Fica tranquila, vou ser empata foda não. Vai lá viver a vida. - ele falou e eu segurei a risada.
- Quem disse que ele vai dormir comigo? - eu perguntei.
- Comigo que não vai ser né. - ele falou brincalhão com os olhos fechados e eu revirei os olhos.
- Sai fora, Matheus. Vai dormir, isso é efeito do medicamento. - respondi rindo e ele negou com a cabeça, mas não respondeu. Provavelmente já tava caindo no sono.
Fui saindo devagar da sala, abri um pouco mais a porta do quarto do meu filho e vi Falcão fazendo um carinho no rosto dele que me fez ficar com o coração quentinho, meu filho num sono pesado e o Falcão faltava babar.
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RENASCER [CONCLUÍDA)
RomansaCarolina conhece muita coisa sobre relacionamento, principalmente tendo passado pelas mãos doentias do ex abusivo, ela só conhece o lado negativo de se relacionar. Natan, seu filho, foi a única coisa boa que lhe aconteceu nesse período conturbado da...