Capítulo 11

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Carolina. - Rio de Janeiro, 26 de fevereiro, Complexo da Maré. 10 dias depois.

Rio de Janeiro não estava perdoando nenhum trabalhador com o sol absurdo. Eu tinha acabado de deixar Natan com Tamires e estava indo pro trabalho, cerca de quatro e quinze da tarde. Dona Ana tinha acabado de mandar mensagem avisando que abriríamos o bar meia hora antes, por ser sexta feira e também por hoje ter pagode lá no bar, a gente fecharia mais tarde.

- Boa tarde, dona Ana. - cumprimentei ela assim que cheguei e vi que estava colocando umas cadeiras no lugar.

- Oi filha, boa tarde! - ela sorriu. - Me desculpa avisar em cima da hora, eu tinha esquecido do pagode de hoje.

- Não, sem problema! - falei pra ela que parou a minha frente e limpou uma gota de suor na testa.

- Você pode começar colocando as bebidas que chegaram lá na freezer? Dadinho não vem hoje, o filho tá doente, então é eu, você e Fábio hoje pra servir as mesas, vamos ter que dar conta. - ela disse com um sorriso amarelo.

- Vou só guardar minhas coisas e vou fazer isso. - eu falei e ela assentiu voltando a organizar as cadeiras.

Coloquei minha mochila no armário e troquei de roupa pra colocar o uniforme com a logo do bar e uma calça jeans. Peguei alguns engradados de cerveja e levei pra perto da freezer pra começar a abastecer.

Depois de quase quarenta minutos organizando tudo eu terminei. Minhas mãos estavam dormentes e minhas costas doíam.

Olhei meu relógio de pulso e vi que eram cinco e quarenta e os clientes estavam chegando. Dona Ana não costuma servir as mesas, ela fica mais na cozinha, mas como hoje faltou um dos funcionários, ela estava no meio das mesas atendendo.

Vi um grupo chegar e procurar mesa, limpei algumas mesas e o pagode tocava alto no ambiente. Eu cantava alguns baixinho no intervalo entre um atendimento e outro.

- Boa noite, o que vão querer hoje? - falei colocando um sorriso no rosto. Era uma mesa com duas mulheres e três homens que já vi algumas vezes de longe andando no morro.

- Você tá no cardápio? - um deles falou e os outros riram, estalei a língua no céu da boca controlando meu ódio que subia aos poucos olhando os três rindo da coisa mais ridícula que eu ouvi hoje.

- Eu vou ignorar o que você perguntou e vou manter meu profissionalismo. O que vai querer? - eu falei tendo sã consciência que fui rude com ele, mas pouco me importava.

- Trás lá duas cervejas e uma porção de petisco. - ele falou com cara de poucos amigos e eu assenti anotando o pedido dele.

- Algo mais? - ele negou e eu me retirei respirando fundo. - Filho da puta. - xinguei baixinho e sentei pra descansar as pernas.

- Pega aí, filha. Dá um gole pra renovar as energias. - dona Ana me estendeu uma lata de refrigerante e eu sorri agradecida.

Abri a latinha e dei dois goles olhando o movimento.

Sorri abertamente quando vi Maria entrando com o namorado dela, a bonita nem me avisou que viria. Vi se alguma mesa precisava de atendimento e quando vi que não, fui até ela a abraçando.

- Nem me disse que viria. - reclamei. - Oi, Danone. - estendi a mão pro namorado de Maria.

- E aí, Carolina. Como tá aí? - sorri pronta pra responder mas meu sorriso morreu vendo quem vinha atrás deles.

- Não te avisei porque eles me chamaram agora pouco, Lina. E disfarça essa cara de quem comeu e não gostou. - ela falou a última parte baixinho e eu revirei os olhos.

Falcão estava vindo com um outro homem ao lado dele, essa era a primeira vez que eu o via essa semana. Eu estava evitando contato com ele, estava de todas as formas fugindo porque não queria ver a cara dele depois da última "discussão" que tivemos. Mas por algum motivo, eu não me incomodava com a presença dele.

Ele me olhou e seu olhar arrepiou os pelos da minha coluna. Ele estava vestido todo de preto, como já percebi que ele sempre se veste, um tênis branco e a correntinha de sempre.

- Vou voltar ao trabalho, já escolheram uma mesa? - perguntei desviando meu olhar do dele e Danone me olhou.

- Já tem uma mesa pra gente, te preocupa não baixinha. - ele respondeu e eu saí de perto.

(...)
Falcão. - Rio de Janeiro, Complexo da Maré.

Eu não tava nem um pouco afim de sair de casa, mas confirmei pra DG e Danone que ia no pagode da dona Ana, os dois me encheram tanto o saco que nem tive como negar essa porra. As vezes eles esquecem que eu que sou o chefe.

Os dias tem sido intensos, mal tenho parado em casa organizando tudo na boca. Duas semanas de liberdade e eu só tive trabalho.

- Aí irmão, nossa mesa tá livre, bora lá. - DG falou e eu caminhei.

Chegar e dar de cara com Carolina mudou meu humor.

- Dona Ana amassou nesse pagodinho. - Danone comentou e eu concordei com a cabeça e batuquei a mesa ao som de Ferrugem que a banda tava tocando.

- "...É muita lenha pra queimar e quando a gente acender, vai dar trabalho pra apagar." - DG cantarolou e eu olhei pra onde eles estavam cantando.

Quem cantava era Ronaldo, um parceiro que sempre vinha aqui no morro. Acenei pra ele que tava me olhando e ele acenou de volta fazendo um gesto pra eu ir lá. Neguei na hora e bebi um gole de cerveja que dona Ana tinha colocado ali pra gente beber.

- Uma pausa aí, pessoal... - Ronaldo falou e a banda fez uma pausa. - Quero chamar aqui, o pai de todos, o dono dessa porra, meu parceiro. Chega aí Falcão! - ele falou, eu peguei meu copo de bebida e levantei recebendo o aplauso de todos que estavam ali no meio.

- Porra, tu me coloca em cada situação. - fiz toque com ele que me puxou pra um abraço.

- Tu não quis vim, fiz tu aceitar. - ele riu e me deu o cavaquinho. - Escolhe uma aí do repertório que a banda te segue e eu só canto.

- Não, pô. Tá maluco? Sei tocar isso mais não, faz tempo que nem encosto em um. - eu falei e neguei com a cabeça.

- É que nem andar de bicicleta, parceiro. - eu cerrei os olhos e peguei da mão dele olhando o repertório.

Puxei o solo de "Tá escrito", uma das músicas que eu mais gosto.

- Essa é boa ein! - ele falou e eu continuei tocando.

A galera cantava feliz e alguns gravavam vídeo meu tocando. Eu ria pro vento e olhava cada canto do bar.

Até que meus olhos pararam na filha da puta que roubou alguns dos meus pensamentos mais maldosos na ultima semana.

Ela cantava com uma bandeja na mão entregando cerveja pra uma mesa. Ainda não tinha percebido que eu tava no palco improvisado, mas logo olhou e se surpreendeu em me ver. Pisquei um dos olhos só pra ver a cara dela fechando.

RENASCER [CONCLUÍDA)Onde histórias criam vida. Descubra agora