Capítulo 20

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Eu trabalhei igual uma condenada. Era cliente atrás de cliente, tira peça do cabide, coloca de volta, soma as compras, coloca na sacola, leva no caixa.

Era puxado, mas eu tava feliz.

Nunca ia abrir minha boca pra reclamar. As coisas estão acontecendo e eu sou grata demais.

Eu ainda tava na loja, esperando a última cliente sair. Mandei mensagem pra K2 avisando que já podia vir e ele respondeu avisando que ia atrasar coisa de dez minutos, mas que ia chegar.

Débora, a outra menina que trabalhava comigo caminhou na minha direção.

- Você vai trancar? - ela questionou.

- Não, amanhã eu tô de folga, a chave tem que ficar com você que vai estar aqui. - eu respondi e ela assentiu.

- Você vai esperar seu motorista? - ela brincou. Era o mesmo carro todo dia, ela com certeza observou isso.

- Ele vai atrasar, mas já chega.

- Espero com você. - ela falou e colocou a mochila na bancada.

- Você já tava de saída. Pode trancar que eu espero ele na calçada, não vai demorar. - ela me olhou.

- Tem certeza? - perguntou e eu concordei. - Então vamos, meu marido já tá ali na frente.

A gente saiu, trancou tudo e eu guardei o celular com medo de ser assaltada ficando ali na frente. Eu estava cansada, era sexta feira, meu último dia de trabalho na semana, agora só volto na segunda.

Meu corpo inteiro entrou em alerta quando um carro todo preto parou bem na minha frente, não abriu o vidro nem nada, só parou.

Eu já tava com um pé atrás de ficar aqui sozinha, agora com um carro estranho, eu fiquei logo nervosa.

A porta do carona abriu e um cara saiu, vestindo só a camisa do BOPE, mas o resto das roupas estavam normais.

- Tu vai entrar no carro quietinha, sem fazer alarde. E vai o caminho inteiro sem dar uma palavra, beleza? - eu arregalei os olhos. Ele me dava medo, e tava tranquilo demais.

Ele mostrou a arma e eu ouvi o barulho do gatilho. Eu não sou maluca de reagir, por isso entrei no banco de trás e o motorista dirigiu pra muito longe de onde eu tava. Até chegar na base do BOPE.

- Sabe o que tu tá fazendo aqui, Valéria? - o homem questionou assim que o carro parou na vaga do estacionamento.

- Não. E eu não fiz nada, me deixa ir pra casa. - eu pedi.

- Só vou te fazer umas perguntas, não precisa ter medo de mim. É só colaborar comigo que tu sai daqui intacta e sem nenhum arranhão. - ele falou e eu saí do carro indo atrás dele pra onde ele tava indo.

Era um prédio pequeno, devia ter uns quatro andares. Tinha um outdoor enorme com a imagem da faca na caveira.

Eu nunca precisei parar aqui, eu nunca vim nem pra esse lado da cidade. Que merda que eu me meti?

Ele me levou pra uma sala de interrogatório. Só tinha eu e ele, mais ninguém, achei estranho porque geralmente tem testemunhas, pelo menos uma.

- Senta aí, Valéria. Mantém a tranquilidade. - ele falou e eu sentei devagar na cadeira de ferro. - Ta vendo aquela mesa ali? - eu olhei pra mesa cheia de pistola.

- Sim!

- É uma mesa pra te incentivar a não mentir e colaborar com a nossa investigação. - ele falou e eu gelei.

Mas me mantive neutra por fora, mesmo que por dentro eu estivesse surtando.

- Eu sou o Guimarães. Tu eu já conheço. - ele se aproximou e sentou na cadeira, bem na minha frente.

Ele pegou uma pasta e abriu justo na foto de Russo com a roupa da penitenciaria. Eu não movi um músculo, não dei sequer uma respiração em falso.

- Sabe quem é esse homem né? - ele devia ter a minha ficha, deve saber que eu visitei Henrique na cadeia. Não arriscaria mentir.

- Sei! - respondi simples.

- Ok! - ele puxou mais fotos. - Essa é você, quatro semanas seguidas fazendo visita íntima pra ele. Deve ser muito boa no que faz né?

- Não vem ao caso, sua pergunta é antiética e sem coerência. - respondi cheia de coragem.

- Você é esperta, Valéria. - ele riu de lado e escorregou na cadeira apoiando o braço na mesa. - Só mais algumas perguntas e eu te libero, é só responder certo. Quando foi a última vez que viu Paulo Henrique Alves?

- Quem? - me fiz de desentendida.

- Russo. Quando viu ele a última vez? - eu o encarei séria e fingi pensar.

- Na última visita, já tem quase um mês. Fui avisada que ele morreu na rebelião. - eu falei e ele riu.

- Você mora no Complexo do Alemão né? - ele perguntou e eu assenti. - Se lembra da última invasão que teve lá? Alguns dias depois da rebelião?

- Sim, me lembro! - me mantive neutra assim como em todo o restante da conversa.

- Nós estamos atrás de Russo, há dias. Ele ainda não apareceu. - ele falou e dentro de mim eu tava aliviada por não terem achado ele ainda.

- Porque tá morto! - falei como se fosse óbvio não terem achado.

- Não, ele não tá! Fugiu do complexo penitenciário junto com o colega de quarto dele, André.

Meu coração bateu mais forte, mais descompassado. Eu só franzi o cenho.

- Ele fugiu? - perguntei só pra confirmar a segunda afirmação. André fugiu?

- Sim! Inclusive, você conhece muito bem o colega de cela dele né? É até estranho que você fazia visita pra Russo e não pro seu ex. Dá pra explicar? - eu fiz a minha maior cara de sonsa, de quem não estava entendo nada.

Mas Russo ia me explicar muita coisa. Eu tinha que anotar num caderno todas as minhas dúvidas.

- Eu era paga pra isso, e não tinha contato com André há anos. Mal sabia que ele estava preso. - fiz uma cara de poucos amigos, tentando passar o máximo de verdade possível.

- Então... Você não viu o Russo?

- Como eu falei... Não o vi. Se visse acharia que era assombração, porque até minutos atrás ele tinha morrido. - falei e ele assentiu coçando a barba.

- Ok! Tá liberada, Valéria. - eu franzi a cara.

- Era só isso? - eu questionei.

- Queria alguma coisa a mais? - ele perguntou me olhando curioso.

Eu neguei com a cabeça.

- Não!

- Tá, obrigado. - ele apontou a porta da saída e eu saí normal, ele ainda ficou lá sentado.

Mas assim que pisei do lado de fora, puxei meu celular da bolsa e mandei minha localização pra K2.

"Não precisa vir não, já vou chamar um Uber. Mas é só pra tu saber onde eu vim parar."

"Caralho, tu tá fechando com polícia? Russo vai te matar!"

Nem me dei o trabalho de responder e só abri o aplicativo do uber e pedi um carro pra voltar pro morro.

VISITA INTIMA - Além do Sexo [CONCLUÍDA]Onde histórias criam vida. Descubra agora