Leah
Sai da biblioteca rapidamente quando recebi a mensagem de Rebeca, dizendo que nossos pais já haviam chegado. Ela havia tirado uma - rara - folga para recebê-los, o que deveria significar que também estava animada, porque Rebeca nunca tirava folgas. Ela adorava aquele trabalho.
Assim que abri a porta, senti um delicioso cheiro de bolinhos - minha mãe adorava cozinhar, e se deixássemos, nos empanturrava de comida o dia todo.
- Olha só quem chegou - minha mãe largou o pano de prato, vindo em minha direção, e a abracei. Ela cheirava a biscoitos e chocolate, e usava um vestido de verão florido.
Eu não era do tipo que gostava de abraços e demonstrações de afeto, mas estava com tanta saudade, que poderia ficar abraçando-a infinitamente.
- Oi mãe - eu sorri, e ela se afastou para arrumar um prato de bolinhos para mim.
Me sentei na mesa, os mordiscando devagar. Estavam deliciosos, como sempre.
- Querida, o que fez seu cabelo? - ela perguntou, alguns instantes depois, me trazendo uma xícara de chocolate quente.
- Eu disse - Rebeca riu, levantando os olhos de seu computador por alguns segundos, e fiz uma careta. Estava tão ruim assim?
Meu pai, que parecia concentrado no jogo de basquete que passava na televisão, se virou para nós, curioso.
- Está parecendo uma universitária - ele disse, sorrindo, e veio me abraçar também.
- Nós sentimos tanto a sua falta - minha mãe disse, alguns segundos depois, enquanto tirava do uma nova fornada de biscoitos - De sua irmã também, é claro, mas sempre soubemos que Beck era uma garota da cidade.
Rebeca, desde criança, vivia falando sobre seus sonhos de viajar e morar numa grande cidade. E então não foi novidade para nenhum de nós quando ela decidiu que queria fazer faculdade em Bluish City. A milhares de quilômetros de onde morávamos.
- Gosto daqui - eu disse, e era verdade. Eu gostava de toda a bagunça e o anonimato que aquela cidade oferecia, mesmo não os aproveitando. Sempre havia um lugar novo para ir ou um evento para participar em algum canto.
- E como está a escola? Tem feito amizades? E os garotos? - minha mãe perguntou, numa espécie de armadilha. Ela sempre estava me esperando confessar que havia algum namorado. Mas não havia.
- Conheci uns garotos - eu disse, o que não era totalmente mentira, e Rebeca pareceu curiosa - Eles têm uma banda.
Meu pai se virou para nós, deixando de lado a televisão, à simples menção de música. Ele costumava tocar numa banda quando era mais novo, mas acabou desistindo - segundo suas historias, ele era péssimo; o que não o impediu de continuar amando a música.
- Que tipo de música eles tocam?
- Rock, eu acho - respondi - Ou algo alternativo. Só vi um show até agora.
- Bom, a juventude não está totalmente perdida - meu pai respondeu, sorrindo, e torci para que ele não tocasse no assunto natação.
Eles ficariam decepcionados em saber que, ao abandonar minha vida antiga, eu também deixara de lado aquilo em que era boa.
- Você pode nos apresentar seus amigos. Nós adoraríamos conhecê-los - minha mãe disse, esperançosa. Ela era do tipo superprotetora, e queria conhecer todas as pessoas com quem eu me relacionava.
Me lembrei do quanto fora difícil fazê-la gostar de... Bem, eu não podia pensar nisso. Não de novo.
- Naaão - eu disse, rindo - Mãe.
- Leah não tem tempo para garotos - meu pai disse, piscando para mim - Está muito ocupada acabando com eles na natação.
Devo ter ficado um pouco pálida, porque eu sentia toda a cor se esvair de mim. Droga.
Balancei a cabeça, me distraindo em comer o restante dos bolinhos em meu prato, e Rebeca interviu, perguntando-me o que eu vestiria naquela noite.
- O que vai ter hoje? - perguntei, curiosa, não me lembrando de ela ter mencionado algo.
- Rebeca nos convidou para um jantar importante de seu trabalho - minha mãe respondeu, orgulhosa, sorrindo na direção de Beck.
Minha irmã havia feito estágio numa pequena revista de moda da cidade, e fora, recentemente, efetivada.
- Vou tomar um banho - avisei, aproveitando que todos estavam na cozinha. Só tínhamos dois banheiros, e Rebeca e minha mãe demoravam uma eternidade para se arrumar, então se eu não quisesse que meu pai nos apressasse, era melhor começar.Eu havia acabado de sair do banho, e estava secando o cabelo, quando vi a mensagem de Mick em meu celular, em que ele me chamava para uma apresentação do Andrômeda, naquela noite.
"Tenho uma espécie de jantar em família" eu respondi, enquanto procurava algo pra vestir.
Acabei optando por minha melhor - e única - saia, de um tecido luminoso que lembrava couro, preta, e uma blusinha rendada combinando, e calcei minhas sapatilhas azuis.
Deixe que Rebeca fizesse minha maquiagem, embora tenha pedido à ela para não exagerar - da última vez eu havia ficado parecida com uma vadia.
- Você podia usar um dos meus saltos - ela disse, fazendo uma careta para minhas sapatilhas. Rebeca era apaixonada por saltos.
- O que há de errado com elas? - eram minhas favoritas, bufei.
- Nada. Só... Tente isso - ela me estendeu uma de suas sandálias de tiras, prateada, que por sorte não era muito alta. Às vezes eu não sabia como Rebeca conseguia ficar em cima daquelas coisas.
As vesti rapidamente, e peguei minha bolsa, deixando de lado o casaco. Estava uma noite agradável, e quase quente.
Ouvi meu pai nos apressando no andar de baixo, e desci as escadas rapidamente, enquanto Rebeca calçava seus sapatos.
- Vocês estão lindas - ele disse, enquanto entrávamos no carro, e ligou o som, embora Rebeca tenha tagarelado o caminho todo sobre o que Sally - ou sei lá o nome da garota - havia aprontado no dia anterior.
Tirei meu celular da bolsa, e o número de Mick piscou na tela.
Queria te ver... dizia a mensagem, e por alguns instantes, meu coração bateu um pouco mais rápido. Me perguntei se eu seria uma filha péssima por desejar sair na metade do jantar.
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Perto do limite
RomanceEu passei muito tempo tentando entender o que essa história representa - para os leitores e para mim, mas acho que, no fim, é uma história sobre se apaixonar. Sobre como o amor pode trazer de volta cores para uma parte da sua vida que estava em somb...