Capítulo 56

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Cap 56
Leah

- Bec, me empresta aquele seu casaco preto? - gritei da banheiro, enquanto tentava ajeitar meu cabelo com uma tonelada de creme para pentear. Eu não sabia onde Mick planejava ir, e embora ele tivesse dito que aquilo não era um encontro, eu queria estar apresentável, porque não fazia ideia de onde nós íamos. Até onde eu sabia, sua concepção de jantar poderia significar tanto comer em um bar que servia fritas ou ir em algum restaurante cujos nome no cardápio nenhum de nós podia pronunciar.
Coloquei o vestido preto simples que eu costumava usar nas raras festas que ia, meus coturnos e o casaco preto de Rebeca, que ela trouxe alguns instantes depois.
- Onde você vai desse jeito? Eu amo tanto esse vestido, pena que ele fique curto demais em mim - Rebeca e eu constantemente trocávamos roupa, embora tivéssemos gostos um pouco diferentes, e tamanhos também - ela tinha pernas invejáveis e era pelo menos uns dez centímetros mais alta.
- Vou jantar. Com Mick - tentei falar como se fosse uma casualidade, mas eu sabia que Rebeca não exatamente aprovava o fato de nós sairmos constantemente. Ela provavelmente achava que ele era uma má influência ou iria partir meu coração - Não se preocupe. É só algo entre amigos...
- Eu não disse nada... - ela riu, mas sua expressão era bem óbvia, o que eu resolvi ignorar - Não volte tarde, você sabe que fico preocupada.
- Tudo bem. O que você vai fazer? - perguntei, me sentindo mal por deixar Rebeca sozinha.
- Nada demais. Alugar um filme ou coisa assim. Ou dormir. Meu deus, olha minha olheiras!
- Pare de drama - eu ri, e ela me disse pra dar o fora do banheiro porque ela precisava tomar banho, entao usei o espelho de seu quarto para terminar de me arrumar, percebendo que eu já estava atrasada quando ouvi a mensagem de Mick dizendo estar à caminho.
Gritei para Rebeca que já estava indo, e peguei um de seus colares emprestados, quando ouvi uma batida na porta, e Mick apareceu usando uma camisa social um pouco desabotoada e levemente amassada que o deixava incrivelmente sexy.
- Oi, você - eu disse, quando ele me cumprimentou, dando um beijo demorado em minha bochecha.
- Posso falar algo sobre isso? - ele me encarou demoradamente por alguns segundos, e não consegui desviar o olhar. Mick sempre fazia eu me sentir daquela forma - como se eu fosse a garota mais sexy do ambiente, e eu não podia mentir: eu gostava daquilo.
Nós entramos no carro, porque estava garoando, e Mick dirigiu ao som de um CD do Aerosmith até chegarmos a um lugar no centro da cidade chamado "1978", que parecia uma espécie de bar temático de luxo, com uma área repleta de mesas de sinuca e outros jogos que eu desconhecia, uma pista de dança e mesas separadas por uma porta de vidro.
Um garçom nos levou até uma das mesas, num canto perto da parede, e perguntou se desejávamos beber algo depois de dizer que a noite temática era italiana. Mick pediu um uísque, e eu pedi vinho, prometendo a mim mesma que aquela seria a única coisa que iria beber naquela noite, porque eu não queria estragar tudo ficando bêbada, até mesmo porque Rebeca estava em casa, e ela perceberia.
Nós já havíamos terminado a comida, que estava deliciosa, e eu acabava de pedir minha segunda taça de vinho - repetindo em minha mente que não era possível ficar bêbada com aquilo, já que não se parecia em nada com os vinhos baratos que tomávamos quando queríamos ficar loucos - quando o garçom nos trouxe duas fatias de um bolo com cobertura de sorvete e café que parecia delicioso, embora não tivéssemos pedido nada. Ele nos explicou, então, que às sextas as noites eram temáticas e a casa oferecia sobremesas de graça para os clientes.
- Adorei esse lugar - eu disse, dando uma colherada no sorvete, que céus, estava ótimo - Como você o conheceu?
- Nós tocamos aqui uma vez - Mick me contou sobre como aquele havia sido um dos primeiros shows de sua banda, e notei como era fofo quando ele ficava empolgado em relação a algum assunto - Nós estávamos nervosos pra cacete.
- Aposto que foram bem. Aliás, você devia tentar - eu disse, me referindo ao karaokê, perto da área de jogos, onde um grupo de amigos parecia tentar convencer uma garota de vestido amarelo à subir no palco.
- Eu não preparei nada...
- Para. Você pode cantar qualquer coisa. E é um karaokê, as pessoas vão aplaudir. Eu vou aplaudir...
- Essa é uma boa motivação - ele riu - Mas não é o bastante...
- Você está com medo? - eu disse, me lembrando de como ele havia me provocado na piscina, e Mick fez uma careta - E de qualquer forma, eu gosto de ouvir sua voz.
- Você é um pé no saco - ele levantou as mãos, cedendo, e notei um vestígio de sorriso, então disse para ele cantar uma música pra mim.
Mick subiu no palco, parecendo um pouco nervoso ao pegar o microfone, e então começou a cantar Stay, da Rihanna, que estranhamente combinou com sua voz, e a escolha de música me surpreendeu, porque eu não sabia que Mick ouvia aquilo, e era incrível como sua voz parecia ficar boa em qualquer coisa. Eu poderia fazer aquilo o dia todo - ouvi-lo cantar e me sentir estranhamente orgulhosa cada vez que sua voz soava tão bonita e ele parecia tão imerso na música.
Então ele terminou a música, vindo na minha direção como se não fizesse ideia do quão incrível havia sido, e me levantei para abraçá-lo, porque eu precisava dizer aquilo a ele, que não parecia se levar a sério o bastante.
- Se isso fosse um encontro, você já teria me impressionado - eu disse, em tom de brincadeira, e ele riu, dizendo que aquele era o objetivo, e então me olhou fixamente, fazendo com que cada parte do meu corpo parecesse ficar quente como o inferno.
- Se isso fosse um encontro, eu diria que você está incrível pra cacete. - ele não se esforçou pra fazer soar como se fosse uma brincadeira. Na verdade, cada uma de suas palavras parecia bastante séria, o que fez com que eu não soubesse o que responder.
Talvez fossem as duas taças de vinho fazendo efeito, ou o fato de estarmos tão ele soar sexy usando palavrões no meio de um ótimo elogio, ou também sua mão em minhas costas, na abertura do vestido, causando um formigamento estranhamente aconchegante, mas, naquele momento eu me sentia borbulhante.
- E você é muito talentoso, Mick Young. E faz elogios bons pra cacete - ele sorriu, nossos rostos tão próximos que era quase como se fôssemos nos beijar, e então me perguntei se eu gostaria. De ser beijada.
A resposta era óbvia, mas eu sabia que não podia arriscar, e com Mick, era como se sempre estivéssemos no limite do precipício.
Então nós bebemos seu uísque, e Mick tentou me ensinar a jogar sinuca, o que se mostrou uma péssima tentativa, porque ele basicamente acabou acertando todas as bolas, e já era quase meia noite quando fomos embora, demorando alguns minutos numa discussão para decidir quem dirigiria - Mick jurava que havia bebido menos do que eu, mas nenhum de nós tinha certeza. Ele acabou me deixando dirigir, após certa insistência.
- Porque nós saímos hoje? - eu perguntei, após ouvi-lo ter uma conversa aparentemente não muito calorosa com alguém no telefone, que deduzi ser sua mãe ou irmão. Eu sabia que não era da minha conta, e não insistiria no assunto caso ele parecesse desconfortável em responder, mas eu sabia que Mick tinha problemas com a família, e eu também sabia como as coisas ficavam ruins quando ele guardava tudo aquilo pra ele.
- Porque eu gosto da sua companhia? - ele usou seu tom irônico, numa tentativa de desviar do assunto com a brincadeira, e pensei em deixar pra a questão pra lá, mas ele continuou, após alguns segundos em silêncio - Miranda queria dar uma espécie de jantar em família com seu novo namorado, e eu não quis participar disso. E você é divertida, Leah.
- Nós sempre nos divertimos - não pude evitar sorrir, e ele concordou - Você não gosta desse cara ou algo do tipo?
- Eu não o conheço, na verdade. Só acho que... ela foi bem rápida - ele fez uma careta - Estou sendo um babaca, eu sei...
- Talvez ela só queira seguir em frente. Sei lá... - eu não conhecia a mãe de Mick, e não sabia muita coisa sobre sua família ou sua relação com o pai, mas me lembrava de ele ter mencionado o fato de as coisas não irem muito bem há algum tempo em vários aspectos, o que incluía o casamento de seus pais. - Ela parece feliz?
- Eu não sei, nós não temos conversado muito...
- Talvez você devesse tentar conversar com ela. Diga como você se sente sobre tudo isso e pergunte como ela se sente também.
- Isso soa inteligente. E você? Costuma ter esse tipo de conversa com seus pais?
- Costumava - eu disse, percebendo que, na verdade, não fazíamos isso há bastante tempo, e de repente senti saudades da época em que eu sentia que podia falar sobre tudo com eles, principalmente com meu pai. Ele sempre me esperava para conversar com uma xícara de chá quando as coisas não estavam indo bem. Sem julgamentos ou conselhos toscos, ele apenas me ouvia.
- Acho que eu não tenho seguido meu conselho há algum tempo - ri, tentando disfarçar o fato de que aquilo me deixava triste, de um jeito nostálgico - Mas ele continua bom.
- Talvez você devesse - ele disse, e percebi que estava certo. Eu deveria, mas como, se em alguns momentos eu não conseguia admitir nem pra mim mesma?
- Não queria que essa noite acabasse - falei, desejando não ter que voltar pra casa e pensar em todas as coisas que me deixavam triste. Eu só queria continuar aquela noite - simples e divertida, como tudo deveria ser. Como era quando estávamos juntos.
- Ela não precisa. O que quer fazer agora? - Mick perguntou, e de alguma forma nós acabamos deitados no chão de uma praça perto dali, falando sobre todas aquelas porcarias enquanto dividíamos uma garrafa de champanhe quente enquanto eu pensava que gostaria muito de tê-lo conhecido antes - antes de a minha vida virar um pesadelo do qual eu não conseguia fugir e eu acabar com medo demais de deixar qualquer pessoa se aproximar de verdade.
- Não posso ir assim pra casa - eu disse, limpando minha roupa ao me levantar da grama - Rebeca vai me matar se perceber que bebi...
- Você pode ir pra casa - ele disse, o que me pareceu tentador, mas eu não sabia o que sua mãe pensaria. Na única vez em que eu a vira, ela não me parecera muito amistosa e feliz com o fato de ter visitas, o que eu entendia, por causa das circunstâncias - Ou podemos prolongar isso até a manhã.

Já estava na metade da noite quando acabamos indo para a casa de Mick, sonolentos após o efeito da bebida começar a ir embora.
Nós tentávamos conter as risadas ao subirmos as escadas na escuridão, com medo de alguém tropeçar ou fazer algum barulho, e finalmente começamos a rir quando chegamos em seu quarto.
- Meu Deus, eu estou exausta - me sentei em sua cama, tirando meus sapatos, e sabia que eu precisaria ligar para Rebeca, mas não queria voltar pra casa, então enviei uma mensagem dizendo que eu demoraria um pouco mais a voltar, e Mick me levaria pra casa mais tarde. Eu sabia que no dia seguinte ela me faria perguntas, mas eu não queria voltar pra casa - eu não queria que aquela noite acabasse.
- Preciso tomar um banho. Fique à vontade - Mick disse, me mostrando como ligar seu video game, e joguei um pouco de resident evel até meus olhos estarem quase se fechando.
Só percebi que havia cochilado quando Mick colocava um cobertor sobre mim.
- O que está fazendo? - perguntei, observando-o desligar o abajur.
- Indo pra sala - ele sussurrou, e percebi que a porta estava um pouco aberta.
- Fique aqui.  Comigo - me afastei, sonolenta, dando um espaço para ele na cama, então ele se deitou ao meu lado, trazendo o cheiro de seu sabonete e da colônia que eu já conhecia.
Nós dividíamos seus fones de ouvido, que tocavam City and Colours, quando passei a mãos em seu cabelo molhado, que estava bagunçado, e ele me olhou daquela maneira, como se quisesse dizer algo importante, e suas mãos estavam em minhas costas, quentes, por dentro de minha camiseta, desenhando lentamente de um jeito indescritivelmente bom. Eu ainda me sentia borbulhante, mas já não podia culpar as taças de vinho.
Nós estávamos deitados em sua cama, sonolentos após um jantar delicioso, dançarmos até ficarmos cansados demais, e o champanhe quente naquela praça, e eu sabia que precisava voltar pra casa, mas eu sentia como se aquela noite estivesse sendo mágica, e eu não queria que acabasse. Eu sentia como se não fosse possível estarmos mais próximos e, ironicamente, eu queria chegar mais perto. Porque de alguma forma era como se abraçá-lo não fosse o bastante. Como se qualquer contato físico não fosse o suficiente.
- Você é a melhor coisa que já aconteceu. Sabe disso, não é? - ele disse, baixinho, e precisei, por alguns instantes, lembrar a mim mesma como respirar. Nossos rostos estavam tão próximos que eu precisei fechar meus olhos para não ser muito óbvia, porque senão ele saberia tudo o que eu estava sentindo aquela noite, todo aquele conjunto de cores explodindo dentro de mim, e eu não queria assustá-lo, porque eu já estava assustada e sem palavras demais. Então, quando ele disse, como se estivesse com medo da minha reação - com medo de que eu me levantasse a qualquer momento e saísse correndo pela porta, ou evaporasse, meu coração se apertou. Então era aquilo o que significava ser a melhor coisa de alguém. Então era aquilo o que significava ser importante pra alguém. Fechei os olhos, encostando minha cabeça em seu peito, e se eu pudesse - se houvesse espaço o suficiente, eu o teria puxado mais para perto. E antes que eu pudesse me controlar, eu estava limpando aquelas lágrimas idiotas, e ele percebeu. Droga, Mick, o que você está fazendo comigo?
Eu não sabia dizer porque eu me sentia tão emotiva de repente, mas talvez tivesse a ver com o fato de eu estar feliz. Depois de muitas noites de todo aquele pesadelo que insistia em me perseguir, eu finalmente pude respirar por alguns instantes, e me divertir. E ter um encontro normal - embora nós dois insistíssemos que não se tratava de um.
- Ei - ele tocou meu queixo gentilmente, me obrigando a encará-lo, e eu o fiz. Que se foda se ele quer ver. Já era tarde demais. Ele era importante demais.
- Desculpe. Eu...o que eu disse? - ele passou a mão atrás da cabeça, como fazia quando não sabia o que dizer.
- Só não vá embora - eu disse, e aquilo não fazia sentido nenhum, mas eu tinha medo. De alguma forma, acabar perdendo-o. De aquela amizade louca beirando a algo mais dar errado, e acabarmos nos magoando, porque eu não queria ser a parte magoada, e também odiaria feri-lo.
- Não vou a lugar algum, Lee - ele olhou bem no fundo dos meus olhos, e eu acreditei. Então, encostou, lentamente, como que pedindo minha permissão, seus lábios em minha bochecha, e permaneceu ali, por um tempo bem maior do que o necessário, e fechei os olhos, tentando guardar aquilo.
Então seus lábios desceram, ainda lentamente, para meu pescoço, e ele me encarava - nós não conseguíamos tirar os olhos um do outro, e eu o puxei para perto, porque eu não podia interromper aquilo. Era íntimo demais, bom demais. Ele beijou meu pescoço, e suas mãos estavam em todos os lugares - em minhas costas, pernas, em minha nuca, em meu cabelo, e de repente eu desabotoava sua camisa, revelando seu peito tatuado e a bela musculatura, então o toquei, porque nada daquilo parecia real.
- Você está incrível pra cacete também - eu disse , meus lábios perto de sua orelha, e ele estremeceu. Enlacei minhas pernas em volta de sua cintura quando ele tirou minha camiseta, e seus lábios urgentes encontraram os meus, então eu soube que era tarde demais, porque eu estava envolvida demais; e naquele momento não pensei em qualquer insegurança que eu pudesse eventualmente ter em relação à meu corpo, mas em seus lábios, doces e quentes, que estavam por toda parte.

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