Kaira abriu os olhos e não sabia ao acerto o que tinha acontecido, a fome havia se instalado de tal forma que ela não conseguia pensar direto, seu estomago se revirava e doía fazendo com que resmungasse baixinho toda vez que se aproximasse do horário de alguma refeição. Além de tudo havia a dor da surra que havia tomado, seu corpo ardia por conta das feridas e as costelas quebradas fazia sua respiração tornar-se pesada dolorosa, os hematomas coloriam seu rosto o deixando inchado e quase deformado. Ninguém a reconheceria.
Ela olhou para a cela que estava aberta, confusa olhou de novo para ter a certeza de que não estava louca. Só havia outra pessoa que sabia como sair daquelas celas sem ser pela porta principal, Kaira sabia disso. No chão havia um bilhete escrito que dizia que ela tinha exatos trinta minutos para dar o fora dali.
Era por culpa da sua mente confusa que ela não entendeu porque a ruiva tinha aberto a cela, por um lado se sentiu grata ao saber que sua guardiã não estava do lado do Will. Ela não sabia o porquê Gwen tinha feito aquilo mas sabia o que tinha que fazer. Apoiou as mãos no chão, ficou de joelhos engoliu a dor e levantou esgueirando-se na parede suja. Sentiu os ossos quebrados fazerem um ranger baixo, não deixou que nenhuma lágrima saísse. Ela precisaria de forças.
Ergueu o corpo e saiu da cela pisando vagarosamente, engoliu a dor usou o caminho pelo qual a própria irmã tinha fugido anos antes. Andou pelas celas tentando não fazer barulho – havia dado sorte por não ter mais grilhões em seus pulsos – no fundo do corredor mofado e escuro havia nada além de uma parede de tijolos. Kaira foi até ela e colocou a palma da mão no centro, fez o encantamento dizendo as palavras em hidryano e demorou até que o resto da sua magia despertasse. No lugar dos tijolos a porta surgiu.
Os pais dela tinham feito aquela porta para o caso do palácio ser invadido e precisassem fugir às pressas, era de grande ajuda e a deixaria a quilômetros do centro cidade, perto da floresta de Easly onde Cameron disse para que ela fosse. Abriu a porta e se perdeu no corredor escuro e com a impressão de infinito. O cheiro de mar era apenas impressão, o mar estava bem longe dali. Tudo estava bem longe dali.
~ o ~
Ela andou por horas até que pudesse ver a luz da lua no alto do céu estrelado, as lojas, boutiques, casas de chá estavam fechadas o que era bom para que Kaira fosse apenas mais uma sombra na noite. Apenas os bordeis estavam abertos, as prostitutas tomavam as ruas e nenhuma delas se importariam em notar ela.
Kaira fedia a suor e sangue, sentia fome, frio e dor. Tudo o que ela menos precisava naquele momento era ter que discutir com alguma prostituta ou dona de bordel mesmo que estivesse disposta a viver a própria alma para conseguir uma bebida quente e um pedaço de pão velho. Arrastou-se pelas ruas sentindo o vento gelado entrando em seus ferimentos. Os cabelos estavam desgrenhados, o rosto inchado por causa da surra, as roupas sujas e rasgadas, ninguém a reconheceria.
A única pessoa que a reconheceria naquelas condições estava morta, Kaira não queria pensar naquilo, não queria pensar que ele estava morto, porque se pensasse no corpo frio de Cameron sem vida não teria forças para chegar a Easly. Ela o amava, mesmo não tendo todas suas lembranças dentro de si, ela sabia que o amava e não queria pensar que nunca mais o veria. Porque doía demais, mais do que ela poderia aguentar. Se ela deixasse aquela dor sair, Kaira queimaria em magia e perderia aquilo que conquistou por causa dele. Perderia a si mesma novamente.
Andou pelo lado mais escuro da rua de paralelepípedos, longe das lâmpadas de gás que iluminavam a rua principal. Entrou em um beco e encostou na parede, se quer havia percebido que ofegava, que estava verdadeiramente exausta. Ouviu vozes vindo de um local mais à frente no beco, Kaira olhou e viu dois homens conversando e no meio deles uma prostituta loira rindo como se eles fossem lordes. Ela deu um passo na direção deles não querendo fazer barulho.
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Coroa de Vidro - Livro 1 (COMPLETA)
FantasyAprender a temê-la antes de amá-la é a primeira regra. Kaira Lancaster é a tirana rainha de Hidryan. Em uma noite da qual não se lembra enviou-se ao globo dos humanos deixando a magia e suas lembranças para trás. Tudo o que lhe restou são lembrança...