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Meus pais dizem que estão me salvando. Mas não é verdade, eles mantém seus desejos gananciosos nas profundezas de seus corações desde que nasci. Eu sei disso, sou filha deles, como não saberia?

Meus pensamentos vão e voltam de forma constante. Depois de tantos anos isso realmente está acontecendo, parece que o universo se diverte conspirando contra mim. Gostaria de poder rir dessa situação. Será que em algum momento do passado ou quem sabe até do futuro os jovens tiveram ou terão a opção de dizer não sem serem forçados ao sim?

Quero acreditar que sim, mas enquanto estou aqui, sentada ao lado dele e tendo de engolir todas as decisões dos meus pais calada, nenhuma esperança é capaz de entrar em minha cabeça.

A mão de Alden repousa sobre a minha. Ele sorri e conversa alegremente com meus pais. Para ele tudo é perfeito agora. Alden crê que terá herdeiros e que sua linhagem continuará a existir na Terra. Mas ele está sendo deixando para trás, e é o único que não vê isso.

Sua pele sobre a minha é extremamente desconfortável. O que deveria ser um toque de carinho, nada mais é do que uma encenação, o que mais me admira é o fato de todos perceberem isso, mas aceitarem como se ele realmente gostasse de mim.

Será que algum dia alguém me tocará desejando mais do que me lembrar que minha única "missão" na Terra é ter filhos?

Às vezes eu penso muito sobre isso. Sobre a possibilidade de poder escolher alguém de quem eu realmente goste. É um sonho louco. Uma ilusão. Mas é tão bom poder imaginar um lugar justo.

Olho para todos ainda um pouco atônita. Isso realmente está acontecendo comigo? Eu lutei tanto e parece que foi em vão.

Pelo menos devo admitir que Alden é muito melhor que os outros. Ele é jovem e bonito, devo dizer, seu corpo é perfeito, sem deformações como a maioria dos humanos se encontram, e ele acha que eu sou como ele...

Desde o século passado o mundo se encontra afogado em radioatividade. Os humanos fizeram isso e agora eles estão pagando por seus erros.

Meu pai tem inúmeras deformações em decorrência do nosso mundo tóxico, o que mais se destaca nele é o fato de possuir apenas uma perna, ele mal se move e quando precisa é muito difícil, ele sempre precisa de ajuda e vejo como isso o deixa constrangido, mas nesse momento não consigo sentir pena dele.

Minha mãe é praticamente surda e magra em excesso, não que passemos fome, quer dizer, não temos comida em fartura, mas pode-se dizer que vivemos bem.

– O que acha?

Olho para Alden ao meu lado. Não ouvi nada do que ele disse.

– O quê?

Uma leve expressão de irritação passa pelo seu rosto, imagino que por causa da presença dos meus pais na sala ele tenta fingir não se importar com minha completa falta de atenção e repete a pergunta.

– Perguntei se para você amanhã é um bom dia para conhecer minha família.

Tão cedo, penso comigo mesma.

Volto meu olhar para minha mãe que sutilmente faz um sinal de afirmação com a cabeça, embora ela não ouça muito bem é ótima em leitura labial, com certeza sabe do que a conversa se trata.

Volto-me para Alden.

– Sim. Amanhã é um ótimo dia.

Alden sorri de forma vazia. Ele percebe como minhas palavras saem sem emoção e não me importo, eu nunca quis ser sua noiva.

Meus pais voltam a conversar alegremente com Alden.

– Desde jovem jamais pensei em matrimônio – ele revela aos meus pais, e então volta seu olhar para mim –, mas quando vi Robyn imediatamente vislumbrei um futuro ao lado dela e senti que estava na hora de dar um rumo a minha vida.

Ele solta as palavras de forma inexpressiva e todos percebemos como Alden nem se esforça para nos convencer de sua repentina paixão por mim.

Sem alternativa melhor, volto para meu mundo distante.

Como a humanidade chegou a tanto?

Olho para a mão de Alden segurando a minha firmemente, como se eu pudesse fugir a qualquer momento e dessa forma ele conseguisse me impedir.

Não posso aceitar isso.

Aos 15 anos as meninas passam pela tão famosa "idade das noivas", que basicamente é a idade em que os pretendentes começam a surgir e barganhar com os pais das jovens pelas suas mãos. Quanto mais cedo os jovens se casam, mais cedo os filhos vem e é dessa forma que eles acham que podem curar a doença do mundo.

Atualmente é muito mais comum encontrar alguém cheio de deformações do que um humano perfeito como Alden, e eu deveria me sentir sortuda por isso, mas simplesmente não consigo.

Alden acha que eu sou perfeita. Acha que sou como ele e que ele tirou a sorte grande.

Fisicamente eu sou perfeita. Minha aparência não mostra meu verdadeiro estado de saúde. Tenho um problema nos pulmões além de não ter um aparelho reprodutivo completo, o que resulta no simples fato de que eu jamais poderei ter filhos, e quando Alden descobrir isso há uma grande chance dele me matar, pois no mundo de hoje, uma mulher só tem alguma relevância se puder gerar filhos.

Meus pais obviamente sabem de tudo isso, e tenho certeza que eles sabem o destino que me aguarda, mas eles não raciocinaram direito quando Alden trouxe para eles uma quantia mais que suficiente de suprimentos e objetos valiosos para me comprar. Eles me venderam para a morte.

Alden se levanta, pronto para ir embora e por instinto me ponho em pé como todos na sala, exceto meu pai.

Atenciosamente Alden se despede dos meus pais. Apesar do nojo estampado em sua face ele se despede de minha mãe lhe beijando a bochecha e ela me olha com um sorriso contido.

– Roby, que tal acompanhar seu noivo até a varanda?

Não consigo tirar a expressão de desagrado do meu rosto.

– Ora, a casa não é tão grande. Aposto que ele é totalmente capaz de encontrar a saída sozinho.

Minha mãe me repreende com um olhar e recorre ao meu pai com um olhar quase suplicante.

– Robyn, leve-o até a varanda.

Contenho a vontade de revirar os olhos e ando à frente de Alden em direção a porta que dá para a varanda.

Assim que chego a porta me viro e o encontro bloqueando meu caminho de volta. Alden caminha para a frente me ignorando e inconscientemente ando de costas até meus pés se depararem com os degraus da escada.

Antes que eu caia de forma catastrófica demonstrando todo o meu charme em frente ao meu noivo, Alden segura meus ombros e olha para mim sério.

– Não seja tão desastrada.

Tento me livrar de suas mãos, já as toquei demais por um dia, mas ele as mantém firmes em meus ombros.

– Solte-me – peço em voz baixa para que meus pais não ouçam e venham me mandar ceder a tudo que esse homem quiser.

Alden olha para suas mãos, perdido em pensamentos.

– Daqui há alguns dias te tocarei de forma muito mais íntima que essa. É melhor que se acostume.

Sinto minhas bochechas se aquecerem de raiva.

– Eu jamais permirei isso.

– É mesmo? E o que pretende fazer, donzela?

Ele solta uma sonora risada e aproxima o rosto do meu.

Fico totalmente perplexa ao sentir seus lábios sobre os meus e antes que eu o morda e lhe cause uma ferida para a vida toda ele se afasta sorrindo.

– Até amanhã, querida. Vista uma roupa decente.

Alden se afasta e desce os degraus da escada de madeira, anda até sua moto e some deixando uma nuvem de terra e poeira para trás.

Limpo meus lábios ainda sentindo meu rosto em chamas de pura raiva.

Desde que Alden me encontrou tenho apenas uma única certeza. Preciso sumir.

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ImperfeitosOnde histórias criam vida. Descubra agora