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Me mantenho concentrada ao máximo em buscar soluções aceitáveis, entretanto, quanto mais eu penso sobre o que fazer, mais tempo perco e fico ainda mais perdida.

Minha calma evaporou pouco a pouco durante os minutos anteriores, e saber que os Rhewn podem não mais estarem vivos me deixou cada vez mais sem saber como agir. Sei que sozinha não posso fazer nada, mas ainda sim quero ser capaz de fazer algo. Qualquer coisa para ajudá-los.

Axel não fez nada de útil até agora. Desde que chegamos até aqui, ele se sentou e apenas esperou. Não compreendo exatamente o que ele está fazendo, ele parece tão calmo quanto em qualquer outro dia.

O sol está se pondo e não há nenhuma movimentação estranha por aqui. Fico apreensiva ao pensar que os canibais podem ter levado os Rhewn para distante ou podem já tê-los feito de refeição.

Nunca ponderei sobre o porquê de algumas pessoas terem adquirido esse hábito estranho e inumano, afinal, somos todos iguais fisicamente, como eles podem escolher os que vão para a panela e os que continuarão a viver? Isso simplesmente não parece certo. Não é certo e ponto.

– Sei exatamente o que vamos fazer – Axel anuncia. Me levanto imediatamente e me aproximo dele para ouvir. – Apenas me dê alguns minutos para rastreá-los. Me espere aqui.

Axel se levanta antes que eu diga qualquer coisa e caminha na direção do leste até sumir de vista.

Vou até a caminhonete e decido preparar uma mochila com cordas, cobertores, comida, água e uma lanterna, talvez sejam necessárias em breve.

Assim que Axel retorna, termino de preparar a segunda mochila, uma para ele e uma para mim. Suponho que deixaremos a moto e o resto das nossas bagagens próximos da caminhonete. Temos que ser o mais discreto possível.

– Descobriu alguma coisa?

Axel está com uma expressão sombria e evita encarar meus olhos. De repente ele estende sua mão esquerda para mim e vejo algo preso em seus dedos.

Caminho até ele e pego o que agora percebo ser – cabelos humanos – em suas mãos. Cabelos loiros e lisos, como os de Louise.

– O que isso pode significar? – pergunto enquanto luto para manter minha voz uniforme.

Ele não responde de imediato, escolhe suas palavras como se elas pudessem me machucar.

– Quando eu estava com um grupo de canibais do sul, eles costumavam cortar os cabelos dos humanos que seriam a próxima refeição.

Imagino uma Louise sem seus cabelos dourados, é horrível, e infelizmente ainda me recordo como a tratei na última vez em que nos vimos.

– Acha que os encontraremos a tempo? – pergunto e mal controlo a aflição crescente em mim.

Axel não me responde e não tenho certeza se quero saber o que isso significa.

Baixo meus olhos para a terra sob meus pés e tento encontrar conforto na minha imaginação, que se encontra mais esperançosa do que qualquer outra parte de mim.

–Temos que agir – anuncio. – Temos que agir agora.

Ele me ouve, mas decide que – aparentemente – me ignorar é mais interessante.

– O que você acha que está fazendo? – questiono quando Axel se joga no chão sem a menor cerimônia.

– Estou me sentando aqui, não tão confortavelmente, enquanto espero que os Rhewn sejam salvos milagrosamente.

– Você não acredita em milagres. Na verdade, acho que você não acredita em nada além de si mesmo.

Axel não tenta se defender. Creio que ambos sabemos o quão certa eu estou.

– Por que ao menos uma vez na vida você não deixa de pensar em si mesmo? Por que sempre tem que se colocar em primeiro lugar?

– Você não tem direito algum de me julgar, Robyn. Sim, eu sei que sou um grande egoísta, mas eu não sou o único e não me importo em ser assim.

Certo, ele tem razão. Posso ser como ele, mas pelo menos estou me esforçando para mudar isso. Descobri recentemente que não quero passar a vida toda sozinha ou com medo de ser ferida, e para isso tenho que deixar de ser egoísta como tenho sido.

– Você prometeu que me ajudaria a encontrar e salvar os Rhewn. – Começo a apelar para o seu lado nobre, embora eu jamais tenha visto traços de uma personalidade nobre nele.

– E eu vou. Por acaso você acha que isso vai ser fácil? Temos que planejar muito bem o que vamos fazer.

– Mas estamos perdendo muito tempo. E se chegarmos tarde demais?

Axel de repente se levanta e deixa de lado sua pose relaxada.

– Por acaso acha que eu não estou pensando nisso? Sei que se nós demorarmos eles podem não sobreviver por muito tempo, mas o que você sugere que eu faça? Que nós façamos?

Sua expressão adquire traços de nervosismo e preocupação, além de um pouco da insanidade que ele sempre carrega consigo. Talvez eu tenha subestimado seus mais profundos sentimentos.

Na verdade eu o subestimei desde o dia em que o conheci, e agora percebo como isso foi um erro completo.

Axel é muito maior do que o que deixa o mundo ver. É muito maior do que o que os meus olhos insistem em ver.

– Não faça essa expressão – ele diz, me fazendo desviar dos meus pensamentos de outrora.

– Que expressão? – pergunto, distraída.

– Como se só agora descobrisse que eu sou humano também.

– Desculpe.

– Não peça desculpa, isso não muda seus pensamentos, seus sentimentos.

Fico tentada a me desculpar novamente, embora eu não saiba exatamente o porquê disso.

– Ouça, Robyn. Eu não posso prometer que vou resolver essa situação e tudo será como antes, mas farei o possível. Fique ciente disso. Só peço que me dê um pouco de tempo e confiança.

Concordo com um leve aceno de cabeça. Nós dois poderemos resolver isso. De alguma forma miraculosa.

– Tudo bem. – Solto uma respiração profunda e um pouco trêmula.

Axel se aproxima e antes que qualquer um de nós dois raciocine, ele segura meu rosto entre suas mãos e faz com que eu o encare.

Suas pupilas estão dilatadas e sua respiração descompassada. Como se ele tivesse acabado de cometer o ato mais insano de toda a sua vida – ou estivesse prestes a cometer.

– Quando tudo isso acabar, eu ainda estarei esperando sua resposta, Robyn, e antes que você diga que pode não estar pronta, saiba que eu continuarei esperando.

Olho para sua boca, tão próxima da minha. Sei que eu deveria me afastar e – sobretudo – afastar ele dos meus pensamentos e sentimentos, mas há algo magnético em sua presença e na minha própria. Somos como ímãs e nossos núcleos atraem um ao outro. Agora consigo perceber isso.

Axel acaricia meu rosto com dedos suaves e seu toque é quase fantasmagórico.

– Robyn...

Mal encontro minha voz na hora de responder.

– Sim...?

– Tenho que te fazer um pedido.

Seu rosto fica perigosamente perto e sua respiração irregular atinge meu rosto.

– Diga.

Não sei exatamente o que eu espero ouvir, mas vindo do Axel, imagino que será algo que vai me deixar confusa. Como sempre.

– Sonhe comigo.

Antes que eu lhe pergunte o que isso significa, Axel segura mais firmemente minha cabeça e a bate na árvore atrás de mim. Minha visão começa a ficar nublada e tudo se distancia.

Fecho os olhos sem vontade antes de deixar meu corpo desabar em direção ao nada.

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ImperfeitosOnde histórias criam vida. Descubra agora