Imperfeitos

Epílogo

Em algum lugar desse mundo devastado, meu irmão está enterrado. Ele repousa em paz, na escuridão, para onde todos iremos algum dia.

O mundo continua de uma cor alaranjada e doentia aqui fora, como se nunca fosse se curar e devemos nos contentar com o que ele tem para oferecer. Por mim tudo bem, aprendi com alguns tropeços e algumas dores que não posso mudar isso.

Enquanto o carro segue na direção do sul por uma estrada reta e cheia de obstáculos, tanto literais quanto não literais, não deixo de me perguntar o que encontraremos lá atrás, no passado que deixamos há alguns meses e há alguns quilômetros. Talvez o pai de Axel já não esteja mais vivo, ou quem sabe meu próprio pai.

Hoje não o vejo mais como o homem ruim de antes, eu achava que ele não tinha coração assim como não tinha uma perna, percebo o quão tola eu fui. Todas as pessoas têm coração, mas nem todas cultivam bons sentimentos dentro dele. Sou uma iniciante em tudo isso de bons sentimentos.

Pretendemos primeiro fazer uma parada em minha casa, então Axel conhecerá meus pais e depois eu apresentarei Constance à eles, é assim que Axel e eu temos nos referido ao filho de Eve, porque – por algum motivo – queremos que seja uma garota.

Também direi aos meus pais que Roman se foi. Eu sei que minha mãe vai começar a chorar e eu terei de abraçá-la porque também chorarei. Será o primeiro abraço que darei nela em anos e encontrarei o amor e conforto que ela sempre quis me dar.

Talvez meu pai não vá expressar reação alguma diante de nós, mas em seu interior algo se partirá para sempre.

Por último, direi à eles que sei por que me venderam ao Alden, porque eles queriam salvar uma outra garota que sequer conheciam – coincidentemente a mãe do filho de Roman, e eu os perdoarei e me permitirei amá-los da forma como amo Mariz e Brakko.

Axel e eu partiremos novamente, dessa vez para sua casa. Encontraremos seu irmão e seu pai e cuidaremos dos dois. Tentaremos transformar os últimos momentos do Sr. Westland nessa terra em dias decentes, mesmo que ele não queira colaborar.

Alden não precisa de tantos cuidados, pelo menos não físicos, mas ele estará cansado de cuidar do pai sozinho e de aturar todos os sentimentos negativos do mesmo, daremos à ele um descanso e tentaremos mostrar para ele que nem tudo se resume à tristeza nesse mundo.

Quando o tempo passar e o pai de Axel deixar de existir aqui, talvez, com muita coragem, voltemos para Alexandrena com meus pais e Alden. Eles merecem o máximo que a vida pode oferecer. Então, iremos parar no túmulo de Roman, lhe dizer obrigada e adeus, e que sua existência teve um significado gigante para nós. Que ele foi amado e sempre será, até mesmo por seu filho que nem chegou a conhecer.

Se e quando voltarmos à Alexandrena, finalmente poderemos recomeçar de verdade. Construir uma nova vida, mas não sob as ruínas de nossa antiga vida, porque o passado, em muitos momentos, pode ser tão importante quanto o futuro.

Abraçaremos todas as pessoas possíveis de Alexandrena, alimentaremos meus pais decentemente, para que seus dias sejam felizes e pacíficos. Quem sabe até lá, Eve já tenha dado à luz e poderemos finalmente conhecer Constance ou Roman.

Encontraremos empregos, teremos casa e comida. Uma família feita de vários sangues diferentes. Nós nos juntaremos algum dia, em um lugar confortável e alguém dirá: “Vocês se lembram quando...”, e voltaremos ao passado como espectadores, sem precisar sentir tudo aquilo na pele novamente.

Sempre que for possível, até o fim dos meus dias, abraçarei aqueles que amo, beijarei Axel profundamente e me permitirei sentir todos aqueles sentimentos que reprimi uma vez. Direi que os amo e que nada no mundo poderia ser melhor do que a presença de cada um deles.

Então, ao final de cada dia, cada um de nós voltará para seu quarto, sabendo que nunca mais estará sozinho. Sabendo que é amado profundamente. Saberemos que não somos imperfeitos.

Somos milagres.

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