10

116 36 15
                                    


Algo me acorda. Não sei identificar o que foi que me acordou, mas sinto que não pode ser algo bom.

O sol ainda está fraco. Não deve passar das oito da manhã ainda, mas já deveríamos estar caminhando a pelo menos duas horas.

Me levanto e o som de gargalhadas distantes chega até meus ouvidos. Olho para a direção do som e um pequeno grupo de três pessoas caminham lentamente para perto de nós. Eles ainda não nos viram e agradeço aos céus por isso. Sem dúvida são canibais.

Volto para o chão e rastejo até Eve. Agora sei porque ainda estamos aqui. Ela está dormindo.

Bato de leve em seu ombro e quando ela finalmente abre os olhos faço sinal de silêncio e aponto para a direção do grupo de canibais.

– Acorde Roman, eu vou guardar nossas coisas. Não faça barulho. – Sussurro e logo começo a guardar tudo ao nosso redor.

Assim que tudo está pronto nos preparamos para correr. Não podemos nos dar ao luxo de esperar mais.

Por incrível que pareça não estou tão irritada quanto deveria com Eve. Eu deveria ter imaginado que isso ia acontecer uma hora ou outra.

Não há tempo para discussões, e a julgar pelo olhar de Eve, ela já se sente culpada o bastante sem minha ajuda.

Começamos a correr na direção do leste, tentamos colocar o máximo de possível de distância entre nós e os canibais. Creio que eles ainda não notaram nossa presença, e se notaram não fizeram um alarde tão grande a ponto de ouvirmos.

Quinhentos metros à frente percebemos outra floresta quase morta no nosso caminho e sem precisar dizer nada, todos nos dirigimos para lá.

Logo sinto meus pulmões protestando e mal posso imaginar como a garganta de Roman está. Eve é a única de nós com uma saúde aceitável, mas ela está cansada, não dormiu a noite toda e está carregando uma das malas consigo.

Alguns metros antes de alcançarmos a floresta, ouço os gritos deles atrás de nossa. Agora não tenho dúvidas de que eles perceberam nossa presença.

Entramos na floresta fazendo o possível para permanecemos juntos, mas isso só vai chamar a atenção dos canibais quando eles chegarem na floresta.

– Roman... – Digo ofegante. – Eve. Parem.

Eles começam a diminuir os passos e eu me aproximo mais deles.

– Vão para o oeste e me esperem na primeira ruína que encontrarem.

– Por que está dizendo isso? – Roman pergunta para logo em seguida tossir e cuspir sangue.

– Precisamos nos separar ou só chamaremos mais atenção. Faça o que eu disse.

Roman, ainda indeciso, se aproxima de mim e me dá um rápido abraço. Assim que se afasta, entrego minha mala para ele.

– Não vou deixar você fazer isso.

– Você não tem escolha. De todos nós sou a mais veloz. Só faça o que eu disse, eu volto assim que puder.

Eve segura a mão de Roman e começa a puxá-lo para longe de mim, na direção em que eu os mandei seguir.

– De quanto tempo precisa? – Eve pergunta, já que Roman se encontra cuspindo ainda mais sangue.

– Me deem dois dias. Vão logo!

Roman e Eve começam a correr para o oeste. Já eu espero alguns segundos antes de continuar a correr para o leste.

Enquanto corro faço o máximo possível de barulho para chamar a atenção dos canibais na minha direção. Como o esperado, eles começam a me seguir.

.

Não tenho ideia de por quanto tempo corri trôpega através da floresta. Caí várias vezes e ainda mais vezes tive vontade de desistir e só permanecer parada para aliviar o cansaço e a forte ardência em meus pulmões.

Por Roman eu prossegui, ainda que meu corpo gritasse o contrário.

Faz alguns minutos que já não ouço nada atrás de mim. Estou torcendo para tê-los despistado ou que eles estejam mais cansados que eu. Ainda assim, prefiro não facilitar minha captura e me forço a continuar em frente.

Estou com muita sede. Nesse momento me arrependo de ter entregado minha mala para Roman sem antes ter pego uma garrafa de água.

Tento ao máximo afastar os pensamentos de sede, fome e cansaço da minha cabeça, mesmo sabendo que isso não vai afastar o que eu estou sentindo, nem mesmo amenizar.

Antes que eu possa impedir a mim mesma, já estou desacelerando meus passos em busca de algum alívio.

Com medo de acabar caindo e não conseguir me levantar, me obrigo a andar até uma grande árvore e me agaicho atrás dela.

Coloco ambas as mãos sobre a boca e tento abafar o som da minha respiração. Tudo está silencioso demais e isso me apavora profundamente.

Me arrisco a olhar para trás de mim e da árvore. Não há absolutamente nada, apenas árvores mortas.

Volto a mesma posição de antes. Estou cansada demais para prosseguir, no entanto quero voltar a andar logo para encontrar Roman e Eve, infelizmente meu corpo acha que precisa de mais tempo para se recuperar dessa corrida desenfreada.

O homem que passou por mim no lago pode fazer parte desse grupo de canibais. Ele me parecia tão familiar, mas ainda não sei exatamente o quê, não pude ver direito seu rosto.

Um luz se acende em minha cabeça.

Era Axel. Tenho quase certeza de que era ele.

Axel é mais alto que a maioria das pessoas, seus cabelos são desgrenhados e negros como a noite. Isso o torna quase inconfundível, e se eu estiver certa, isso significa que os Westland estão muito mais próximos do que eu imaginei.

Preciso correr. Preciso avisar Eve e meu irmão antes que Alden e Axel os alcancem, caso contrário, logo Roman estará morto. Eve é a única que possui algum valor viva.

Me amparo da árvore com as mãos e começo a me levantar devagar. Assim que me encontro em pé, dou a mim mesma alguns segundos de descanso.

Ouço o som de passos pisando sobre algumas folhas secas, e antes de qualquer movimento meu, uma dor lancinante me atinge atrás da cabeça. Minha visão se enche de manchas brancas e pretas e meu corpo tomba para a frente.

Antes que meu rosto atinja o chão já perdi a consciência.

.
.
.

ImperfeitosOnde histórias criam vida. Descubra agora