16

90 27 41
                                    


Uma semana se passa e durante esses dias todos têm sido extremamente atenciosos comigo, chega a ser sufocante.

Roman e Eve vem para a barraca trazer minhas refeições e sempre comem comigo. Não conversamos muito e não me esforço para isso, sei que nenhum dos dois acredita em como me machuquei e discutir sobre isso agora não é uma opção para mim.

Louise também vem me ver, infelizmente com mais frequência que os outros. Todas as tardes ela entra na barraca sem avisar e começa a me encher de perguntas estúpidas. Perguntou-me ontem se minhas costelas ainda doem muito e eu me ofereci para chutar as costelas dela para lhe proporcionar uma sensação cem porcento real.

Mesmo que Louise saiba que não é bem vinda, ela sempre ignora minhas hostilidades e permanece comigo até o sol se pôr e seus pais a obrigarem a me deixar sozinha.

Descobri recentemente que Eve e Roman estão dormindo na traseira da caminhonete já que não há barracas suficiente para todos. Na verdade, há apenas duas, uma para os adultos e a que eu ocupo, que pertence aos filhos de Mariz.

Assim que eu conseguir me levantar e me locomover sem sentir tanto incômodo pretendo deixar a barraca livre para Chelsea, Keun e Louise. Dessa forma Roman e Eve poderão dormir dentro da caminhonete, onde há mais conforto para se passar a noite.

Brakko disse que podemos permanecer nesse acampamento por tempo o suficiente para eu me curar quase completamente, já não estamos mais no território dos canibais, agora só precisamos nos preocupar com os animais na floresta que nos cerca.

.

Quando Roman e Eve vem me trazer meu almoço já estou sentada.

– Como está? – Pergunta Roman.

– Muito melhor – respondo, embora a região do meu tórax ainda doa um pouco.

– Isso é um ótimo progresso para uma semana – Eve comenta com um tímido sorriso. – Há um rio aqui perto, se quiser tirar a poeira dos ossos te levo lá depois.

Concordo com um aceno.

– Seria ótimo. Sinto que estou começando a mofar aqui. Além disso Louise tem me perturbado com muita frequência.

Roman e Eve riem de minha desgraça.

– Como ela pôde gostar de alguém tão rabugenta? – Roman pergunta a si mesmo e logo volta a rir.

Deixo de comer e o observo.

– Acho que ela está esperando por um belo chute no traseiro para ter certeza do quão rabugenta eu sou.

– Pelo menos tente ser amigável com ela – Roman me aconselha –, não esqueça que foi a família dela que nos acolheu.

– Sim, eu sei, e sou extremamente agradecida por isso, mas não é problema meu se nunca me dei bem com crianças.

Roman e Eve entreolham-se e deixam o assunto de lado. Logo estamos todos comendo em silêncio.

No final da tarde Eve me leva até o rio que havia mencionado mais cedo e me deixa sozinha para me banhar.

Depois que julgo estar quase cem porcento limpa, me seco e troco de roupa e enquanto seco meu cabelo vejo Axel do outro lado do rio.

Pisco inúmeras vezes. Sei que ele não esta aqui, não pode ter me encontrado tão rápido.

Mas é a imagem mais real que meus olhos já viram nesse mundo. Ele está exatamente como sempre, botas de combate, jaqueta de couro, mesmo com o calor escaldante de fim de tarde e calças jeans surradas. Cabelos levemente desgrenhados e os olhos cinzas brilhantes, como um rio de prata.

Fico perturbada ao perceber que em uma ínfima parte de meu ser, a ideia de vê-lo aqui não é tão repugnante ou estressante, na verdade, é um pouco o oposto disso tudo.

Dou as costas a sua miragem e espero que ele suma para sempre.

Quando me volto para o rio ele ainda está lá, mas como se soubesse que não é bem vindo, pisca para mim e vai embora entre as árvores da floresta.

Respiro aliviada e ouço alguém se aproximar. Me volto para trás e vejo meu irmão.

– Aconteceu alguma coisa? – Ele indaga me observando com curiosidade.

Antes que eu responda à ele que não, uma força maior me faz voltar atrás e decido lhe dizer tudo o que eu omiti dele. Não quero que minhas mentiras nos afastem.

– Eu não caí de um desfiladeiro. Eu fui pega pelos canibais e consegui fugir.

Ele suspira em aceitação, eu imagino.

– Era isso o que eu temia.

– Eu achei que estava poupando você de mais uma preocupação.

Roman caminha até estar parado na minha frente, à poucos centímetros de distância.

– Quando você mente para mim ou me esconde coisas importantes, eu sinto que não sou digno da sua confiança.

Baixo a cabeça, um tanto envergonhada e culpada.

– Você é a pessoa mais importante da minha vida e o mais digno que eu conheço, mas eu sempre acho que posso feri-lo e tento contornar isso.

– Não se preocupe comigo e meus sentimentos, Roby, alguns corações foram feitos para serem feridos.

Eu o abraço e sussurro em meus pensamentos me desculpe várias vezes, pois não tenho coragem de dizer isso em voz alta para ele, parece que se eu pronunciar um pedido de desculpas tudo pode piorar repentinamente.

Roman me ajuda a voltar para o acampamento e diferente dos dias anteriores, como junto com todos os outros, do lado de fora da barraca, ao redor da fogueira. Pela primeira vez em muito tempo sinto que pertenço à algum lugar ou a alguém.

.
.
.

ImperfeitosOnde histórias criam vida. Descubra agora