Próximo da alvorada, estou tão exausta que tudo o que quero é fechar os olhos por alguns minutos, mas embora esse desejo seja forte o bastante meu instinto de sobrevivência não me permite fraquejar.Axel e os canibais passaram boa parte da noite e da madrugada acordados, e para não levantar suspeitas Axel não se aproximou mais de mim.
Quanto mais as horas passam, mais começo a acreditar que talvez Axel tenha feito uma armadilha para mim, afinal ele já tem o que queria e fora o colar não existem mais motivos para ele me manter viva, a não ser que ele vá me capturar assim que eu fugir dos canibais e me levar para seu irmão.
Se ele tentar alguma coisa eu vou matá-lo.
No entanto, eu mesma presenciei o ódio que há entre os irmãos Westland, sendo assim não há motivo no mundo que faria um ajudar o outro.
Assim que o céu começa a clarear no horizonte os canibais resolvem se deitar. Para não levantar suspeitas, faço o mesmo sentado sobre minhas pernas, mas tomo o cuidado de não revelar o canivete e o escondo da melhor forma possível entre minhas pernas.
Não preciso fingir que estou cansada para convencê-los disso.
Trinta minutos depois, dois dos canibais encontram-se dormindo, Axel fica próximo da fogueira se recusando adormecer e o canibal que esfaqueou o garoto para o jantar repugnante, está deitado, com os olhos presos em mim.
Longos minutos se passam e continuo na mesma posição, esperando por uma brecha para escapar daqui. Infelizmente, em nenhum desses longos minutos o canibal tirou os olhos de mim, não é como se ele soubesse o que pretendo fazer. É outro tipo de olhar, um mais sombrio.
Algum tempo depois o canibal se levanta e anda vagarosamente até mim. Ele me olha de uma forma aterrorizante e cada pelo do meu corpo se põe em pé em uma velocidade inacreditável.
Procuro Axel com os olhos. Ele está ainda próximo à fogueira e olha para o canibal com curiosidade, não parece com muita vontade de detê-lo.
Quero dizer à ele para me salvar, mas me encontro totalmente paralisada quando o canibal para à minha frente e passa a língua pelos lábios.
– Qual seu nome? – pergunta descendo o olhar para o resto do meu corpo.
Fico calada e isso o irrita. Antes que eu possa fazer qualquer coisa o canibal desfere um chute contra meu estômago, forte o suficiente para eu quase tombar para a frente.
– Eu estou falando com você! – Ele ruge e dessa vez me chuta sobre as costelas, minha respiração começa a sair entrecortada. – Você gostou disso?
Pergunta para depois me chutar no mesmo lugar.
Ele começa a rir quando meu corpo cai para a frente, meus braços amarrados são as únicas coisas que me impedem de cair com o rosto contra a terra.
– Você parecia bem mais forte quando Axel a capturou.
Ergo a cabeça e olho para Axel. Ele me encara sem expressão.
– Desgraçado! – Grito incapaz de conter minha fúria e não me importo se isso vá estragar meus planos para escapar. Eu confiei nele. – Seu bastardo! Monstro!
O canibal continua a rir enquanto grito inúmeros impropérios para um Axel inabalável.
Quando paro de gritar e volto a minha posição anterior, ofego em desespero. Nunca estive tão sozinha como agora.
– Ah, vamos lá, garota! O que você achou? Precisamos nos alimentar e Axel trouxe uma ótima refeição para nós.
O duplo sentido em suas palavras não me passa despercebido e olho para cima.
– Porco imundo!
Gostaria de cuspir em sua cara, mas as condições não estão muito favoráveis para mim neste momento.
Ele volta a me chutar e dessa vez usa toda a sua força, pois sinto todos os órgãos que ele acertou surpresos e desesperados.
Outro chute acerta meu rosto e no instante seguinte meu nariz jorra sangue. Felizmente percebo que ele não está quebrado, por enquanto...
– Parece que respeito é uma palavra que você desconhece, não é mesmo? Mas não tem problema, querida, temos todo o tempo do mundo e eu não vejo problemas em ensinar à você algumas coisas que claramente você precisa saber.
Mantenho a cabeça abaixada para o sangue escorrer e tento evitar confrontá-lo novamente, mas acredito que o estrago já tenha sido feito.
Antes que eu possa me preparar, o canibal acerta uma série de chutes contra meu peito, costelas e barriga. São tantos e tão fortes que não posso nem contá-los e muito menos impedi-los.
– Agora que você está mais mansa, que tal tentarmos algo diferente?
Logo sinto suas mãos segurando meus ombros e tentando me colocar em pé. Não tenho mais tempo.
Inutilmente tento alcançar o canivete entre minhas pernas, mas como meus braços ainda estão presos atrás da árvore mal posso alcançar meus pés.
Tento ao máximo permanecer no chão, assim que ele conseguir me levantar o canivete cairá no chão e junto com ele perderei minha única chance de fugir.
De repente Axel surge por trás do canibal com uma faca em punho. Com um único golpe, rápido e preciso, ele perfura a jugular do canibal e tapa sua boca com a outra mão, tentando impedir que ele acorde os outros dois canibais.
Assim que o canibal para de se debater, Axel o coloca no chão. Partes do meu corpo estão com sangue, não sei distinguir o que é meu e o que é do cadáver à minha frente.
Axel se aproxima de mim, ainda segurando a faca, a qual está completamente coberta de sangue fresco. No instante em que ele se abaixa, tento me afastar, não tenho dúvidas de que em um surto de loucura ele poderia fazer comigo o mesmo que fez com o canibal.
– Tenha calma. Eu sou o mocinho da nossa história – ele diz e pisca para mim como se não tivesse acabado de matar uma pessoa.
Ele logo corta as cordas que prendem meus pulsos e agarro o canivete entre minhas pernas e o aponto para Axel.
– Não se aproxime de mim.
Me levanto e começo a andar de costas na direção em que Eve e Roman seguiram.
– Poderíamos matar um ao outro – diz, pensativo. – Não seria tão mau, não é, Robyn? Estamos amaldiçoados nessa terra. Nunca somos felizes o bastante, e sempre somos tristes demais.
Nego com um movimento de cabeça.
– Sua proposta é um tanto atraente, Axel, mas eu tenho um irmão para tomar conta.
Axel sorri e um momento depois a loucura parece deixar seus olhos.
– Aqui. – Fala e se abaixa, pega uma garrafa com água e joga para mim. – Até breve, jovem Robyn – em seguida pisca novamente e começa a correr na direção oposta à minha.
O observo até ele sumir de vista.
Começo a correr para o oeste. Não sei se é uma boa ideia deixar os outros dois canibais vivos, mas como não quero que mais nada de errado aconteça, apenas me mantenho correndo até perder a noção das horas.
A única coisa que eu tenho certeza nesse momento é que verei Axel mais cedo ou mais tarde, não sei que sentimentos essa revelação me proporciona.
Até breve.
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Imperfeitos
Science FictionEm um futuro pós-apocalíptico, onde as jovens são forçadas a se casar e a terem inúmeros filhos com o intuito de "salvar o mundo", Robyn Leatherwood de 17 anos não aceita seu destino e quando fica noiva de Alden, decide que é hora de mudar seu futur...