Cap. 6: Explosões Silenciosas

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Meu queixo caiu, e uma onda gigantesca de emoções irrompeu em meu interior. Minha consciência foi arrastada para longe, meus batimentos cardíacos aceleraram e eu senti que não conseguia respirar. Achei que nunca mais fosse vê-lo novamente, mas ali estava meu artista.

Ônix estava com as mãos nos bolsos da calça social preta, que contrastava com a camisa cinza e de mangas dobradas. Seu cabelo, liso como de costume, obviamente estava mais comprido, cobrindo-lhe a testa. Ele caminhava lenta e inexpressivamente, porém olhava ao redor com frequência.

Sentindo uma dor profunda e agonizante, percebi que ele me procurava.

- Cheguei, irmãozinho! - Thereza exclamou, saltando para o palanque - Vem, amorzinho!

Ela dirigiu-se a Ônix, que apenas encarou-a de maneira séria. O artista obrigou-se a andar mais rápido, para seguir sua compradora. Também acabei andando em direção ao palco, mas o motivo não era mais Luigi. Me peguei praticamente correndo, com os olhos ardendo.

- Ah, aí está ela! - exclamou Luigi, vendo-me subir ao palco - Minha querida mãe chegou também.

Os olhos de Ônix se arregalaram quando, um na frente do outro, nos vimos pela primeira vez após meses. Seus olhos verdes e pretos umdeceram, enquanto meu coração acelerou ainda mais. Percebi que ele falaria alguma coisa, assim que seus lábios emoldurados abriram-se levemente e...

- Mãe, venha mais rápido, por favor. - insistiu Luigi, totalmente alheio ao maremoto dentro de mim.

Hesitante, virei a cabeça de lado, tentando controlar a respiração. Eu precisava me distrair, se não ia acabar fazendo alguma besteira enorme.

Avril Howards Mangini, a esposa de Carlos, subiu ao palco. Ela estava tremendo como de costume e piscando incessantemente, como que em pânico. Seus cabelos, que um dia deveriam ter sido de um ruivo intenso, agora eram completamente grisalhos, o que envelhecia muito mais seu rosto de 56 anos. Ela não tinha muitas rugas (graças ao remédio), mas sua pele tinha desenvolvido marcas com o tempo, que assemelhavam-se a largas sardas espalhadas por seu rosto e corpo. Seus lábios estavam sempre franzidos de estresse, e seus olhos azuis demonstravam uma vulnerabilidade penosa. Observei-a juntar-se ao marido de maneira amedrontada, com um vestido azul claro que ia até a metade do pescoço e tinha mangas longas. Desviei o olhar da cena assim que Carlos ignorou-a por completo, como de costume.

Antes de Luigi continuar, no entanto, Lucca apareceu, pondo-se ao lado da irmã. Ele parecia tenso no mesmo nível que a mãe, tendo como disfarce apenas a inexpressividade em seu rosto. Thereza, em comparação, sorria e balançava o corpo de um lado para o outro.

- Agora sim, as coisas estão em seu lugar. - Luigi girou, sorrindo - Então, vamos começar com a programação...

Fiquei estática, sem conseguir pensar direito. O que eu faria a seguir? Ou melhor, o que eu podia fazer a seguir?

- Primeiro, teremos nosso jantar, e em seguida trataremos dos negócios. Convido-os a hospedarem-se aqui, meus amigos, claro. - Luigi indicou o cômodo - enquanto isso, podem aproveitar os aperitivos. O banquete está se encaminhando, garanto-lhes

Eu já nem ouvia mais. Ônix, pelo jeito, também não.

Ele estava a um palmo de distância agora, o rosto repleto do mais puro desespero. Identifiquei-me com suas emoções, sentindo a pulsação parar subitamente. Meu interior revirado insistia em acreditar na impressão de que iria acabar perto dele em breve.

- Vamos lá, amorzinho! - uma voz irritante gritou, revirando os cacos da minha alma rachada - ah, oi, Alessa!

Não consegui me virar para a ruiva, estando de costas para a mesma. Apenas tive a capacidade de observar Ônix hesitar e então, com um sofrimento ainda mais palpável e uma careta rápida, seguí-la.

- Vamos lá, perfeição. Vejo que já se apresentou à minha irmã e ao noivo dela. - pude sentir a alegria na voz ácida de Luigi - A janta estará pronta em breve, e você precisa me acompanhar.

O demônio ruivo me agarrou pelo braço e me tirou dali.

×××

Não sei como cheguei à mesa ou quando o jantar iniciou, sei apenas que me peguei olhando para o vazio, com uma colher de sopa em mãos.

Ônix, cujo qual eu não encarara mais, estava sentado ao meu lado, igualmente rígido. Nenhum de nós podia abrir a boca sem levantar suspeitas, mesmo que Thereza parecesse já saber de tudo. A irmãzinha do dêmonio não me olhava nos olhos, sentada do outro lado da mesa, mas um sorriso enorme e maldoso tornara-se permanente em seus lábios.

- Atenção, atenção! - Carlos exclamou, batendo em uma taça. O homem estava sentado na cabeceira da enorme mesa da sala de jantar, cercado de sua família - Quero brindar esta noite. À Sociedade!

- À Sociedade! - seus telespectadores responderam em coro, batendo palmas a seguir.

Eu não tive vontade suficiente para fingir entusiasmo daquela vez. Até porque me ocupei, engasgando com a sopa de gosto estranho que enfiei na boca, graças ao leve toque da mão de Ônix em meu braço. Ele cutucou-me insistente porém levemente, o que fez meu estômago revirar-se outra vez.

Quando pensei em pará-lo, esticando minha mão em sua direção, arrepiei-me novamente: o artista entrelaçou seus dedos delicados nos meus, de um modo que seria impossível de soltar discretamente.

Virei-me de leve em sua direção, percebendo as íris coloridas e brilhantes que me encaravam de volta. Ele possuía uma expressão urgente, de alguém que queria falar alguma coisa e estava aproveitando a distração festiva dos Frequentadores. Acabei me desesperando também e apertando mais forte sua mão, com um único pensamento em mente: ah, como eu senti falta dele...

Talvez fosse cômico se não absurdamente trágico. Nós não podíamos falar um com o outro, sequer, mas nos comunicávamos somente com olhares. E tais olhares diziam muito, pois as cores preta e verde de suas íris chamavam-me. Quase sucumbi ao impulso de dizer "eu te amo" bem no meio de todos.

- Muito bem, muito bem. - Carlos exclamou, sinalizando para que as palmas cessassem.

Puxei minha mão de volta assim que todos os Frequentadores sentaram-se em seus lugares, reiniciando a conversa animada. Minha mente ainda estava um turbilhão multicolorido, nas mesmas cores dos olhos do artista.

Eu achava que não teria sentimentos tão fortes caso voltasse a vê-lo (algo que deveria ser impossível). Havia enganado a mim mesma.

Deus, eu preciso evitá-lo, ou acabarei nos matando! Pensei.



Oi gente!!! Estou atrasada de novo, eu sei, hehehe... peço desculpas. :p

Eu espero, de coração, que estejam gostando dos capítulos. Muita emoção vem por aí, garanto. ;)


Bjsss!!!









Porcelana - A Promessa Escondida (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora