Cap. 37: Cuidado, Bonecos (Parte I: Armações)

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O segredo que eu acabara de compartilhar com uma bambola fugitiva ainda pesava em minha garganta quando cheguei ao quarto. A segunda coisa que mais pesava em mim era meu coração acelerado.

E a terceira, meu cérebro prestes a explodir.

- Alessa! - Lindsey exclamou baixo, abrindo a porta com cuidado - Você demorou!

Balancei a cabeça em afirmativa, sem paciência ou vontade de responder melhor. Tudo em que eu conseguia pensar era no fato de que o tempo no cronômetro continuava diminuindo.

- Tréville... está a postos? - perguntei, massageando minhas têmporas.

- Aham. - murmurou simplesmente, observando meu caminhar cambaleante - Você... acha que já está fazendo efeito?

Por cima da dor, sorri, sarcástica.

- Certamente... - grunhi, perdendo o equilíbrio.

Não demoraram dois segundos para que eu estivesse no chão, em mais do que uma atuação. Lindsey, sem saber o que fazer, apenas seguiu com o plano e começou a gritar.

Logo antes de minha visão escurecer, pensei que a hora havia chegado.

×××

Meus olhos se abriram em um local mais sombrio que minha própria mente tumultuada. O chão duro e acarpetado sugeria que ainda estávamos na casa, no entanto.

Virei a cabeça para cima e me deparei com... duas Lindseys. Pisquei repetidamente, mas continuei enxergando em dobro.

- Lin... - murmurei, chamando sua atenção.

Seu rosto estava aflito e avermelhado, como se estivesse com pressa. O escritório de Luigi, local no qual estávamos, permanecia com a porta aberta. Pude avistar alguns vultos no corredor.

- Eles não chegaram. Estão atrasados. - sussurrou, referindo-se a Ônix e à própria chefe.

Embora sua boca estivesse próxima do meu ouvido, sua voz soava distante, como se vinda de uma caverna.

- Então... erramos? - perguntei, sem ter muito controle sobre minha língua.

Ela franziu as sobrancelhas e se levantou, repentina.

- Não enquanto eu estiver aqui... - ouvi, simplesmente, antes que se afastasse correndo.

Fiquei deitada no chão, sem conseguir entender o que estava acontecendo ou raciocinar o que fazer. Eu só sabia que precisava do que estava naquela porta lateral e discreta, à esquerda de minha cabeça, e que deveria ter alguém pegando as provas. Mas não havia ninguém, nem sequer uma sombra.

Esperei por mais alguns minutos, até que os vultos no corredor começaram a circular com cada vez menos frequência. O relógio batendo em minha mente obrigou-me a levantar, mesmo que tremulamente.

O plano era o seguinte: Ônix e Tréville haviam administrado uma dose do comprimido da Sociedade em minha refeição, para que eu tivesse um pequeno ataque e este possibilitasse nossa entrada do escritório do Fondatore. Como Luigi e Carlos estavam viajando, e Thereza e Morgana estavam distraídas, aquela mostrara-se como noite perfeita para nossa operação. A única coisa que faltava era Ônix estar ali, com a desculpa de saber cuidar de bambolas em overdose, para entrar rapidamente na biblioteca e pegar o que queríamos. Mas ele estava demorando demais, eu sentia.

Dando um passo cambaleante de cada vez, alcancei a porta e empurrei-a facilmente, pois sua madeira não era pesada e suas dobradiças estavam bem cuidadas. Quase consegui imaginar o próprio Luigi realizando aqueles movimentos, andando de um cômodo ao outro enquanto perseguia suas tarefas de carcereiro. Ignorei a cena e entrei mais no local escuro, iluminado parcamente pela luz que vinha ainda do corredor da mansão e por raios de luar de uma pequena janelinha.

Na biblioteca com todos os registros da Sociedade, que não passava de uma sala retangular, as paredes estavam lotadas de prateleiras do chão ao teto. Todas estas, com exceção de umas poucas vazias, estavam ocupadas por livros de capa vermelha e inscrições douradas, perfeitamente alinhados e organizados. Estavam em ordem alfabética, e seus títulos na verdade eram nomes. Nomes de supervisoras, percebi.

Uma mesa de mogno escura e pesada se assomava na metade do cômodo, com alguns volumes abertos em seu tampo. Respirando fundo para manter o controle e não desmaiar em um cenário tão suspeito, aproximei-me da mesa e deslizei os dedos pelas páginas sépia. Procurei nas palavras uma pista do que fossem os livros, mas pareciam somente registros de contabilidade. Como gastos e lucros, sem especificidades (obviamente não estaria escrito "vendas humanas").

Então, no canto da mesa, avistei um livro menor e menos chamativo que os outros. Ele estava fechado, sua capa era verde e estava bem gasta, sinal de que era bastante utilizado. Suas características atiçaram minha curiosidade, impelindo-me a investigá-lo melhor. Assim que o abri, avistei um mapa mundi rabiscado e com pontos coloridos aqui e ali. Todos os pontinhos estavam sobre a Europa.

Um sorriso triunfante tomou meu rosto enquanto encarei o mapa das sedes. Era aquilo que viéramos buscar, era aquilo que nos salvaria.

Agarrei o livro e busquei o bolso interno na saia de meu vestido, feito por Lindsey para caso de necessidade. Ocultei o mapa no tecido, torcendo para que, quando fosse atendida pelos "médicos", este não fosse encontrado. E rezando para que os Fundadores não dessem falta tão cedo da importante peça, também.

Virei-me de volta para as estantes, pensando no que fazer, e considerei voltar para o escritório. O que eu havia encontrado era mais que suficiente, e provavelmente Tréville enviaria mais pessoas para procurar coisas na biblioteca.

Mas então, antes que pudesse sair ou fugir, avistei algo que me paralisou no lugar. Rolando os olhos pelos nomes nas paredes, encontrei um que fez minha mente rodar ainda mais. "Dalila Thaedor", dizia. "Supervisora Datha", mais abaixo.

No total, eram três os cadernos com o nome. Eles eram grossos e aparentemente muito manuseados, pelo jeito como suas capas haviam sido deixadas. Aproximei-me destes em um flash e pousei minha mão sobre as lombadas. Não hesitei ao pegar o primeiro e abrí-lo em meu colo.

Nas folhas sem linhas, páginas e páginas continham nomes e destinos. Embora certas partes fossem destinadas a termos administrativos, era fácil diferenciá-las da grande maioria do caderno: detalhes sobre punições e execuções de pessoas, realizadas na sede em que Datha vivia.

Minha mãe deve estar aqui, pensei de imediato. Sua morte deve estar descrita nessa caligrafia caprichada, logo no início de seus anos de supervisora. Meu coração, se é que era possível, bateu ainda mais rápido.

Ergui os olhos e encarei as paredes abarrotadas de livros. Todos aqueles continham nomes, todos aqueles continham vítimas. Todos aqueles haviam sido escritos com sangue em vez de tinta.

A atmosfera, de repente, tornou-se pesada demais para que eu pudesse suportar. Me virei e voltei em disparada para o escritório, enfiando o caderno de Datha no mesmo bolso em que o mapa das sedes.

Quando fechei a porta da biblioteca, como que um despertador programado, meus joelhos fraquejaram e eu voltei ao chão.

Onde está Lindsey? Onde está Ônix? Refleti, antes de afundar novamente na escuridão. Desta vez, porém, o breu estava cheio de nomes em letras douradas.



Oi gente!!! Tan nan nan!!! Finalmente pudemos descobrir o plano da Alessa!!!

O que vocês acham que vai acontecer, hein? Acham que isto pode terminar em morte? Uiui, tsc tsc. :p

Espero que estejam gostando e se enrolando cada vez mais nesta trama.

Bjsss!!!

P.S.: Obrigada, l76m19f, pela ótima indicação de música na multimídia. ;)

Porcelana - A Promessa Escondida (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora