Cap. 41: Irresponsabilidade

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Uma pequena observação: se quiserem ler o capítulo ouvindo a música na multimídia, creio que se apaixonarão ainda mais por ela. ;)

Boa leitura!!!



Desde que eu voltara para meu quarto naquela noite, a sensação estranha e formigante de que algo aconteceria dominara meu peito. O guarda na porta, mudo, apenas me deu passagem e continuou a postos. Lindsey não estava ali, também.

Claramente, ao me deparar sozinha no extenso cômodo, fiz a coisa mais responsável e cabível no momento de silêncio e tensão: larguei tudo e fui tomar um banho quente.

Despi o vestido desconfortável que usava, enrolei-me num roupão macio e tão claro quanto minha pele e encaminhei-me para o banheiro. As lajotas escorregadias quase me fizeram tropeçar em dias anteriores, por isso, decidi ficar descalça mesmo. O frio nos dedos de meus pés parecia um choque de realidade, impedindo-me de viajar encarando meu reflexo no espelho.

Fui até a banheira e liguei a água, testando-a até que alcançasse a quentura ideal. Tinha de haver algum lugar com energia na casa, senão, não teríamos água quente com tanta facilidade. Aquilo despertava minha curiosidade, no sentido de que podiam e deveriam haver muito mais segredos e peculiaridades na sede.

O vapor dominou o cômodo aos poucos, enquanto eu pegava as velas no quarto e as levava para o banheiro. Depois de tanto tempo com aquela luz fraca, meus olhos tinham se acostumado com a tal.

Para esparar a banheira encher até a metade, voltei para a frente do espelho, fazendo algo que se tornara hábito: avaliando o estado de meu corpo. Minhas costelas saltavam à vista, enquanto as clavículas pareciam afiadas de tão expostas. Minha barriga se tornara uma estrada repleta dos morros dos ossos em evidência, e minha pele um fino e branco papel, quase como um lençol sobre um móvel de madeira.

Era fato que me era oferecida mais comida agora. Mas eu não sentia que deveria mudar, passar a me fartar nas refeições: cada vez que comia ali, parecia que estava me envenenando. Me envenenando e ofendendo os bambolottos e bambolas que recebiam um tratamento ainda pior.

Eu nunca tivera uma forma física perfeita, é claro. Os problemas de auto estima da adolescência acompanham todos os humanos, principalmente as garotas. Mas, naquele momento, enquanto via como parecia um esqueleto de pé, eu sentia falta da carne que julgara feia ou fora de lugar. Entendia a beleza de ser diferente de um molde cadavérico.

Deslizei o roupão para baixo, avaliando meu peito quase reto, e senti o calor contido pelo tecido se espalhar. Arrepiei com a sensação, ainda mais pelo barulho que veio em seguida: a porta do armário batendo.

De imediato, pensei que fosse Lucca, deixando seu típico esconderijo. Abri a boca para impedí-lo, para dizer que esperasse no quarto, encarando o espelho para ver atrás de minhas costas. Porém, o reflexo que vi não foi o de cabelos que pareciam chamas vermelhas. Mas sim, o de cabelos que pareciam ondas de espuma do mar.

- Ônix... - perguntei, franzindo as sobrancelhas - o que você...

- Eu trouxe uma página importante de um dos cadernos que você tirou da biblioteca. Tréville e Lindsey, em concordância comigo... - ele falara tudo como se estivesse sendo perseguido, a respiração ofegante e o rosto vermelho de uma corrida. Então, quando de fato me encarou, foi como se tivesse perdido o resto do fôlego - decidimos...

Sua expressão passou de atordoada à escarlate: suas bochechas, já vermelhas, adquiriram o tom da vergonha. Assim que percebi a fonte de tudo isso, fechei o roupão e apertei-o contra meu corpo, sendo dominada pelo mesmo sentimento.

Porcelana - A Promessa Escondida (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora