Cap. 19: Por Debaixo Da Mesa

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☆Por: Ônix☆

Ela estava a poucos centímetros de mim, seu perfume inundava minhas narinas, sua visão inebriava meu cérebro. Tocar sua mão era algo simples e inocente, porém fazia meu peito já inundado transbordar de desejo. Droga, pensei, como eu fui me apaixonar tão perdidamente neste inferno, hein?

Então, antes que conseguisse me aproximar dois milímetros, os Fundadores foram anunciados, dissipando o nevoeiro que se apossava de minha consciência.

Ver Carlos Mangini e Luigi Mangini no mesmo cômodo simplesmente me deixava enjoado. Tal fator agravado à atual distância entre Alessa e eu, contribuía para um mau-humor súbito.

Quando Thereza se aproximou, saltitando como sempre, sequer tive tempo de encarar a musa uma última vez. Porém, apesar de tudo, pude ver que seus belos olhos (encobertos por lentes de contato horríveis), haviam reagido a minhas palavras com igual intensidade. Meu coração batia acelerado toda vez em que a via, mas o mundo me impedia de tocá-la.

- Amor! - a ruiva exclamou, quase me esmagando em um abraço mal retribuído - Parece fazer 1.000 anos que eu não o vejo!

Poderia fazer 2.000 anos, então, pensei, esperando ansiosamente pelo momento em que me soltaria e se afastaria um pouco.

Thereza estava empolgada com alguma coisa, isto era fato, pois não parava de olhar em volta. Eu, no entanto, queria apenas virar uma gota de tinta e me esparramar no chão, para nunca mais ter de ficar entre os malditos Frequentadores. Agora, mais do que nunca, suas íris avaliativas fixavam-se em mim, talvez pelo fato de ser o bambolotto de estimação de uma Fundadora.

- Você gostou do novo estúdio? - Thereza comentou, fazendo-me voltar a prestar atenção em suas palavras vazias.

- Ah, sim. - respondi, simplesmente, lembrando do cômodo deserto no andar superior da casa com o qual me presenteara.

Nada nele era semelhante a um estúdio. Suas paredes estavam descascadas e o chão puído, sendo que eu havia entrado no lugar somente uma vez e já reparado em seu estado. A sede da Sociedade onde cresci podia até ser cruel, mas pelo menos tinha uma sala na qual eu me sentia confortável para pintar... e tinha a presença da minha irmã.

Eu sentia tanta falta dela, que um peso colossal havia se posicionado sobre meus ombros. A cada dia que passava e que eu não sabia como Rubi estava, tal peso triplicava.

- Que bom! Creio que amanhã terá muito tempo para enfeitá-lo, pois todos aqui estarão ocupados. - ela murmurou, cumprimentando alguém com a cabeça.

Encarei-a brevemente, esquecendo os devaneios que me atormentavam.

- Ocupados? Como assim? - perguntei, tentando a sorte.

- Ah, é que haverá uma reunião importante. Os funcionários serão solicitados para a mesma, pois praticamente todos os hóspedes que aguardávamos já chegaram. - respondeu, distraída.

Aquela era uma informação bastante útil, refleti. Daria um jeito de repassá-la a Tréville. E ainda... uma ideia surgiu em minha mente, como um estalo. Rapidamente, pesquei no bolso da calça o bloquinho e a caneta que usava para fazer esboços, apertei-os entre os dedos e esperei o anúncio do banquete.

Eu tinha um convite a fazer. Tal convite, que podia ser minha única chance de ver a musa.

×××

☆Por: Alessa☆

A mesa havia sido posta há pouco, pois os pratos diversos de comida ainda fumegavam no ar fresco da primavera. Apesar de a casa ser bem fechada, o vento externo não deixava de entrar por suas frestas, tornando o ambiente levemente mais ameno. Portanto, eu não estava tremendo de frio.

Dois fatores comprometiam meu atual estado: a fome, agravada pela presença de alimento de verdade, e a proximidade de Ônix, que estava ao meu lado. Sua sombra fazia meu coração bater freneticamente, principalmente porque Luigi estava logo ali, na cabeceira da mesa. Seu olhar de ferro às vezes recaía sobre nós, e eu temia que descobrisse tudo naquele instante.

Duas novas bambolas haviam chegado à casa naquele dia, aparentemente. Elas não levantavam a cabeça de seus pratos, não abriam a boca ou sequer falavam. Mal pude analisar seus rostos de traços árabes e cabelos densos, pois não tivera chance de me aproximar. Tudo o que sabia delas é que pertenciam ao mesmo Frequentador (um político estadunidense) e que eram irmãs. Suas vidas deviam ser terríveis como a minha, senão piores.

- Sejam bem-vindos ao berço da Sociedade, amigos! - exclamou Luigi, levantando-se e brindando. Percebi que ele encarou o pai brevemente (sentado na outra cabeceira), com um sorriso convencido - Cada vez mais nos aproximamos da Hora do Progresso de Porcelana! É uma honra tê-los aqui, prestigiando tal momento.

Morgana Mangini, sentada à esquerda do demônio ruivo, não desgrudava os olhos dele. Um sorriso gigante e permanente, semelhante ao de Thereza, que estava ao seu lado, fixava-se em seu rosto. As duas primas faziam contraste com o resto da família, composto por um Carlos com uma careta enfurecida, uma Avril de olhos tristes e um Lucca inexpressivo. Os olhos do último, no entanto, às vezes dirigiam-se ao meu rosto, discretamente, e retornavam ao prato.

Virei-me para minha própria comida. Como os Frequentadores estavam se servindo da mesma, sem problemas aparentes, peguei-a também. Daquela vez, não haviam pratos montados repletos de remédio. Agarrei o garfo e preparei-me para engolir o delicioso pedaço de cordeiro, mas um cutucão me fez parar na metade do caminho.

Tive de conter o impulso inicial de encarar Ônix, que puxava a barra de meu vestido insistentemente por baixo da mesa. Deslizei minha mão até encontrar seus dedos, tentando entender o que estava acontecendo, mas fui surpreendida por um pequeno papel depositado em minha palma. Após entregar-me o que quer que fosse, ele apertou delicadamente meu pulso, sinalizando que era secreto. Como resposta, acariciei sua mão com o polegar.

O banquete correu repleto de conversas estridentes e sigilosas, que provavelmente não poderiam sair dali. Eu só pensava no papel ainda escondido em minha mão, com uma curiosidade cada vez maior. Tentara encarar Ônix, em busca de pistas, mas ele não dera chance de me olhar nos olhos.

Por fim, enquanto voltava para meu quarto acompanhada pelo funcionário de sempre, surpreendentemente agraciada com a não presença de Luigi (ele e os demais Frequentadores ficariam até mais tarde na "festa"), desdobrei o bilhetinho e o li à meia-luz:

"Amanhã nossos receptivos anfitriões estarão bem ocupados. Venha até meu novo estúdio, musa. Fica no andar superior.

Ah, e não esqueça de avisar Lindsey sobre isso. É algo interessante, não acha?"

Engoli em seco, esmagando o papel entre os dedos assim que chegamos ao dormitório.



Oi gente!!! O que será que acontecerá durante a reunião da Sociedade, hein? Caso tenham reparado, Carlos anda muito bravo ultimamente. Por quê? Têm teorias?

Bjsss, espero que tenham gostado!!!

Porcelana - A Promessa Escondida (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora