Cap. 11: Bilhetes

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Seria muito egoísmo eu querer Ônix fora dos perigos da investigação?

Eu estava deitada em minha cama, matutando sobre os dilemas da vida atual. Sabia que o artista jamais estaria seguro dentro da Sociedade, não importavam as circunstâncias, mas... eu não conseguia imaginar o que seria de mim se o machucassem seriamente (ou pior). Ele era a última coisa boa e pura do mundo, dentro de uma mansão tão corrupta e cheia de pessoas perturbadas. Eu estava tão confusa com meus sentimentos... queria tanto evitar que ele se envolvesse naquilo... ou que se envolvesse comigo...

Sem o que fazer naquele quarto/prisão miserável, abri o outro livro que antes estivera na estante. Como imaginava, neste não havia uma palavra, pois Avril não tivera tempo de escrever mais.

Inspirada pela melancolia e pelo tédio, levantei da cama e procurei por uma caneta na mesinha de cabeceira, resolvendo preenchê-lo eu mesma:

"Aqui, neste caderno,
Gostaria de expor
Meus sentimentos,
Incluindo todo o ódio e o amor.

Porém, se o fizer
Me punir irão,
Com um veneno na comida,
Ou uma apunhalada no coração.

Se virem estas palavras
E vierem me xingar
Não negarei sua autoria
Pois está na hora de enfrentar,
Arrecadar provas e derrubar,
Esta Sociedade demoníaca."

Observei a folha rabiscada, passando os dedos sobre o relevo que as letras criavam no papel. Eu sempre nutrira uma paixão incorrigível por livros e poesia, o que se evidenciava em meu bom desempenho em literatura. Tanto o cheiro familiar das páginas, quanto a sensação da caneta em minha mão, se movendo e criando vida, quase me faziam sorrir. Acabei me empolgando e escrevendo mais:

"Seria egoísmo
Querer preservar
Um amor tão puro
Que faz esta escuridão abrandar?

Já nem sei mais
Se somos os mesmos.
Afinal, enfrentamos decepções,
Torturas e diversos medos.

Se ele me ama,
Irá entender
Que o sentimento é recíproco,
Sem eu dizer?"

Melancolia em folhas, realmente. Assim que terminei de escrever e extravasar tudo o que estava sentindo, arranquei as páginas e rasguei-as em vários pedaços, jogando-as no lixo e impedindo que alguém as visse. Afinal de contas, eram a confissão de que eu amava uma pessoa, e mesmo que não tivesse especificado quem, queria evitar me arriscar.

Sabe-se lá o que Luigi poderia fazer se visse algo do tipo.

Levantei-me da cama e andei até a porta, espiando pela fechadura como em um clássico filme de suspense. Havia, é claro, um funcionário ali, bancando o guarda da noiva do Fondatore Maestro. Suspirei, cansada de ficar presa ali, e resolvi me fazer de desentendida, abrindo a porta que às vezes estava destrancada.

- Olá. - falei, chamando a atenção do funcionário que estava de costas - Será que eu poderia caminhar pela casa? Estou com dor nas pernas e gostaria de esticá-las.

Ele me encarou com inexpressividade.

- Só um pouquinho. - insisti.

Por fim, o funcionário alto revirou os olhos, ajeitando o terno preto e a postura.

- Tudo bem. Creio que o Senhor Mangini tenha feito o que precisava, e agora você já possa sair. - murmurou, observando o longo corredor - Mas não tente fazer nenhuma gracinha, entendeu? Se não te arrastarei de volta para cá.

Sorri, satisfeita com a vitória, e assenti. Disse ao homem que queria ir somente até a sala de estar do andar inferior, no qual estávamos. Porém, na verdade, o que desejava mesmo era dar uma olhada nos corredores da mansão e tentar encontrar alguma porta suspeita.

Nós caminhamos lentamente, por entre os vários espelhos pendurados nas paredes e por algumas portas conhecidas: a do salão, a da sala de jantar e a do jardim de inverno. Tais cômodos fizeram-me pensar em, se todas as partes principais da casa estavam no térreo, como os quartos e os locais de "convivência", o que poderia haver no segundo piso? Realmente, era algo a se considerar na busca pela biblioteca.

Então, nós entramos na sala de estar, e o funcionário postou-se na porta, mantendo os olhos fixos em mim. Fui me sentar no sofá comprido e macio, parando ao notar que alguém já o ocupava. Quando avistei Ônix deitado ali, distraído com um lápis e um caderno, recuei alguns passos.

Ele, no entanto, avistou-me e sentou-se.

- Alessa? - perguntou, de sobrancelhas franzidas.

Com uma expressão de incômodo, indiquei o funcionário na porta, que estava atento aos nossos atos. Ônix, compreendendo, também sinalizou a outra saída da sala, que dava para a cozinha. Entendi que havia mais guardas ali.

Engolindo em seco, sentei-me na poltrona do outro lado, que era decorada com um tecido azul florido. Sem ter muito o que fazer, apenas continuei observando o artista, que hesitante e lentamente deitou-se e voltou a desenhar. Tréville o informara de tudo, então, obviamente, ele estava ciente de que não podíamos levantar suspeitas.

Alguns minutos se passaram, até que eu pensasse em perguntar:

- O que está desenhando?

Ele levantou a cabeça, os cabelos brancos caindo na testa.

- Uma flor. - e mostrou-me o cravo que desenhava, com traços que o tornavam muito real.

Assenti, querendo desviar do clima estranho que estarmos sendo observados causava.

- Bonito. - comentei, fazendo-o piscar e voltar os olhos para seu trabalho.

Na posição em que estava, Ônix permanecia de costas para mim, e toda vez que falava tinha que se virar para me encarar. Parecíamos, realmente, duas crianças conversando, o que fez um sorriso debochado nascer no rosto do funcionário.

De repente, enquanto estava distraída imaginando várias ofensas ao guarda, senti algo leve tocar meu braço. Era uma bolinha de papel amassada, que viera da direção do artista.

Com cautela, abri o pequeno papel, lendo o que estava escrito dentro:

"Tenho algo para você."

Dizia, na caligrafia espiralada e elegante de Ônix. Encarei-o pelo canto do olho, percebendo que sinalizava o próprio caderno.

- Posso ver seu desenho mais de perto? - perguntei.

O guarda na porta franziu as sobrancelhas de leve, logo voltando a expressão habitual. Eu precisava ser mais cuidadosa ainda.

- Tudo bem. - o artista disse, levantando-se e esticando-se para que eu pegasse o objeto.

Alcancei-o e voltei a sentar, atenta ao desenho. Então, quando o guarda se distraiu por um minuto, vasculhei as folhas sem fazer barulho e encontrei um envelope escondido ali. Rapidamente, enfiei-o por baixo da saia do vestido que usava, evitando que alguém o visse. Devolvi o caderno do artista, refletindo se o funcionário havia visto nosso trabalho sigiloso. Provavelmente não, pensei.

Senti outra bolinha de papel bater em meu braço, e escondi-a na palma da mão. Então, cobrindo-a com o braço, abri:

"Espero que goste, musa. Foi um trabalho de vários dias."



Oi gente!!! E aí? Gostaram? Espero que sim. ^-^

O belo poema na multimídia deste Cap foi feito por AdriellyFiremark. Eu adorei, flor!!!! :D

Bjsss, meus bambolottos e minhas bambolas!!!

Porcelana - A Promessa Escondida (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora