Cap. 29: A Chefe

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Dois dias passam muito depressa, principalmente se você não quer que eles passem. Eu tinha o forte pressentimento de que Luigi não me daria mais que três dias de folga, não importando o fato de eu ter tido uma overdose. A Sociedade não parava nunca, e aquela mísera trégua era quase uma benção.

Ao final de meu último dia, quando o sol estava se pondo (o ambiente estava iluminado com a aura laranja do final da tarde), bateram à porta de meu quarto. Com um suspiro, acompanhada por Lindsey, assustei-me ao imaginar o demônio ruivo do outro lado da madeira. Porém, para meu alívio parcial e entusiasmo de Lin, quem estava ali era Tréville.

Para os Fundadores, seria muito suspeito o fato de ela estar ali, então, quase não a deixei entrar. No entanto, quando já ia fechar a porta, ela entrou no cômodo e bateu-a atrás de si.

- Lindsey é minha funcionária, na visão dos Mangini. Tenho o direito de lhe fazer inspeções periódicas, graças ao favor que estou fazendo ao emprestá-la para a Sociedade. - a mulher falou, cruzando os braços e caminhando até o centro do quarto, o barulho de seus saltos abafado pelo carpete - Mesmo assim, creio que seja bom não demorar. Luigi está bastante agitado desde seu "acidente", Alessa. Tenho praticamente certeza de que não aguentará esperar muito mais.

Revirei os olhos e apoiei as costas no pé da cama, os músculos fracos e cansados.

- Eu já imaginava que isso aconteceria. - respondi, a voz baixa.

Tréville, logo após pedir um relato sobre meu estado de saúde para Lindsey, encarou-me dos pés à cabeça. Senti-me idiota, afinal, eu parecia um punhado de gravetos unidos dentro da roupa: nunca estivera tão magra em toda a minha vida.

- Você tem se alimentado? - perguntou, franzindo as sobrancelhas maquiadas.

Ri de leve, preferindo aquilo a chorar pela própria desgraça.

- Sim. Mas a última refeição que fiz sem a presença de Lindsey... bom, digamos que tenha resultado em nosso encontro atual. - fiz um floreio com as mãos, sem conseguir ser tão gentil quanto desejava.

A verdade era que a amargura estava me sufocando há muito tempo, e eu já não via motivos para ter uma educação exemplar. Ninguém ali a merecia, de todo jeito.

- Isso foi perigoso, de fato. Estamos tentando descobrir porque aconteceu. - ela explicou, com um tom de arrependimento na voz.

Assenti com a cabeça, engolindo a sensação de estômago embrulhado. Por falar naquele tema, há muito eu não comia com vontade: minhas entranhas sempre pareciam um nó, e a comida era um peso.

- Quanto às informações que eu consegui... - comecei, mudando de assunto - Qual é o prazo para que vocês possam agir?

Tréville parou para pensar, um quê de aflição destacado em sua expressão. Assim que respondeu, porém, a determinação ferrenha tomou o lugar da dúvida.

- Não temos uma data exata, mas sabemos que terá de ser antes da Hora do Progresso. Esperamos conseguir fazer tudo antes deste mês acabar, mas o problema não é esse. A questão é como invadir o escritório de Luigi, o qual está altamente vigiado 24h por dia e no qual só entra o próprio Fondatore... ou quem está à beira da morte.

Pisquei, cansada, e levei a mão ao pescoço. A bomba relógio que era o tempo estava se aproximando da explosão. Eu tinha medo, mas já estava cheia daquilo também. A agonia e a ansiedade eram coisas terríveis.

- Bianca ficou preocupada com você... - Tréville mencionou, atraindo outra vez minha atenção.

Meus olhos quase saltaram do rosto quando ouvi o nome de minha tão querida amiga. Ela estava sabendo de tudo, então? Estava informada sobre minha situação? Acima de tudo, ela estava bem?

- Como a Bia está?! - disparei, o coração começando a bater mais rápido.

- Ela está bem, está muito segura. - Lindsey respondeu, aproximando-se da chefe e tentando me reconfortar.

- Eu não falo do lugar onde ela está. Eu estou perguntando sobre como a mente dela está se virando. - respondi, rapidamente.

Madame Tréville, dando um passo à frente, pôs a mão em meu ombro, na pose mais confiante do dia:

- Ela está maravilhosa. É muito forte, como você bem sabe, e está reagindo melhor do que todos esperávamos. - ela sorriu de leve - Acredite no que eu digo.

Sem ter o que dizer, sentei-me no colchão, encarando o chão e depois levantando a cabeça. Aquela informação sim me trouxe paz, e uma alegria que eu não esperava.

Bianca estava enfrentando os obstáculos e vencendo, trazendo um raio de luz para todos nós: se ela conseguia, talvez também conseguíssemos.

- Que bom. - murmurei, um pequeno sorriso sincero estampado no rosto - Mas... e Ônix?

A felicidade de Tréville sumiu, levando a minha junto consigo.

- Ele está em uma situação desconfortável, Alessa...

Pus-me de pé.

- Como assim?

- Você sabe que ele está triste. Mas ele continua tentando... - Lindsey disse, impedindo-me de avançar.

Seus olhares sérios mantiveram-me no lugar, mas a vontade de gritar era grande. Minha vida era uma balança desregulada, onde as coisas ruins sempre se sobrepunham às boas. Era preciso muita coragem para continuar relevando tudo, ignorando a soma das desgraças.

- A paixão é um sentimento conflituoso e doloroso, eu sei. Ela é pior ainda quando acontece na Sociedade Porcelana. - Tréville falou, de repente - Me apaixonei por uma bambola, certa vez. Doeu.

- Uma bambola?! - exclamei, confusa e preocupada.

- Descobrimos a Sociedade por uma denúncia, sim, mas também porque a garota pela qual eu era apaixonada sumiu... - sua voz falhou, e os sentimentos que escondia vieram à tona.

Ela não derramou uma lágrima sequer, no entanto. Lindsey pigarreou de leve, perguntando silenciosamente se estava bem.

Com um aceno da mão, ela indicou para que a agente continuasse, concluísse o breve relato.

- A chefe percebeu que ela era uma bambola logo depois, e então iniciamos as investigações. Foi prova suficiente de que o homem falava a verdade... - Lin disse, abaixando a cabeça.

Pensei que nada mais seria dito naquele encontro, mas a Madame se pronunciou outra vez:

- Além de... bem, uma cruel coincidência. - uma pausa - Por isso, eu te entendo, Alessa. Perfeitamente. A paixão é um sentimento pelo qual se morreria...

Encarei-a por um tempo, assimilando o que dissera. Era bastante coisa, pelo menos para o pouco tempo em que estivera ali.

Acabei respondendo algo que ninguém esperava, mas que viera à minha mente desde o primeiro momento:

- Tem uma diferença. Não é paixão, é amor. Uma paixão não resistiria aqui. - sem conhecer sua história completamente, apenas cerrei os punhos. De repente, uma ideia surgiu na ponta de minha língua - Mas... eu de fato morreria por isso...



Oi gente!!!

E então, o que estão achando? Espero que estejam gostando, kkkk. :)

Graças à reação positiva de vocês quanto ao capítulo interativo, resolvi que o farei. Deixem ali nos comentários suas perguntas e o nome do personagem ao qual são destinadas (ou o nome da autora, caso sejam para mim, kkk). Em breve vocês terão suas respostas, pois estou bem animada para isso! ^-^

Bjsss, até logo!!!

Porcelana - A Promessa Escondida (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora