Zeck se levantou de súbito, afastando-se alguns passos enquanto a árvore se contorcia girando lentamente ao redor de si mesma. O ar se encheu com o barulho de folhas, galhos e revolver de terra. Para Zeck, a árvore parecia lutar para escapar daquele lugar, tentando desprender-se de suas raízes e ir para bem longe, mas é claro que nada deste tipo aconteceu. No lugar disso, o garoto ouviu um barulho de terra cedendo e, a partir de seus pés, o chão começou a afundar formando degraus que sumiam atrás da passagem redonda de um túnel, que se abriu como uma boca, bem debaixo da árvore. Do túnel saíam feixes de luz verde esmeralda como braços cumpridos ávidos por agarrar algo. Mas não houve pressão no peito desta vez. Nem Cinzento. A única coisa que houve foi um Zeck atônito no topo de uma escadaria recém surgida do nada, que sem fala escutava o som cada vez mais distante dos degraus que se formavam em algum lugar nas entranhas da terra. Menos de um minuto depois, o som do último degrau foi ouvido já bem longe. Não fosse pela cabeça de Zeck que gritava, o silêncio seria absoluto.
- UAU! – foi tudo o que Zeck pode dizer, ainda indeciso quanto ao passo seguinte.
Biblion. Esta era a palavra chave, com certeza. Uma senha. Ele sabia disso agora. Como ele sabia? Bem, estava escrito naquela língua estranha, não estava? Como ele podia lê-la era outro mistério em sua coleção. Biblion... a afamada sociedade mencionada por Sima no alto da montanha. Se ela tinha algo a ver com aquilo, Zeck tinha uma vaga idéia de onde aquele túnel o levaria. Um lugar explicitamente proibido. Mas, a julgar pela luz verde que já mais fraca piscava lá no fundo, ele tinha certeza que aquele era o caminho certo, o único. Respirando fundo, e desejando profundamente estar errado quanto a tudo aquilo, Zeck desceu os primeiros degraus e foi engolido pela escuridão.
A passagem se abria à largura de meio braço estendido para cada lado. Zeck apalpava ambas as paredes frias e úmidas, cuidando para não cair. Descendo um pouco mais, ele pode notar que os degraus eram largos e duros mas com espaçamento uniforme, o que facilitava na hora de calcular as passadas. O som de cada passo era amplificado três ou quatro vezes e ecoava dando-se a impressão de que o garoto tinha companhia. A escuridão era quase sólida. Não haviam olhos que pudessem se acostumar à ela.
Mais embaixo, a luz que acendia e apagava em intervalos monótonos era a única coisa impedindo que Zeck percorresse todo o caminho de descida rolando. Ele desceu, desceu e desceu mais um pouco. A pressão em seus ouvidos anunciava que já devia estar há muitos metros debaixo da terra quando acabaram-se os degraus. Olhando à frente Zeck viu uma linha de luz verde que piscava bem rente ao chão, forte o suficiente para pintar a silhueta de uma porta retangular. Cada clarão vinha acompanhado de um zunido baixo. Zeck olhou para trás, de onde viera. As trevas às suas costas lhe estimulavam a seguir em frente.
A porta era uma única placa de madeira maciça, marrom ou preta — era difícil de dizer — e parecia ser muito pesada. Chegando mais perto dela, Zeck não viu uma maçaneta, vinco, buraco de fechadura, ou qualquer coisa que lhe indicasse uma forma de abri-la. Não havia nada ali. Se não fosse pela abertura pela qual a luz vazava em intervalos contínuos e pelas duas estruturas metálicas das dobradiças em forma de folha na lateral direita, Zeck chegaria a crer que aquele era o fim da linha. Mas não. Vendo a luz iluminando seus pés ora sim, ora não, ele estava mais do que decidido a continuar. O que, ou quem quer que fosse que estava esperando por ele, estava logo ali atrás daquela porta.
Zeck tocou a estrutura maciça e sentiu a textura áspera de madeira sob seus dedos. Ao seu toque, a porta vibrou de leve e lentamente abriu, girando para dentro com um rangido preguiçoso e rouco. Logo atrás dela, a princípio, só era possível ver duas coisas: a luz verde que brilhou forte mais uma vez antes de lentamente se extinguir e a escuridão sufocante mais além. No entanto, quando Zeck abaixou-se para apanhar a esfera prateada no chão — sem um pingo de surpresa pelo fato dela ser a fonte da luz — ele pode notar que aquela nova seção do túnel não era tão escura quanto a anterior. E isso graças à luz amarela minguada de uma chama dançando dentro de uma lanterna de vidro que pendia da parede da esquerda um pouco adiante. Colocando a esfera no bolso da túnica, Zeck caminhou até a lanterna e sorriu satisfeito quando esta desprendeu-se do gancho na parede, afinal uma pequena luz era melhor do que luz nenhuma. No mesmo instante um BAM violento fez Zeck virar-se. A porta fechou-se com vontade e Zeck nem precisava examiná-la para saber que por ali ele não poderia voltar. Mas aquele não era momento para pensar na volta. Era para a frente que ele precisava ir. Encarando o nada a sua frente, ele caminhou para as entranhas do túnel, para o desconhecido.
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BIBLION
FantasyQuando se tem 15 anos em Allakelion, nada pode dar errado. Quando se é adolescente em Vernom, o melhor sempre está por vir... ...a não ser que você seja Haizeck e comemore o momento mais importante de sua vida na noite em que as sete luas se alinh...