37. Fogo

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Zeck saiu de casa e percorreu todo o caminho até o anfiteatro sentindo sua cabeça rodando. Estava com os nervos à flor da pele, como dizemos por aqui, mas não sabia disso. É uma situação difícil de explicar, quando você começa a ter sensações estranhas que ninguém mais tem e que não deviam sequer existir. Tinha o coração em frangalhos por ter sido indelicado com a pessoa que ele mais amava no mundo. E a forma como Daiv olhou para ele... como se não o reconhecesse. Não. Aquilo tinha que acabar. Foi com esta intenção que Zeck, de última hora desviou-se do rumo, em direção à biblioteca.

Ao entrar já sabia exatamente para onde se dirigir. Em pouco tempo já estava na seção de astronomia, jogando-se pesadamente em uma cadeira ao lado de Fleim, que quase incendiou o livro que estava lendo com o susto - outro legado pós- Biblion.

Como você sabia que eu estava aqui? - perguntou recompondo-se.

Você comentou mais cedo que tinha que começar o trabalho do Astor... - Zeck disse sério - ... mas isso não vem ao caso. Nós precisamos conversar. E você sabe muito bem sobre o quê.

Puxa, já era hora!

Zeck o olhou com estranheza.

Fleim fez um sinal com o dedo para que ele esperasse e então tirou do bolso um pequeno cristal lapidado, com várias faces, do tamanho de um chaveiro, que ele encostou na boca murmurando. O cristal emitiu uma luz esverdeada em resposta. Em seguida, ele fez sinal para que Zeck o seguisse. Atravessaram rapidamente a recepção entrando no corredor que dava para o jardim interno e por uma portinha à direita que Zeck jamais teria reparado. Era um tipo de depósito cheio de prateleiras vazias, utensílios de jardinagem e decoração. Subiram por uma escada muito alta no fundo. Lá no topo, Fleim sumiu por uma abertura por onde só dava para passar engatinhando. Zeck hesitou um pouco antes de mergulhar atrás dele para total escuridão. O outro garoto logo acendeu duas lamparinas de vidro revelando um emaranhado de vigas bem grossas e douradas que sustentavam um teto baixo e diagonal. Zeck olhou ao redor impressionado.

Nós estamos no...

Telhado da biblioteca. Bem, dentro dele para ser mais preciso. - Fleim respondeu. Caminhava pelo emaranhado de vigas com desenvoltura. Pararam em um local mais aberto há uma boa distância da entrada e ele colocou as lamparinas em cima da viga vertical mais próxima. Uma em cada ponta.

Demais! Mas por que aqui? - quis saber Zeck.

Nós precisávamos de um lugar para falarmos de Biblion sem corrermos o risco de sermos ouvidos então eu movi alguns pauzinhos. - Fleim sentou-se logo abaixo das lamparinas e convidou Zeck a fazer o mesmo.

Você pensa em tudo, hein? - Zeck comentou, sentando-se de frente para ele.

Então, sobre o que você quer falar?

Zeck de repente lembrou-se do porquê de estarem ali e preparou-se para falar. Nem sabia por onde começar, mas estava feliz por finalmente poder falar com alguém sobre aquilo.

Você se lembra do que aconteceu no dia em que entramos na Sociedade?

Aconteceram tantas coisas. - Fleim riu.

Sim, sim. -Zeck sacudiu a cabeça. - Eu estou falando do que aconteceu quando eu e você estávamos no quartinho.

Ah, aquilo. - Infelizmente, Fleim se lembrava muito bem. Zeck engoliu seco.

Aconteceu de novo. - sua voz era de dar dó. E quando Fleim não falou nada, ele continuou.- Foi hoje, com Daiv. Ele está sempre no meu pé insistindo para que a gente continue uma investigação que começamos há um tempo atrás. E hoje ele foi um pouco mais longe e eu... - só lembrar da cena fazia Zeck se sentir péssimo. - eu não posso seguir com isso, cara. Eu... eu vou contar para o Daiv. Ele é meu melhor amigo e merece saber por quê eu estou agindo tão estranho ultimamente. Por quê eu falei com ele naquele tom agora há pouco... - gesticulava muito com as mãos.

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