29. Véu

12 2 1
                                    

Quando Zeck abriu os olhos de novo, não sabia onde estava e nem o que estava fazendo ali. Era difícil até dizer se estava de pé ou deitado. Seu corpo estava muito leve e parecia estar flutuando e girando lentamente em um espaço preto e esfumaçado. Era tudo tão imaterial que ele acabou concluindo que aquilo tudo era um sonho. Um sonho nada agradável pois, logo acima dele, ele viu o cinzento, observando-o estático, cantarolando baixinho uma melodia desconhecida.

Algo dentro de Zeck revoltou-se ao ouvir o canto e ele quis agarrar o cinzento com todas as suas forças. Ele não conseguiria escapar dessa vez. Não até explicar o porquê de tudo aquilo. Zeck queria saber como ele havia ido parar dentro da Sociedade Biblion e ele tinha certeza que o Cinzento tinha a resposta.

O rapaz tentou erguer os braços e agarrá-lo pelo manto mas nada aconteceu. Tentou mexer-se mas não podia. Seus músculos não lhe obedeciam e muito menos sua voz, pois a exclamação de surpresa que ele soltou ao perceber sua paralisia nunca saiu de sua boca.

O Cinzento não parou de cantarolar nem por um instante e aquilo deixava Zeck ainda mais contrariado. Era como se por trás de seu capuz, ele estivesse se divertindo com a situação do rapaz.

Por quê?

Ele pensou e torceu para que de alguma forma o Cinzento pudesse ao menos ler sua expressão de desolamento.

Por que você está fazendo isso comigo?!

O Cinzento continuava ali, cantando, sem se mover. Zeck tentou se mexer de novo, tentou abrir a boca, mover os olhos, qualquer coisa!

Alguém faça algo!!

Choramingou dentro de sua cabeça.

Ter o Cinzento ali ignorando-o era ainda pior do que tudo o que tinha acontecido por causa dele. Teria sido táo bom se ele nunca mais tivesse visto o Cinzento. Teria sido melhor ainda se ele não o tivesse visto em primeiro lugar.

E então tinha aquela música que despertava dentro dele algo diferente. Lento. Poderoso. Algo que o tornava diferente de qualquer outro garoto de quinze anos que ele conhecia, sem no entanto o fazer sentir especial Não era como saber que ele era excepcional em música ou poesia, por exemplo. Era mais como se fosse uma... ele nem conhecia palavras para descrever aquilo!

- Talvez Biblion possa ajudá-lo.

Se Zeck pudessse se mexer ele teria dado um pulo quando o Cinzento parou de cantar e falou. Era a primeira vez que Zeck ouvia sua voz fora de sua cabeça. Definitivamente não era a voz de seu pai, ou de qualquer um que ele conhecia... ou era? Mas afinal, do que ele estava falando?! Como Biblion poderia ajudá-lo? Ele nem devia estar ali para começo de conversa!!

- Ninguém vem para Biblion por acaso - o Cinzento falou de novo e, espere um pouco, Zeck conhecia aquela voz sim!

Da próxima vez ela veio da direção oposta de onde eles estavam e não de sua boca. Chamava seu nome e se aproximava mais e mais. A cada nova chamada a escuridão e a fumaça se dissipavam até a voz estar bem acima dele.

O Cinzento, então voltou a cantarolar e quando Zeck ouviu a voz sem corpo lhe chamar pela última vez, abriu os olhos e viu o rosto gigante de Etiel a centímetros do dele.

Ao ver que Zeck acordara, Etiel jogou-se pesadamente no banco e encostou a cabeça na parede, dando um suspiro, enquanto Zeck, que estava deitado de qualquer jeito, sentava-se com dificuldade. Demorou um pouco para perceber que estavam no que parecia ser uma carruagem coberta, com uma única porta e sem janelas. Uma espécie de caixa de paredes escuras, apenas grande o suficiente para caber duas pessoas, iluminada por duas lanternas de vidro penduradas à esquerda e à direita. Zeck olhou para Etiel que o olhava de volta com um semblante carregado.

BIBLIONOnde histórias criam vida. Descubra agora