Capítulo Sete - Uma decisão

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Heloyse

— Eu vou embora por um tempo.
Margot continuou como se não tivesse ouvido. Ashley, que estava sentada à mesa comigo, parecia uma estátua me olhando.
— O quê?
— Você não é surda, Ashley. Eu disse que vou embora. E não sei por que você está fazendo essa cara. Eu disse que era por um tempo.
— E fala isso naturalmente? Está louca? Você não conhece ninguém mais por aí. Para onde você iria?
— Bom, eu não sei. Só sei que vou.
— Você não tem nem ideia para onde vai?
— Não! Eu acho que vou jogar uma mochila nas costas, tirar par ou ímpar para ver qual ônibus devo subir. Uma moeda resolveria minha dúvida.
— Não seja idiota. Desde quando a "Heloyse engraçadinha" voltou?
— Desculpa! Olha, eu estou mal. Se eu ficar aqui, eu nunca vou sair dessa. Vou enlouquecer. Lá fora tem um mundo inteiro e eu me sinto pequena nele. Eu tenho que descobrir o que tem além de Boston, além de Michael. Então, por favor, tente me entender.
Ashley segurou minhas mãos e em seguida esboçou um pequeno sorriso, deixando claro que me compreendia.
Margot, que já tinha acabado de lavar a louça e estava limpando o fogão, ainda não tinha falado nada... Até aquele momento.
— Você faz bem! — disse virando-se e chamando nossa atenção.
— Outra louca! — resmungou Ashley.
Margot colocou a esponja sobre a pia e puxou uma cadeira, sentando-se ao meu lado.
— A Lisy precisa conhecer outras pessoas, respirar outro ar. Uma hora ou outra, eles vão se encontrar e é visível que ela ainda o ama. Afinal, foram nove anos. Era como um casamento. Imagina vê-lo desfilar por aí, com a nova família dele? — disse voltando sua atenção a mim. — Você pode até não ver, mas, querida, se continuar assim, isso que sente irá se tornar uma depressão, se já não for. E me corta o coração ver você assim. É claro que não quero que você saia por aí, sem rumo, contudo, ficar trancada aqui também não vai resolver. Precisa distrair sua cabeça. Quem sabe você conhece alguém e...
— Não! — eu a interrompi. — Não quero conhecer outra pessoa. Não quero mais me apegar a ninguém, porque um dia, ele vai embora. Mas, concordo com tudo o que você disse. Eu quero distrair minha cabeça. Quero preencher minha mente com outras coisas que não estejam ligadas a ele.
— Tudo bem! — Ashley se levantou novamente e cruzou os braços. — Mas, como Margot disse, você também não pode sair por aí, sem rumo. Então se quiser, eu tenho uns parentes...
— Não, Ashley! Não quero ir para casa de ninguém. Eu quero realmente colocar uma mochila nas costas e sair por aí. Quero ficar um pouco sozinha comigo mesma. Pensar em tudo o que houve e aceitar. Aqui está sendo difícil porque toda vez que penso nele, a única coisa que sei fazer, é me esconder atrás de alguma coisa e ficar vigiando, torcendo para ele aparecer. Eu não quero isso. Longe dele, não terá como eu sair pela madrugada, para apenas observar sua casa. E isso está me deixando louca. Eu estou sufocada e se eu continuar aqui, eu vou me afundar nisso. Eu estou perdida. Quase não tenho vontade de viver. Isso é ridículo. Deus! Eu nem sou a única no mundo a passar por isso, mas, não consigo evitar essa tristeza.
Elas ficaram quietas por um momento. Depois, Ashley sorriu e colocou sua mão sobre a minha.
— Então vá! Se isso vai te fazer bem, então quero que vá. Mas, se você surtar, eu estou aqui. Me liga que vou te buscar onde estiver.
— Eu sei!
E então nos abraçamos.
O dia terminou agradável. As duas me ajudaram com as malas. Na verdade, era uma mochila de costas e uma mala média de mão.
Levaria algum dinheiro, alguns cartões. Ficaria em qualquer lugar, até a falta do que deixei, bater e eu voltar. Ou até ter me acostumado ao fato de não ter mais Michael comigo.
Pela primeira vez, senti a esperança. Eu sentia que podia superar toda aquela tristeza.
Sete horas da manhã, eu estava no terminal. Não quis que me acompanhassem. Eu queria estar sozinha a partir dali. Preferi ir de ônibus. Eu não estava com cabeça para dirigir.
Aquele comentário que fiz sobre tirar par ou ímpar ou usar uma moeda para decidir meu destino, era quase verdade. Eu não sabia para onde ir.
Fechei os olhos e respirei fundo.
Comecei a me perguntar se eu havia tomado uma decisão certa. E se fugir não fosse a solução? Mas eu não estava fugindo, eu estava apenas tentando me afastar e esfriar a cabeça.
Eu poderia ir de avião, mas, eu não queria chegar rápido em meu destino, seja ele qual fosse.
Eu estava com medo.
Eu estava viva.
Eu estava com medo.
Eu estava triste.
Eu estava bem.
Morrendo de medo.
Eu tinha uma incrível capacidade de variar de humor e sentimentos. Tudo em mim estava embaralhado e confuso.
Comprei uma porção de batatas fritas e um copo de refrigerante. O Relógio marcava quase oito horas da manhã. Terminei de comer e fiquei lá, sentada.
Para onde eu iria? Meu plano parecia fácil, até eu perceber que eu não tinha um plano.
De repente, senti a necessidade de sair dali. Eu não tinha noção do que estava fazendo. Eu tinha que ir embora. Tinha que deixar a vida decidir, porque eu estava sem ideia.
Fui em direção à estrada e segui andando, sem rumo.

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