Capítulo Trinta e Um - Uma mulher traída

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Heloyse




O som barulhento de uma moto me acordou.


Eu não pude deixar de sentir o cheiro azedo de vômito que havia respingado sobre minhas roupas. Na verdade, o cheiro ruim fazia parte de cada lugar no meu corpo.


Eu me sentei e a dor que esmagava meus ossos, minha cabeça, minha carne, se intensificou mais ainda. A garganta seca e um peso com mais de mil toneladas pairavam sobre mim.


Eu levantei minha cabeça e vi meus olhos pelo espelho. Olhos inchados e vermelhos. O cabelo todo desgrenhado e o rosto com a marca do estofado do banco.


"Linda de morrer."


Eu passei para o banco do motorista com dificuldade, devido às dores e esgotamento que a resseca causava. No meu celular, marcavam dez e vinte sete da manhã. A claridade do sol incomodava um pouco minhas vistas. Abri o porta-luvas e tirei meus óculos escuros.


A rua já estava movimentava e eu precisava sair dali.


Precisava de um bom comprimido, um café da manhã, se é que eu conseguiria comer algo e um belo de um banho. Sabonete e perfume! Bastante sabonete e perfume. O cheiro azedo estava insuportável.


Esperei por um tempo até me habituar com a sensação, coloquei a chave na ignição e dei partida.


Eu tinha muito para pensar. Muito que fazer.


Segui pela rua e há alguns metros à frente, Patsy saiu correndo de dentro de um hotel. Os sapatos de salto nas mãos e a bolsa pendurada nos ombros. De repente, uma mulher veio por trás e puxou seu cabelo com tamanha violência, até que ela caísse no chão.


Eu freei bruscamente a caminhonete. As pessoas começavam a olhar, mas, ninguém a ajudava.


A mulher lhe dava tapas, socos e Patsy tentava se defender, em vão.


Por que as pessoas não a ajudavam?


Eu desci da caminhonete e fiz o maior esforço para me manter de pé, devido ao mal estar.


- Você gosta de sair com homens casados, sua vadia? Vamos ver se eles vão te querer depois que eu amassar sua cara - a mulher distribuía socos no rosto dela. - Christian não vai fazer nada, sabe por quê? Porque você não passou de uma aventura. Ele só queria saber se você era como os amigos deles diziam. Sabe o que diziam? Que você era fácil de mais. Vagabunda!


Ela jogou Patsy no chão, sentou-se em seu estômago, os joelhos imobilizando seus braços e se preparou para dar mais um soco, quando eu segurei sua mão.


- Já chega!


Patsy tinha os lábios sangrando, a maquiagem borrada como se antes, houvesse chorado muito.


- Me solta, ou você é a próxima.


- Que seja! Me bater irá fazer seu marido ser fiel a você? Vai apagar a traição que você sofreu? Se for, então bata.


Ela me encarou de forma furiosa e em seguida, depois de dar mais um soco no rosto de Patsy, levantou-se. Patsy virou o rosto para o lado, transformado pela dor.


A mulher olhou para mim com lágrimas nos olhos.


- Não há nada que apague a dor de uma traição. Por culpa dela e daquele filho da puta - ela apontou para o chão, onde Patsy se encontrava -, eu estou sofrendo. Estou grávida dele e vamos nos divorciar, porque não sou capaz de confiar em alguém que traiu minha confiança. Não posso... - disse com a voz trêmula.


- Eu entendo - eu disse balançando a cabeça. - Eu sei como é ser traída. Sinto por você. Mas, essa criança não tem culpa de nada. Você agora, precisa se preocupar com a sua gravidez. Se estressando dessa forma, colocará sua gravidez em risco. Sei que você não quer isso.


Ela olhou com desprezo para Patsy e enxugou as lágrimas.


- Não consigo deixar de sentir raiva.


- Não tem como não sentir. Você tem todo o direito, no entanto, há coisas mais importantes do que extravasar a raiva que sente.


Ela assentiu lentamente e soltou uma longa respiração.


- Tem razão. Obrigada.


Olhou as pessoas à sua volta e respirou fundo. Começou a caminhar e depois, virou em uma rua à esquerda.


Olhei para a figura que estava no chão, totalmente destruída. Estava imóvel, olhando para o céu, enquanto as lágrimas desciam. Depois, apoiou as mãos no chão e com dificuldade, tentou se levantar. Coloquei as mãos em seu braço para ajudá-la, mas, ela puxou rapidamente.


- Não!


- Me deixa ajudar.


Ela sorriu de forma cínica. Os lábios manchados de sangue, levemente inchados. Mesmo sorrindo, um filete de lágrima desceu novamente dos seus olhos.


- Não! Não me humilhe. Eu não aceito piedade de ninguém.


- Não é piedade. Qualquer um faria isso.


- Tem certeza? Vê essas pessoas? - ela apontou para algumas que ainda nos observavam. - Sabe por que não me ajudaram? Porque eu sou a vagabunda de Clearwater. A White mimada. A que sempre debocha dos outros, a que fica com o marido dessas gordas e mal amadas... Porque eu faço com o mundo inteiro, o que já fizeram comigo. Eu piso em todos e não me importo... Eu não...


Ela soluçou e colou ambas as mãos no rosto e chorou.


Coloquei a mão em seu ombro, depois, segurei seu braço e a levantei.


- Me deixa! - ela disse se afastando.


- Eu te levo em casa.


- Ela não quebrou meus dedos e os meus pés. Ainda posso dirigir.


Cuspiu a saliva misturada com sangue e me fitou por um instante.


- Heloyse... Maldita hora que você veio para Clearwater.


Pegou seus sapatos e sua bolsa do chão, fez sua caminhada da vergonha até seu carro, deu partida e se foi.


As pessoas voltaram a seus afazeres e eu voltei para a caminhonete, terrivelmente triste.


A esposa do Christian sentiu na pele o que era se decepcionar. Christian não era seu inimigo, por isso ela se decepcionou. A decepção nunca vem dos nossos inimigos.

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