Capítulo Vinte e Cinco - Não era amor

2.3K 211 42
                                    

Heloyse




Havia um calendário em minha consciência, marcando meu sofrimento diário.


"Até quando?"


E mesmo tendo visto o seu lado ruim, eu não conseguia evitar pensar nele. E eu sabia que Will não era alguém para querer por perto. Ele era do tipo que sabia como arruinar uma mulher.


Desejá-lo, era como um suicídio. Uma queda longa e lenta. Eu não deveria continuar permitindo que meus pensamentos fossem tomados por ele.


Eu sentia que estava desmoronando. Pensar nele me quebrava. O que estava acontecendo comigo?


- Por que ele é assim, Cielo?


- Will foi modificado pelas situações do passado. Ele tem uma vida assombrada e me dói o coração, só de pensar. Na época, minha falecida mãezinha morava no Green Park, o mesmo bairro onde morava Will e o Calvin.


- E o que aconteceu por lá?


Cielo abaixou o olhar e respirou fundo, depois me olhou por um tempo até poder responder.


- Eu não posso dizer, querida. As pessoas por aqui, não sabem o que houve. Mas, lá onde tudo aconteceu, ninguém toca no assunto, mesmo depois de anos. Os mais velhos lembram muito bem. A questão, é que Will, em todos esses anos nunca falou nada sobre sua vida com ninguém. Não me sinto no direito de falar.


- É tão sério assim?


- É triste. Triste como Will.


Ela serviu mais um pouco de café em minha xícara, mas, a minha cabeça estava a mil por hora.


- Ele tem um grande vazio no peito. E um coração assim, não se pode habitar. Ele já está ocupado por um grande e imenso vazio.


Eu concordei e olhei para minha xícara.



***



Já era quase meia-noite quando deliguei a televisão. Não porque eu estava com sono, mas porque nada que passasse na TV iria me interessar.


Eu abri a geladeira e bebi um pouco de água. Quando eu terminei, depositei o copo sobre a mesinha e levantei-me para apagar a luz. Eu me deitei na cama e fiquei olhando o teto escuro.


Estava terrivelmente entediada.


"O que ele estaria fazendo agora?"


Mas por que eu queria saber? Ele era um coração indomável. Um homem que sabia usar as palavras para machucar. Como eu poderia me ocupar pensando em alguém que até agora, só mostrou seu lado escuro?


Bufei com a frustração e me virei na cama tentando achar uma posição confortável. E nenhuma posição estava boa o suficiente para mim.


Depois de horas, eu adormeci, pensando nele.


Depois daquele dia em que o vi, não nos falamos mais. E permanecemos assim, por quatro meses.


O tempo foi passando mais rápido do que eu pudesse imaginar. Eu não sabia se voltava para Boston. Não sabia se ficava aqui por um ano. Não sabia se devia conhecer outro lugar. Eu não sabia o que fazer.


Depois que esses meses passaram, eu o vi. Houve dias em que o vi no pasto, em seu cavalo. Outras vezes, nossas caminhonetes se cruzaram e ele nem sequer olhou para mim.


Não houve mais desentendimentos, palavras duras... Nem beijos.


Uma vez, vi uma mulher sair da sua fazenda. E isso me incomodou profundamente. Outras vezes, quando ele vinha ajudar Thom em alguma coisa, eu simplesmente dava meia volta e retornava para casa.


Confesso que fiquei meio decepcionada. Eu achava que ele viria me ver, falar comigo e se desculpar. Mas ele não fez.


"Melhor assim", eu achava.


"Sem relacionamentos", eu disse para mim mesma. Embora, não houvesse nenhum.


Esses meses que eu estava aqui, eu não tinha feito quase nada. Eu ajudava Cielo com a comida, o trabalho da fazenda, mas, nada que me deixasse cansada.


Quando íamos à cidade, eu comprava algumas coisas que faltavam em casa, o que não era muito, já que Thom e Cielo, quase não me deixavam comprar nada.


A cada dia que passava eu os sentia mais próximos a mim, como meus pais.


Megan apareceu com Jeremy. Nesse dia, ficamos até tarde jogando dama e comendo.


Um dia desses, fui com Johnson ao cinema. Comemos pipocas e conversamos sobre negócios. Falei sobre minha cafeteria e ele, sobre como tocava seu restaurante. No final, quando cada um estava seguindo seu caminho, Johnson segurou minha mão e se despediu me dando um beijo próximo aos meus lábios. Eu não disse que gostei, mas também, não tive nada contra.


Durante esse tempo, ele veio se mostrando um bom rapaz. Sua beleza não era tão surreal como a de Will, mas, ele também era um belo pedaço.


Eu o observei entrar no carro e ir embora. Quando atravessei a rua e abri a porta da minha caminhonete, eu o vi.


Will estava parado à porta de uma loja de ferramentas, olhando pra mim. Eu continuei parada enquanto ele me olhava. Em seguida, uma mulher loira, a mesma que vi saindo da sua fazenda, saiu da loja e envolveu seu braço no dele. Ela não me viu.


Will caminhou e depois se virou para me olhar. Segundos depois, seguiu para dentro da caminhonete com ela.


Nesse dia, eu chorei.


O que eu estava sentindo era uma dor que sufocava meu peito. Eu me recusava a pensar que poderia estar apaixonada por ele, embora, fosse estranho saber que durante esse tempo que nos afastamos, não tinha um dia sequer, que não me pegasse pensando nele.


Eu queria correr e entrar naquela fazenda, à procura dele. Eu queria me jogar naqueles braços e saborear seus lábios. Apagar a última cena que tivemos naquela fazenda. Queria refazer Will. Tirar a essência daquele homem vazio, sua mente perigosa e colocar algo bom dentro dele. E quando esse tipo de pensamento vinha, eu imaginava que era um tipo de atração muito forte que eu sentia por ele, menos, amor. Eu me recusava pensar que era amor.


Will jamais iria querer algo comigo. Aquela mulher era perfeita mesmo com toda aquela vulgaridade. Eu nem chegava aos pés dela.


E eu era uma tremenda imbecil. Como eu pude acreditar que ele viria atrás de mim e se desculparia?


Depois daquela noite, eu estava decida a não pensar mais nele. Se Michael que esteve comigo por tantos anos, eu consegui parar de pensar, então seria fácil não pensar em Will, que era apenas uma atração.


Dessa vez, eu não iria fugir. Iria enfrentar meus sentimentos. Eu queria muito acreditar nisso.



***



- Cielo, estive pensando em algo e gostaria de saber a sua opinião.


- Claro, querida. Sente-se e me conte.


- Eu acho que irei morar aqui em Clearwater... Por um tempo.


Cielo levantou-se rapidamente da cadeira, o que me assustou. Ela arregalou os olhos e colocou a mão no peito. Depois, deu um grande sorriso.


- Meu Deus! Não brinque comigo.


Era a dramatização em pessoa.


- Não é brincadeira. Eu sinto falta de ter uma família e tenho encontrado isso em vocês. Se eu for embora agora, vai doer tanto. Me apeguei demais.


- Não me faz chorar, Lisy! Estou tão feliz. Me conte seus planos.


- Então senta aí e vamos conversar.


- Não, senhorita. Primeiro vou assar uma torta de pêssego para comemorar.


Eu ri e fui ajudá-la.


UM PONTO DE PARTIDAOnde histórias criam vida. Descubra agora