Capítulo Sessenta e Dois - Uma incrível mudança

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Heloyse

Na manhã seguinte, Will estava radiante. O jeans claro, contornando os músculos das pernas e a camisa azul escura com os primeiros botões abertos, o deixavam atraente.
Estávamos sentados em um restaurante no Quincy Market  enquanto me olhava comendo o meu lobster bisque .
— O quê?  — eu perguntei sorrindo.
— Isso não é algo que eu comeria.
— Então está perdendo algo muito bom.
— Um creme estranho em algo estranho.
— Por que não experimenta?
— Não me obrigue a isso, raio de sol. Já basta o que está a minha frente — torceu os lábios olhando o seu lobster roll .
— Por favor, tente!
— Não sei onde eu estava com a cabeça quando deixei você escolher.
Eu dei risada e esperei que ele comesse um pedaço. Ele mordeu, mastigou um pouco, me olhando sério e engoliu.
— E então?
— Posso conviver com isso. Embora eu prefira não ver isto na minha frente... Por alguns anos.
— Não minta, Will. Eu sei que você gostou.
— Não mesmo! — ele disse e depois, mordeu com vontade.
— Você é uma grande criança.
Ele riu.
E nos vemos durante toda a semana.
Fomos ao Freedom Trail , ao New England Aquarium , à Biblioteca e Museu Presidencial John F. Kennedy , mas, de todos os lugares que fomos, o melhor foi na praça do bairro onde eu morava.
Ficamos sentados por um longo tempo, apreciando nossos sorvetes, em um banco, agindo como um simples casal de namorados. Simplicidade era algo que o definia. Will era extremamente rico, mas, tudo o que ele fazia, era simples e isso deixava tudo a nossa volta, familiar.
Não tivemos momentos íntimos nesse período. Sabíamos que o sexo não era algo importante entre nós.  Quando isso passa a ser prioridade em um relacionamento, no dia em que o sexo faltar, não haverá mais nada que sustente a relação.
Nos beijávamos, tínhamos nossas mãos entrelaçadas, mas, eu sabia que Will queria me dar isso. Ele queira ser atencioso, romântico e mais do que tudo, um amigo.

***

Na sexta feria, Will passaria em casa.
Acordei e fiquei na cama, enrolando. O tempo estava um pouco frio e o meu edredom estava deliciosamente, acolhedor.
Eu ouvi a campainha tocar e achei que talvez ele tivesse vindo um pouco mais cedo. Coloquei meu suéter por cima do pijama e sorri, andando apressada para abrir a porta.
Confesso que fiquei um pouco decepcionada.
Michael estava parado em frente a minha porta. Julie estava atrás, dormindo na cadeirinha. Meu coração sempre se alegrava quando a via. Eu ainda tinha aquele sentimento de tristeza, toda vez que eu lembrava que um dia, eu quase fui mãe.
O vento frio tocou a minha pele e cruzando os braços, apertei meu suéter. Ele não desceu do carro, continuou sentado com as mãos no volante.
— Não está muito cedo?
— Bom dia para você também — disse sorrindo.
— O que quer?
— Só quero me desculpar por ontem. Apenas isso. Eu parei e pensei no que você falou. Realmente, ele não teve culpa pelo que aconteceu. Quero que seja feliz, seja com quem for e prometo não me meter na sua vida.
— Eu agradeço — eu sorri. — Você veio apenas para isso?
— Sim e não! Você poderia ficar com a Julie, só por um tempinho? A Alice está no trabalho, o Erick ainda está na casa do Finn e me ligaram da corretora. Alguns clientes querem ver uma casa e preciso substituir com urgência, o Mayer. Ele precisou ir ao médico, não estava bem. Como fui pego de surpresa, não tenho tempo para arrumar uma babá. Eu poderia levá-la, mas, creio que não seria legal. Também não quero dar trabalho...
— Não é trabalho algum. Vou adorar.
— Obrigado! Você é realmente a melhor pessoa que conheci. Apesar de tudo, sempre está disposta a perdoar, a ajudar... Eu, no seu lugar, não conseguiria ser assim.
— Eu só estou cansada de chorar, de sofrer... Quando libero perdão, sinto como se um fardo saísse das minhas costas. Não estou dizendo que vou aceitar tudo o que fazem comigo. Apenas que há coisas que podemos passar uma borracha se for necessário para ter paz na alma. Eu fiz isso e não me arrependo.
Ele concordou com a cabeça, dando um simpático sorriso, saiu do carro e me entregou Julie, junto com uma bolsa.
Horas depois, Julie estava deitada no meu tapete macio, com uma pequena almofada atrás da cabeça, enquanto olhava curiosa para o desenho infantil que passava na TV.
Eu não tinha conseguido dormir durante a noite. Era tanta coisa para pensar, que minha mente não desligava em nenhum momento. Estava ansiosa para vê-lo novamente. Mas e depois? O que aconteceria?
Dei um gole no meu café e olhei para meu celular. Não havia nenhuma ligação ou mensagem dele.
O desenho acabou e coloquei em um canal onde passavam reprises de programas antigos. Eu dei risada quando Kermit dançou.
A campainha tocou, eu levantei em um sobressalto e fui abrir a porta com um sorriso. Meu sorriso aumentou quando o vi parado.
— Oi.
— Oi. Entra.
Will passou por mim e esperou que eu fechasse a porta.
— Pensei que você não viria.
— Eu disse que viria.
— Claro... Quer se sentar?
— Não antes de beijá-la.
Eu estava levando um tempo para me acostumar com tudo aquilo. Eu estava amando, embora eu não conseguisse evitar o quanto tudo parecia não ser real. Eu tinha medo que tudo aquilo acabasse.
Ele sentou, olhou para Julie como se fosse algo de outro planeta e se demorou, observando-a.
— Vou pegar um café para você. Já volto.
Ele permaneceu calado, ainda olhando para ela.
Na cozinha, tirei meu celular que vibrava no bolso. Vi uma mensagem da Ashley dizendo que Johnson a levaria para conhecer Clearwater. Respondi a mensagem e guardei o celular.
O nome da cidade e a falta que aquele lugar me fazia, bateu com força. Não tinha um dia, que eu não pensasse naquele lugar.
Fui até a cafeteira, coloquei café em uma xícara e um som chamou minha atenção. Andei lentamente, pensando ter imaginado coisas e algo me surpreendeu.
Julie ria enquanto Will falava algo para ela. As mãozinhas gordinhas seguravam os dois lados do rosto dele. Sua mão foi até seu cabelo e puxou. Will imitou um som de dor, fazendo com que ela aumentasse a risada. Ele se levantou com ela no colo e a ergueu, fazendo-a de avião. O corpinho dela estava estendido sobre suas mãos enquanto gritava de alegria. Voltou à posição anterior e a segurou no colo, olhando-a por alguns segundos.
Ah, Will seria um pai maravilhoso e eu queria estar presente quando isso acontecesse. Gostaria de ser a mulher que lhe daria uma família.
Depois, como se algo despertasse sua atenção, ele olhou para a TV, que ainda passava Sesame Street. Ficou parado com Julie no colo. Sentou-se e ficou lá, paralisado, enquanto acaricia os cabelinhos dela. Quando o sapo Kermit começou a cantar, Will com o olhar vidrado na TV, cantou junto e depois, direcionando o olhar para Julie, cantou para ela.
Ele se virou e quando me viu, me deu um sorriso e... Oh, meu Deus... Ele estava tímido.
— Ela me obriga a fazer essas coisas. Não consigo dizer "não".
Eu soltei uma risada, indo à cozinha pegar a xícara de café e depois, o servi.
— Você seria um ótimo pai.
Ele deu um gole no café e depois, olhou para Julie que agora estava deitada na cadeirinha, bocejando.
— Eu acreditava que não. Depois que eu fiz a terapia, pensei que se um dia eu fosse pai, talvez eu não fosse o melhor, mas faria de tudo para mostrar ao meu filho, o quanto o amo. Hoje eu sei, jamais serei como meu pai ou o pai dele. Eu posso ser o que eu quiser e o que eu quero, é não ser como eles.
— Eu fico feliz. Oh, Will... Fico tão feliz por saber que você reagiu — enxuguei uma lágrima que descia solitária.
Will colocou a xícara na mesa de centro, me puxou para o seu colo e eu me aninhei ali. Não havia lugar no mundo que fosse tão bom, quanto os seus braços.
— No dia em que cheguei e nós fizemos amor, eu não perguntei se você estava tomando suas pílulas.
— Eu queria falar sobre isso. Eu estou, então não se preocupe. Juro que é verdade.
— Você não entendeu; eu não perguntei porque não me importo.
— Quer dizer que...
— Sim. É isso, raio de sol.
As lágrimas aumentaram e toquei em seu rosto.
— Você está tão diferente. Por que demorou, Will? Foram dois anos enfrentando um inferno.
— Fiquei com medo de ser tarde demais. Além do mais, eu não poderia ter vindo antes. Eu precisava mudar a mim mesmo. Eu queria me apresentar a você como um novo homem, que está disposto a ter uma nova vida. E mesmo que você não me quisesse mais, eu precisava vir, mesmo sendo doloroso para nós dois. Precisava do seu perdão. A forma que terminei com você, deixou um buraco entre nós. Mesmo que um de nós não quisesse mais o outro, o perdão seria necessário. O tempo cura muitas feridas. Aprendi isso. Mas, guardar mágoa ou ter aquela sensação de remorso pelo que fez ou por nunca ter se desculpado, pesa muito. Você estava magoada, eu tinha aquela culpa nas costas... Eu precisava vir. Ainda preciso do seu perdão.
— Você o tem, Will.  E você não sabe o quanto fiquei feliz em vê-lo. Só que, ao mesmo tempo, fiquei com medo de você ir embora novamente e ainda estou com medo. Não quero voltar para Clearwater e não ter você e não quero ficar aqui tendo você tão longe. Sei eu não posso te obrigar a nada. Não posso obriga-lo a ficar comigo, sendo meu namorado ou qualquer outra coisa.
Ele colocou uma mecha do meu cabelo atrás da orelha, depois, deu um beijou em meus lábios, de forma lenta, suave...
— Lisy... — falou meu nome de forma baixa — Eu quero amar você hoje e sempre. E eu nunca imaginei que um dia eu poderia ser feliz. É você que faz isso acontecer comigo. Eu encontrei ao seu lado, mil razões para querer estar com você. Uma delas, é que você é a única que me faz querer ser melhor. E você é única que me faz querer ter uma família. Você quebrou algo dentro de mim. Fez o que ninguém conseguiu. Quando pensei que você poderia ter voltado com o Michael, eu senti como se algo que fosse necessário na minha vida, tivesse ido embora. Sou apaixonado por você, pela sua delicadeza, sua sensibilidade... Amo tudo em você, desde o seu jeito, até cada curva do seu corpo. Eu amo seu tom de voz quando me chama de cowboy, o som da sua risada e até seus gemidos quando está nos meus braços. Você é a razão que me faz querer acordar todos os dias e viver. Então Lisy, fica comigo até o fim das nossas vidas. Por favor! Diz que você quer se casar comigo.
A primeira vez que fizemos amor, lembro-me de pensar que o mundo não valeria se não fosse para amá-lo. E quer saber? Eu ainda pensava da mesma forma.
A voz havia me abandonado e então, eu só pude me lançar em seu pescoço e chorar mais ainda. Eu sempre tive um coração derretido. Ele se levantou e continuamos ali, abraçados, enquanto eu lavava a minha alma em seus braços.
— Espero que isso seja um "sim".
Eu ri e o beijei.
— Você terá que me aguentar a vida inteira senhor O'Connor.
— A vida inteira é muito pouco. Eu gostaria de ficar com você, agora e em toda eternidade. Se um dia eu estive ferido, não estou mais. Você é minha cura, Heloyse. Estou vivo, graças a você.
— Eu amo você, cowboy!
Então ele riu e me beijou.

Quincy Market: Centro comercial com lojas, restaurantes, três edifícios históricos de mercado e uma rua de pedestres, localizado em 4 S Market St, Boston, MA 02109, EUA.

Lobster bisquet: Ensopado de lagosta, servido em um pão ou diretamente em uma tigela. Tem a textura de um creme e é feito com batatas, cebolas e creme de leite.

Lobster roll: É sanduíche de pasta de lagosta com maionese (geladas) num pão de cachorro quente.

Freedom Trail: É um caminho de 2,5 milhas de comprimento através do centro de Boston, Massachusetts, que passa por 16 locais significativos para a história dos Estados Unidos.

New England Aquarium: Aquário localizado em Boston, Massachusetts. Além do edifício principal do aquário, as atrações do New England. Aquarium incluem o Simons IMAX Theatre e o New England Aquarium Whale Watch, que funciona de abril a novembro.
 
Biblioteca e Museu Presidencial John F. Kennedy: É a biblioteca presidencial e museu de John Fitzgerald Kennedy, o trigésimo quinto Presidente dos Estados Unidos.

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