25. Tempo de Cicatrizar

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12 de abril de 2018

André

- Deixa-me beijar-te uma última vez. – peço, com a voz a quebrar a cada palavra – É o último, o derradeiro, o beijo da despedida. Por favor. Preciso de sentir os teus lábios uma última vez para ter a certeza de que nunca me vou esquecer deles. E de como é bom estar nos teus braços. Por favor. – eu imploro.

Por mais que me custe ouvir tudo o que a Raquel me disse, eu sei que ela está certa e que o melhor para ambos é mesmo afastarmo-nos. Contudo, isto não quer dizer que seja uma decisão fácil a ser tomada. Este momento é uma despedida – a mais difícil da minha vida – e eu só quero que possa ser especial, que eu possa levar este momento para casa e possa recordá-lo para sempre.

A Raquel não me dá qualquer resposta verbal, mas eu sei que a sua resposta é um sim quando ela dá um passo na minha direção, reduzindo o espaço existente entre os nossos corpos. Ela envolve os seus braços em torno do meu pescoço e entrelaça os seus dedos no meu cabelo. Tenho de conter um gemido que quase escapa dos meus lábios. Que saudades do toque dela! Os meus braços voam até à sua cintura, abraçando-a para que se aproxime mais de mim, e os meus olhos fixam os dela. O mundo à nossa volta parece ter parado e eu vejo tudo em torno de nós como um borrão. Os meus olhos só conseguem olhar para ela, memorizando cada traço do seu rosto para que nunca me esqueça do quão bonita ela é – e nem precisa de tentar. Eu não aguento manter a distância entre nós e, por isso, levo os meus lábios aos dela. Fecho os olhos e deixo-me levar pelo beijo, pela química que há entre nós, pela carência do momento. Foco-me apenas em aproveitar esta despedida, em sentir cada toque, em gravar todas estas sensações na minha memória para que este seja sempre o lugar feliz onde posso voltar quando sentir a falta dela. A falta de ar obriga-me a afastar a minha boca da boca da Raquel. Os olhos dela estão brilhantes devido as lágrimas que lá se acumulam e eu sei que os meus se encontram da mesma forma. Há saudade a transbordar deles. Mas é a hora de ir embora e de tentar acabar com o sofrimento em que ambos estamos. Eu toco os seus dedos com os meus uma última vez, absorvendo todas as sensações, antes de virar costas e ir embora sem proferir mais nenhuma palavra. Não que não lhe quisesse dizer nada, mas se eu abrisse a boca eu sei que ia começar a chorar e não quero que a Raquel me veja assim. E quanto mais tempo eu permanecesse junto dela, mais difícil seria vir embora.

O momento em que eu entro no meu carro é o momento em que eu me permito expulsar todas as emoções que estão presas dentro de mim. As lágrimas caem a uma velocidade furiosa e eu só tenho vontade de gritar e partir alguma coisa. Não sei por que me sinto tão frustrado, quando eu sei que esta foi a única saída possível para que ambos possamos sarar as nossas feridas, mas a verdade é que me sinto impotente, de algum modo. Se eu tivesse ficado mais tempo no Porto, nós ainda estaríamos juntos e eu estaria muito mais feliz. Talvez seja esse arrependimento que me está a consumir e que me está a deixar frustrado.

Eu preciso de alguns minutos para me acalmar antes de pegar no carro para conduzir até casa dos meus pais. Durante todo o caminho, as lágrimas continuam a cair e eu nem as tento controlar. Acho que, pela primeira vez, desde que eu e a Raquel terminamos, eu estou finalmente a expressar as minhas emoções. Sempre me tentei conter, arranjar uma forma de passar por cima delas ou de aprender a lidar com elas, mas nunca as senti e vivi realmente. Nunca fiz o meu luto por uma relação que tinha tudo para correr bem, mas que terminou cedo demais. Estou a fazê-lo agora. Estou a sofrer tudo o que reprimi durante todos estes meses.

Estou a sofrer por tê-la deixado escapar, por não termos sido capazes de manter uma amizade sem que os nossos sentimentos interferissem, por a única solução ser um afastamento total para ambos podermos reestabelecer-nos, cicatrizar, crescer e retomar os nossos caminhos. Estou a sofrer porque ela é a mulher que eu amo, porque nós somos as pessoas certas um para o outro, mas encontrámo-nos no timing errado. Estou a sofrer porque sei que esta é a decisão certa, mas é também aquela que mais dói. Estou a sofrer porque continuo a achar que eu podia ter feito algo para contornar ou evitar tudo isto e nunca sequer tentei.

Segundas Oportunidades | André Silva ✔️Onde histórias criam vida. Descubra agora