62. Família

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23 de dezembro de 2022

André

Deixamos uma cidade de Manchester completamente coberta de neve por volta das seis da manhã, rumando ao aeroporto do Porto para podermos desfrutar das férias de Natal em família. Não regressámos a casa nos últimos três meses, porque o Santiago tem aulas e não pode faltar e também porque os horários da Raquel acabam por ser complicados, por isso estas férias têm sido muito aguardadas pelos três.

Observo a Raquel e o Santiago, nos bancos ao lado do meu, a dormir, e não controlo o sorriso automático que surge. Vivermos todos juntos, nos últimos seis meses, tem sido a melhor aventura da minha vida. Tivemos de adaptar as nossas rotinas e hábitos uns aos outros, aprender exatamente o que cada um mais gosta e o que cada um menos gosta, aprender a conviver diariamente com os bons e maus humores de cada um, como uma verdadeira família. É claro que nem todos os dias são perfeitos, que às vezes surge uma ou outra discussão, que surgem problemas, mas tudo se resolve com diálogo e, acima de tudo, com amor. O amor é o ingrediente chave para resolver qualquer problema e desse nós temos de sobra, por isso as coisas têm corrido bem.

A minha relação com o Santiago tornou-se ainda mais próxima e eu sinto que, embora já o fosse de certa forma, passei a ocupar o papel de figura paternal na vida dele e isso é algo muito importante para ambos. Gosto que ele confie em mim para falar sobre determinados assuntos que não quer contar à mãe – sobre como tem uma paixoneta por uma miúda da turma ou sobre ter sido castigado ou ter tirado uma má nota. Ele sabe que tem em mim um amigo, uma pessoa em quem pode sempre confiar para as coisas boas e para as coisas más. Não me sinto com autoridade para lhe dar raspanetes ou chamar-lhe à atenção, porque acho que esse papel não é o meu e eu não o quero assumir, mas sinto que a relação que temos funciona muito bem. Eu sou aquele que o vai buscar ao futebol, que o leva a passear, que joga consola com ele, que o ajuda nos trabalhos de casa, quando é preciso. No fundo, sou uma espécie de melhor amigo mais velho e acho que isso é o compromisso perfeito para ambos.

Relativamente à minha relação com a Raquel, as coisas vão de vento em popa. É completamente diferente podermos estar juntos todos os dias, adormecer e acordar juntos, poder chegar a casa e tê-la lá ou estar em casa quando ela chega de um turno complicado. É bom poder sentir que estamos a 100% na vida um do outro, que estamos a construir uma vida juntos. Aprendemos rapidamente os hábitos um do outro, o que é que deixa o outro furioso e quais as pequenas coisas que fazem sorrir... Acho que aprendemos a amarmo-nos ainda mais e isso é uma sensação maravilhosa.

Acho que foi o facto de ter percebido que realmente funcionamos bem enquanto família e que, desta vez, tudo vai correr bem que me fez decidir que vou pedir a Raquel em casamento. Pode parecer demasiado cedo, mas, quando eu olho para trás, percebo que os timings certos são quando nós sentimos que é o momento. Como alguém me disse há uns tempos, o amor mede-se pela intensidade e não pelo tempo. Eu e a Raquel temos uma longa história de amor, intensa, e eu sei que quero casar com ela e que quero ficar com ela até ao fim da minha vida.

Contudo, eu tenho sempre receio de ouvir um não. Não que eu ache que ela não quer casar comigo, mas tenho medo que ela pense que estou a ser precipitado. De qualquer das formas, não é por pedi-la em casamento que vamos ter de casar já. Mas, ainda assim, eu falei com a Mariana, contei-lhe sobre os meus planos e pedi a opinião dela, porque ela conhece a Raquel como ninguém. Ela disse-me que tinha a certeza que a Raquel iria dar-me uma resposta afirmativa, por isso eu avancei. Comprei o anel e planeei tudo. Amanhã é o dia e o meu coração acelera só de pensar.

Duas horas e meia depois, nós aterramos no Porto. Apesar de não haver neve, o tempo está bastante frio e o sol brilha, algo que não acontece muito no inverno em Inglaterra. Depois de todo o processo de sair do avião e recolher as malas, nós procuramos pelo Afonso no meio da multidão, visto que foi ele quem ficou de nos vir buscar. Estou prestes a ligar-lhe quando o Santiago o identifica, por isso caminhamos até junto do meu irmão mais novo.

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