29. Casamento (parte 2)

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17 de agosto de 2021

André

Dentro do salão onde se está a realizar a festa de casamento do meu primo está imenso calor, por isso eu opto por sair um pouco para apanhar ar fresco. A tarde está a cair e o céu já se encontra nas tonalidades rosa e laranja que caracterizam a mais bonita altura do dia: o pôr do sol.

Eu decido caminhar pelos bonitos jardins da quinta, com o objetivo de espairecer um pouco. O dia de hoje tem sido um valente misto de emoções e confesso que tem sido um bocadinho demais para mim.

Por falar em misto de emoções... O meu olhar pousa no grande foco de confusão da minha cabeça: a Raquel. Aproveito a distância entre nós para a admirar. Está linda, como sempre. Ela enverga um lindíssimo vestido comprido de um amarelo desvanecido, que lhe assenta na perfeição. O decote realça o seu peito e uma racha na parte lateral deixa a sua perna a descoberto. O seu cabelo, normalmente encaracolado, está perfeitamente esticado e as mechas da frente estão presas a trás com alguns ganchos. Uma maquilhagem simples e discreta e umas sandálias de salto igualmente simples completam o seu look. Ela está deslumbrante e já fez com que alguns pensamentos menos inapropriados percorressem a minha mente.

Ela está sentada junto ao lago, sozinha. Eu pondero ignorar que a vi e simplesmente ir-me embora, mas os meus pés atraiçoam-me e começam a andar até ela. Acabo sentado ao lado dela, em silêncio.

- Este final de tarde está bonito. - digo, tentando puxar algum tema de conversa.

Como eu tenho saudades da sua voz!

- Está mesmo. - ela concorda e eu vejo-a sorrir pelo canto do olho - Por que não estás lá dentro a divertir-te com a tua família?

- Estava com calor e vim apanhar ar. Depois vi-te aqui sozinha e decidi vir fazer-te companhia. - respondo - E tu, por que estás aqui sozinha?

- Depois de me certificar que o Santiago está muito divertido com os amiguinhos, vim passear um pouco. - Raquel responde - Este sítio é lindo e ótimo para refletir um pouco.

- É mesmo. - é a minha vez de concordar com as suas palavras - Então conta-me... O que tens feito? - pergunto, genuinamente curioso para saber como tem sido a sua vida.

- Acabei o curso e estou à procura de emprego na área. Não está a ser fácil, porque há falta de procura e quem procura geralmente pretende alguém com experiência. Mas pronto, eu vou continuar a insistir e no entretanto continuo a trabalhar no restaurante. - Raquel conta-me.

- Hás de encontrar, mais tarde ou mais cedo. Não podes é baixar os braços. - afirmo, sorrindo-lhe. Estou incrivelmente orgulhoso dela por ter realizado o seu sonho de se tornar enfermeira - Tu não és uma dessas pessoas que desiste à primeira dificuldade.

- Podes crer que não sou. - ela sorri - Vou lutar pelo lugar que mereço. - declara convictamente - E tu? O que tens feito?

- Nas últimas duas épocas tenho estado a jogar em Frankfurt e tem corrido bastante bem. Ultimamente têm chegado algumas propostas de vários clubes europeus, mas ainda está tudo em aberto. - revelo.

- Espero que continue a correr bem. - Raquel deseja e eu sorrio-lhe.

O silêncio que fica entre nós tem tanto de confortável como de triste. É confortável nós ficarmos aqui, sentados lado a lado, a aproveitar a companhia um do outro; contudo, é triste sentir que este silêncio se deve ao facto de nada haver para ser dito entre nós e de termos perdido a capacidade de falar um com o outro.

- Bem, eu vou voltar para dentro. Ver onde está o Santiago para irmos embora. Amanhã trabalho cedo e não posso ficar até muito tarde hoje. - Raquel quebra o silêncio, levantando-se do banco.

- Sim, claro. - levanto-me também - Sendo assim... Gostei muito de te voltar a ver.

- Eu também, André. - ela sorri e acena levemente antes de se virar e ir embora.

Magoa sentir toda esta distância entre nós, toda esta frieza, mesmo sabendo que foi esta a decisão mais certa a tomar para ambos. Precisávamos de estar longe um do outro para nos reencontrarmos a nós mesmos. Contudo, não é por ter sido a decisão certa naquele momento que me faz sentir melhor; continua a magoar, a causar dor e a deixar, acima de tudo, muita saudade.

Durante estes três anos durante os quais não vi a Raquel, mudei muito. Talvez mudar não seja o termo certo; eu cresci. Aprendi que amor nem sempre é suficiente para manter uma relação, que é preciso muito mais e que o fator tempo é incrivelmente importante. Acredito piamente, hoje mais do que antes, que as coisas acontecem num determinado momento e têm um prazo de validade; quando atingem esse prazo, estão destinadas a chegar a um fim. Foi isso que aconteceu entre nós: vivemos aquela relação, amámo-nos intensamente e demos tudo de nós um ao outro, mas quando chegou o momento isso teve de acabar para que cada um de nós pudesse ser dono do seu próprio destino, trilhar o seu próprio caminho e crescer por si mesmo. Sarar as feridas e olhar para as cicatrizes com orgulho e não com tristeza. Hoje, sou uma pessoa mais forte e mais pronta para voltar a amar.

Se serei capaz de voltar a amar outra pessoa como amei (amo) a Raquel? Não, de todo. E já tive provas disso. Tentei estar numa única relação, durante estes três anos. Conheci uma rapariga, a Bianca, e começámos a namorar. Ainda namorámos durante bastante tempo, praticamente um ano, mas quando as coisas começaram a ficar sérias eu comecei a ficar com medo. Medo do compromisso. Medo da desilusão. Medo da rejeição. Medo de perder e de voltar a sofrer. E porque eu sabia que, por mais que as coisas funcionassem entre nós, a Bianca nunca seria a Raquel. Então acabei tudo e resolvi focar-me unicamente no futebol, deixando que tudo o resto acontecesse naturalmente.

Agora estou sozinho e acho que estou bem. Estou pronto para aquilo que a vida tiver para me dar, mas não vou forçar nada. Quando algo tiver de acontecer, acontecerá e eu estarei pronto. 

***

Este capítulo é mais curtinho e foi só mais um presentinho para vos agradecer pelos comentários tão queridos que têm deixado e por continuarem a acompanhar esta história, apesar das minhas demoras. 

Espero que tenham gostado de conhecer esta perspetiva do André e de perceber quais os sentimentos dele acerca de tudo o que aconteceu.

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