35. Mensagem Recebida

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3 de outubro de 2021

André

São quatro da tarde quando eu estou a abandonar a City Football Academy, o centro de treinos do Manchester City, o clube pelo qual assinei por duas épocas durante este verão. Estou aqui há cerca de mês e meio e estou, sinceramente, muito satisfeito. Estou a adaptar-me muito bem à cidade e à equipa, estou a jogar e a sentir-me a melhorar a cada dia. Sinto que estou finalmente onde sempre sonhei estar e isso dá-me uma paz de espírito gigante. É claro que toda esta adaptação foi facilitada pelo facto de eu ter um grande amigo a jogar neste clube, o Bernardo Silva. Foi ele quem me ajudou com tudo aquilo que eu precisei, que me apresentou ao resto da equipa fora dos relvados, que me fez sentir em casa e isso é algo que eu valorizo muito. Como ele me disse desde o início, ele sabe como é difícil ser um português a jogar fora de casa e sabe como é importante termos alguém que nos dê a mão enquanto nos sentimos fora de pé. Por isso, é a ele que eu devo muito desta minha paz de espírito.

- Pronto para o jogo de amanhã? – o Bernardo, que caminha ao meu lado até ao estacionamento, pergunta.

- Ansioso, acima de tudo. – respondo, gargalhando. Será o meu primeiro derby aqui em Manchester e o Mister já me garantiu que eu vou jogar, por isso o peso nos meus ombros está grande. Sei que todos estão de olhos postos em mim, que as expetativas estão elevadas e não posso falhar – Não quero desiludir.

- Não vais, puto, tenho a certeza. – Bernardo afirma, dando-me uma pancadinha nas costas – Os treinos têm corrido super bem, os outros jogos também... Todos sabem que eu e tu formamos uma boa dupla ao ataque!

- É verdade, isso não podemos negar! – concordo com o meu amigo.

Eu tiro o telemóvel do bolso num gesto de hábito e rotineiro, mas sou surpreendido por uma mensagem de um número que há muito não aparecia no visor do meu telemóvel.

- Então, mano, aconteceu alguma coisa? Ficaste estranho de repente. – Bernardo observa, chamando-me a atenção.

- Recebi uma mensagem que me apanhou desprevenido... - assumo, relendo a mensagem.

- Mas são más notícias? – ele pergunta.

- Não... É uma mensagem da Raquel. – eu afirmo e logo a sua expressão muda.

- Ah, agora percebo a tua cara. É, de facto, inesperado. – ele concorda.

O Bernardo e eu conhecemo-nos há muitos anos e somos muito bons amigos, pelo que ele está perfeitamente familiarizado com a minha história com a Raquel.

- Estás bem? – ele pergunta.

- Acho que sim. – afirmo – Ainda nem fui capaz de ler. – assumo.

- Oh puto, não há de ser nada de mal. Além disso, vocês estiveram juntos no casamento do teu primo, não foi? – ele pergunta e eu assinto – Se calhar, ela quer retomar a vossa amizade.

- Porquê agora? Seguiu finalmente em frente e acha que já é capaz? – questiono, suspirando – Se calhar é melhor ler a mensagem, talvez me ajude a perceber... - penso, em voz alta.

- Sim, lê lá isso. – o Bernardo incentiva-me.

De: Raquel

Mensagem: Olá, André. Como estás? Espero que este ainda seja o teu número ou, caso contrário, nunca chegarás a saber aquilo que tenho para te dizer. Estou a mandar mensagem porque tenho uma mudança prestes a acontecer na minha vida e não podia deixar de a partilhar contigo. Arranjei trabalho na minha área... Numa clínica em Manchester. E sim, eu sei que estás agora a jogar pelo Manchester City, porque esse foi um dos motivos que me levou a mandar-te mensagem. Achas que podíamos encontrar-nos, um dia destes, para conversar? Um beijinho grande com saudades.

Eu termino de ler a mensagem com um sorriso no rosto e com uma sensação de alívio que nem sei explicar. Primeiro que tudo, estou muito feliz e orgulhoso pela Raquel ter conseguido encontrar emprego, a fazer aquilo que ama e pelo qual lutou tanto. Depois, confesso que também me deixa feliz que ela queira ver-me, falar comigo, porque isso é algo de que eu preciso há muito tempo, mas que nunca tive coragem de lhe pedir.

Por mais que me tenha magoado a decisão que ela tomou - por mais que no inicio me tenha custado aceitar e eu tenha inclusive passado por uma fase complicada, em que não era capaz de compreender os motivos que a (nos) tinha levado a tomar tal decisão -, eu sei que foi o melhor para ambos. Pudemos crescer enquanto pessoas, sarar as nossas feridas, aprender a amar-nos a nós próprios antes de entregarmos amor a outra pessoa. E, de facto, eu sinto que este tempo me fez muito bem. Mudei muito, comecei a ver tudo de uma outra perspetiva e sinto que sou uma pessoa muito mais madura hoje, muito mais pronta para entrar numa relação séria e fazê-la funcionar.

Durante este tempo todo que passou, eu tive uma única relação que não correu como eu esperava, mas que me ensinou muito. Eu achava que estava preparado para estar com alguém, mas apercebi-me lentamente que ainda estava apaixonado pela Raquel, que estava sempre a pensar nela e a desejar estar com ela – tal como aconteceu com a Gio, antes. Então, depois disso, eu percebi que não ia mais forçar nada e que ia apenas deixar as coisas acontecerem. Ter reencontrado a Raquel no casamento foi um relembrar de tudo o que vivemos e dos sentimentos que nutríamos. Continuo a amá-la e vou amá-la para sempre, mesmo que não haja mais oportunidades para nós.

Há muito tempo que sinto que aquilo que realmente falta entre mim e a Raquel é uma conversa sobre estes três anos afastados. Uma conversa honesta sobre os nossos sentimentos, sobre o que passámos, o que vivemos. E deixa-me feliz saber que ela quer conversar comigo, agora. Acho que precisamos disso e que devemos isso um ao outro.

- É uma boa mensagem? – Bernardo questiona-me.

- Sim. Ela arranjou trabalho numa clínica, aqui em Manchester. E pediu-me para conversarmos. – afirmo.

- Isso é bom, puto. Quem sabe se não é em Manchester que as coisas entre vocês se vão resolver a sério, que vocês vão finalmente ser felizes. – Bernardo diz.

- Não sei se há essa esperança toda para nós, mas deixa-me feliz saber que ela está a realizar os sonhos e que quer conversar comigo para tentarmos ser amigos, talvez. Gostava muito que isso fosse possível. – declaro.

- Vais ver que sim. Aquilo que vocês sentem um pelo outro é algo muito forte, um laço que vos unirá para sempre e eu acho que ainda há esperança, André. – Bernardo afirma e eu encolho os ombros.

- Sinceramente, acho que saber que ela está bem e feliz me chega. Tê-la por perto, nem que seja como minha amiga, é suficiente para me deixar bem. – digo e o meu amigo gargalha, obviamente desdenhando da minha fala.

- Daqui a uns meses falamos. – ele diz e eu reparo, então, que chegámos aos nossos carros – Depois contas as novidades. Até amanhã! – ele despede-se.

- Até amanhã.

Eu entro no carro, mas não o ligo. Fico a olhar para o visor do ecrã, a decidir o que vou responder. Uns minutos depois, eu finalmente começo a escrever.

Para: Raquel

Mensagem: Olá. Estou bem e tu, como estás? Ainda bem que o meu número é o mesmo, porque estou muito feliz por receber estas novidades tuas. Não imaginas quão orgulhoso estou de ti e quão feliz estou pelos teus sonhos estarem a tornar-se realidade. Mereces o mundo! Parece-me uma ótima ideia encontrarmo-nos e sentarmo-nos a conversar. Já estás em Manchester? Quando queres combinar algo? Um beijinho cheio de saudades.

Envio, finalmente, a mensagem e depois sigo para casa, de coração leve e alma renovada. Que as coisas melhorem!

***

O reencontro da Raquel e o do André está cada vez mais perto... Como irá correr?

O meu semestre já começou e, por esse motivo, vou aparecer menos por aqui mas, ainda assim, vou tentar atualizar, no mínimo, uma vez por semana.

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