Segundas Oportunidades | André Silva ✔️

39. Conversas de Irmãos

24 de outubro de 2021

André

Apesar de renhido e difícil, o jogo acaba com uma vitória por um a zero da nossa parte – um golo do Bernardo com uma assistência minha. Confesso que foi o jogo mais épico desde que cheguei aqui e foi aquele em que mais senti toda a adrenalina a correr nas minhas veias. É claro que eu sei que o facto de ter dois espetadores especiais também teve influência, porque quis fazer ainda melhor do que o normal para não os desiludir.

- Foi um grande jogo, mano! – o Bernardo comenta, quando entramos no balneário.

- Foi mesmo! Melhor que isto só um Porto-Benfica! – exclamo, picando-o.

- Ah pois, a diferença é que num desses estamos em equipas diferentes. – ambos gargalhamos – E tu ias acabar a chorar que nem um bebé com a abada que ias levar.

- Coitado, esse ego benfiquista está demasiado elevado para o meu gosto! – alinho na brincadeira, dando-lhe um encontrão.

A pequena picardia termina quando nos juntamos ao resto da equipa nos festejos no balneário. Estamos todos muito mais motivados e animados para os próximos jogos, porque uma vitória destas é um boost de confiança. Estamos cada vez mais perto de conseguirmos passar o clube que está atualmente em primeiro na tabela e são estas vitórias que nos dão todas as certezas de que somos capazes.

Depois das celebrações no balneário e do banho, cada um segue o caminho para sua casa, para podermos repor energias. Uma mensagem da Raquel está no visor do meu telemóvel.

De: Raquel

Mensagem: Parabéns pelo jogo! Foi incrível assistir a um espetáculo destes, obrigada pelos bilhetes. O Santiago também delirou e não imaginas como está feliz por se poderem ver mais vezes, agora que voltaram a viver na mesma cidade. Ficou com pena de não poder ver-te ainda hoje, mas eu calculei que te esperassem celebrações e amanhã é um dia longo para mim e para o Santiago. Bem... Mais uma vez, obrigada pelos bilhetes e parabéns! Foi um prazer ver-te em palco novamente, sabendo que estás verdadeiramente feliz. Até breve!

Quando termino de ler a mensagem, há um sorriso estúpido no meu rosto. Por tudo. Porque estou a jogar num clube onde me sinto bem; porque está a correr tudo bem e eu estou a jogar; porque tenho amigos aqui; e, agora, porque a Raquel e o Santiago estão aqui. Quem sabe não estará aqui a nossa oportunidade de voltarmos a ser felizes? A verdade é que não tenho pensado muito sobre isso, porque quero realmente levar as coisas devagar para que tudo possa correr bem desta vez, mas é claro que a ideia de uma família, composta por nós os três, é algo que já me passou pela cabeça.

Para: Raquel

Mensagem: Obrigado! Fico muito feliz por terem vindo e por se terem divertido. Também gostava de poder ter estado com ele (convosco), mas só agora é que estou a sair daqui e não vos queria fazer esperar tanto... Combinamos algo muito em breve! Deseja boa sorte por mim ao campeão, para amanhã! E mais uma vez, obrigado!

Envio a mensagem e ligo então o carro, conduzindo na direção do meu apartamento. Durante todo o caminho, o sorriso mantém-se no meu rosto e eu nem se quer me esforço para o fazer sair, porque estou realmente bem. Sinto-me melhor do que me tenho sentido nos últimos anos. Sinto-me finalmente bem, física, psicológica e emocionalmente. Pela primeira vez em alguns anos, não sinto necessidade de apanhar o primeiro avião para casa sempre que tenho um tempo livre. Sinto-me bem onde estou, com quem estou, como estou.

Chegado a casa, vou até à cozinha arranjar algo leve para comer. Misturo grão cozido com atum numa taça e vou comer a minha rápida refeição na sala, enquanto vejo um filme. Recebo uma mensagem do meu irmão a relembrar que vem ter comigo amanhã e que não me posso esquecer de o ir buscar ao aeroporto – algo que, por acaso, eu já não me lembrava. Depois de comer e de terminar o filme, decido ir descansar após este dia longo e cansativo.

***

25 de outubro de 2021

- Calma, eu preciso que me expliques isso melhor porque eu não estou a perceber. – Afonso declara, enquanto almoçamos numa esplanada de um restaurante de Manchester – Tu e a Raquel estão juntos?

- Não. – respondo – Nós somos amigos que estão a construir algo do zero. – repito.

- E isso quer dizer o quê, exatamente? – ele insiste e eu reviro os olhos. O meu irmão consegue ser um grandessíssimo chato, às vezes.

- Puto, nós temos um passado e temos noção que isso influencia muito quem somos hoje e a relação que temos. O nosso objetivo é tentar que isso não aconteça. Não é exatamente esquecer o que aconteceu, mas ignorar que temos esse passado e tentar começar agora algo que não tenha na base o que aconteceu antes. – explico – Queremos fazer as coisas bem, desta vez. Ter uma boa amizade, apreciarmos a companhia um do outro e ver o que acontece. Se não der em nada, ao menos ficamos amigos. Não estamos a forçar nada, apenas a deixar fluir. As nossas vidas são diferentes agora e nós somos diferentes. Queremos que as coisas aconteçam de forma diferente.

- Pronto, okay... Estão a fazer as coisas de forma adulta. – o Afonso conclui e eu assinto – Estou orgulhoso. Acho que estava mais que na altura, meu.

- Vá, mas não comeces com filmes nessa cabecinha. Nem vás meter ideias na cabeça da mãe. Quando houver algo para contar, eu conto. – declaro e ele assente.

- Não te preocupes, prometo que não digo nada. – afirma – O Santiago também já está cá?

- Sim, chegou no sábado. Ontem, foram ver o jogo ao estádio. – conto.

- Estiveste com eles? – pergunta.

- Não. Já saí do balneário tarde e obviamente eles já tinham ido embora. O Santi começa hoje as aulas. – explico – Mas estou ansioso por vê-lo. Já tenho saudades do puto.

- Eu sei. – o Afonso diz e eu olho-o, não percebendo bem o motivo do seu tom natural, como se o que eu tivesse dito fosse o constatar de um facto óbvio – Vocês têm uma conexão especial. – ele explica – E tu podes negar quantas vezes quiseres, mas o Santiago é tanto teu como da Raquel. Tu olhas para ele como se fosse teu filho, trata-lo como tal, gostas dele como tal. E ele gosta de ti como se fosses pai dele, mesmo que nenhum de vocês o verbalize.

- Passaram cinco anos desde que nos conhecemos e desde logo que criámos uma relação de grande proximidade, por isso eu tenho acompanhado o crescimento dele e... Isso, inevitavelmente, faz com que eu me sinta um pouco responsável por ele. – digo – E se queres que seja totalmente honesto contigo, o Santiago é o filho que eu queria ter. Eu gosto do miúdo, ele é inteligente, perspicaz, muito maduro para a idade que tem, gosta de futebol... Sei lá, acho que às vezes vejo um bocadinho de mim nele.

- Não há nada de errado nisso. Eu não me importava de ter um sobrinho como o Santiago. – o Afonso brinca – Aliás, ele já é um bocadinho meu sobrinho, porque a Raquel é quase uma irmã. Por isso, se vocês ficassem juntos era só incrível.

- Menos, Afonso. – declaro, revirando os olhos e fazendo o meu irmão gargalhar – Seja como for, está tudo bem como está agora e eu prefiro assim. Que as coisas aconteçam quando e como têm de acontecer. Sem pressões.

- Fazem bem, falando a sério. – o Afonso responde.

Como hoje tenho o dia livre, nós aproveitamos o bom tempo para ir dar uma volta antes de nos fecharmos o resto da tarde e da noite no meu apartamento a jogar FIFA. Apesar de já me ter habituado a viver sozinho, é realmente bom poder ter alguém familiar comigo, de vez em quando. Alguém que me conhece realmente bem, com quem posso falar sobre as coisas de que gosto, com quem posso passar o meu tempo e com quem posso jogar FIFA. Poder ter todas essas coisas no meu irmão é só incrível e eu estou realmente feliz por ele estar aqui – mesmo que ele consiga desarrumar-me mais a casa em duas horas do que eu desarrumo num mês inteiro.

***

Espero que estejam todos bem! E espero também que estejam a gostar desta minha história e do seu desenvolvimento. Prometo que muita coisa boa está por vir!

Aproveito para alguma self-promotion: eu tenho uma outra história com o André, bastante diferente desta, no meu perfil. Chama-se Flirtationship e conta ainda apenas com 2 capítulos. Aguardo a vossa visita! ;)