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Meses depois...

Renato

Gilson: Vou pegar uma obra mais tarde na outra rua, quer ir não? - disse enquanto comia.

Renato: Sim po, to sem bico nenhum é preciso descolar uma grana agora que Joyce tá por aqui! - ele assentiu. - To indo lá na praça encontrar com os moleques!

Gilson: Tá com os documentos aí? - assenti - Vacila não!

Renato: Eu sei.

Meu coroa é foda, sempre salva! Foi ele quem me criou desde pequeno já que a minha mãe se separou dele quando eu ainda tinha quatro anos e foi morar em outro estado.

Foi ele quem sustentou, foi pai e mãe, me ensinou grande parte do que sei e me manteve na reta. . Apesar de ser de onde eu sou, nunca cresci o olho pras ilegalidades da vida, pro caminho "mais fácil" mesmo que a tentação seja imensa e a revolta também incite.

Revolta po, revolta mesmo... Ser adolescente, pobre, preto e morador de favela no Brasil não é fácil. O esculacho é dia a dia, o racismo, a indiferença e a perseguição apenas por tu ser quem é, de onde é e pela tua cor grita.

Acho maneiro quem não convive com nada disso, quem é privilegiado e não passa pelos transtornos diários que passamos diariamente... Mas do lá de cá as coisas são bem diferentes!

Sávio: Tu acredita que os cana me pegou com o boldo no bolso vindo pra cá ?

Renato : Para de k.o... Tá inventando tu po, real?

Sávio: Sim... Fala pra ele, Luan.

Luan: Sim, cara... Maior doideira!

Renato: E aí, deu em que? Tu tá rindo viado? - falei sem entender. - O que rolou?

Sávio: Nada! - deu risada. - Se eu falar pra tu que eles ainda reclamaram comigo por estar andando aqui no parque roial, tu acredita? Falaram que aqui é perigoso pra mim! - deu risada. - Logo eu... cria!

Quem vê falando assim até pensa que é cria, mas de cara tu já vê a cara de Maurício do caralho.  Sávio é daqueles menó de apartamento que mete disfarce, põe risco na sobrancelha, faz de tudo pra ficar com "cara de bandido", mas mesmo assim passa longe.

Papo reto? É maior doideira isso, complicado de entender... Enquanto nos que mora em comunidade faz de tudo pra não ser confundido com envolvido, eles que moram longe faz de tudo pra se parecer!

Mas voltando ao assunto é nessas paradas que tu vê o privilégio branco, a diferença de tratamento que rola, que revolta... Parceiro, eu, pretinho sendo pego com só uma seda no bolso era pau viola pra cima de mim.

Tinha nem conversa, nem muito menos cuidado, até porque preto é logo taxado como traficante, mas branco não... É usuário!

Luan: Esses canas são comédia, já rolou um lance parecido comigo também. - riu.

Nem falei nada, só balancei a cabeça em negativa mesmo... isso é foda pra caralho, não tem como não se revoltar.

FICHA SUJA (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora