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Joyce

Thales: Me da ele! - pegou o Théo da mão da Leandra assim que a gente chegou. - Rapá! - brincou com o mesmo indo pra fora de casa.

Leandra: O que foi? - me encarou. - Por que você tá com essa cara? - olhou pra mim.

Minha comadre me conhecia muito bem, ela sabia distinguir minhas expressões e se eu estava bem apenas pela meu rosto. Também nunca fui boa em esconder nada, sou transparente até de mais!

Se eu gosto de uma coisa, dá pra notar. Se eu não gosto também. Se eu chorei, estou triste ou desesperada tudo fica muito evidente... é notório.

Joyce: Eu não sei nem... - ela me cortou.

Leandra: Sem rodeios, Joyce! Por favor!

Joyce: Calma, deixa eu falar... - pedi, mas quem disse que ela me ouviu?

Leandra: Me fala o que aconteceu, foi alguma coisa com o meu marido? - disse já com os olhos lacrimejados e eu não tive condição de responder mais. - Foi? - passou a mão no rosto desesperadamente.

Joyce: Foi... - eu assenti baixo balançando com a cabeça.

Leandra: Ele foi baleado? Foi preso? Me fala... ele não morreu não né? - disse já chorando. - Não meu Deus do céu! Não pode ser. Ele morreu? - disse enquanto andava de um lado pro outro, mas ao fazer o último questionamento parou pra me encarar.

Joyce: Eu sinto muito! - só isso que eu consegui dizer, pois eu já estava chorando abeça.

Me faltavam palavras... a dor era real! Quando Vanessa ligou me dizendo eu entrei em choque, não acreditei. Mas ele foi baleado e morreu bem próximo a casa dela, e ela já tinha recebido até foto.

Leandra: Não... não, não! - disse gritando. - Não! Meu Deus do céu... O Wagner não, cara! - disse gritando. - E agora? E agora? Não pode ser, meu Deus! Que dor... - disse gritando. - O que é que eu vou fazer agora?

Eu não tinha nem o que dizer pois também já chorava pra caralho. Eu fui em sua direção, a abracei tentando acalma-la, mas era inevitável! Leandra em meio a gritos e choros caiu no chão durinha desmaiada.

(....)

Leandra: Meu filho... - disse chorando no sofá com ô Theo no colo. - Ele vai crescer sem pai, meu Deus! Por que isso? Que sofrimento! Eu tanto falei com o Dino, cara. Falei tanto! Por que ele foi fazer essa merda?! Foi se meter nessa... - disse enquanto alisava o Theo.

Ela falava tanta coisa em meio às lágrimas e eu só lembrava do Renato. Sumiu, estou sem notícias nenhuma dele mesmo em meio a essa tragédia.

Que situação difícil! Eu estava tentando ser forte por eles, tentava auxiliar a Leandra nesse momento complicadomas tava foda. Meu compadre, cara!

Dino era um cara muito gente boa, não mereceria esse triste fim não. Sei que os caminhos nessa vida quase sempre são esses, são inevitáveis, mas a gente nunca quer ver quem amamos em tal situação.

Imaginamos, choramos, alertamos, mas nunca... nunca gostaríamos de fato de passar por isso. Perder quem se ama é uma dor sem fim.

Joyce: A irmã dele já tá vendo as coisas do velório, foi pro iml. - disse assim que eu desliguei o telefone.

Pra tirar o corpo do meio do fogo cruzado foi um sacrifício, os próprios caras tiveram que por pra descer. Polícia não tava subindo lá, disseram que não iriam se meter, então só ficavam nas entradas da favela mesmo.

Com certeza ganharam algum dote pra fazer vista grossa, deixar rolar... então cada um que se responsabilizasse pelos seus, né?! Se matassem!

Daí foi mais um sofrimento! Só quando os caras desceram que o iml pode levar o corpo pra levar e isso só foi quase a noite.

Leandra não tinha condições de atender telefone nem nada, então eu que tava entrando em contato com a família dele, intermediando.

Ligava, perguntava as coisas e ainda tinha que ouvir piada, desaforo. Última ligação que fiz, irmã dele me disse que o iml não queria liberar o corpo, estavam pondo empecilhos!

Pronto... agora só faltava essa. Como se já não bastasse o sofrimento da família, estarem passando por essa situação, ainda tem que viver essa humilhação, mais esse sofrimento e martírio.

FICHA SUJA (DEGUSTAÇÃO)Onde histórias criam vida. Descubra agora