João
João olha para o trono, e percebe que a serpente esculpida em seu encosto está virada para ele, observando-o com seus olhos de rubi.
- Quem é você? – João pergunta, assustado. – O que é você?
- Eu sou você – a serpente diz. – Quando você tiver dúvidas de quem você é, olhe para dentro de si mesmo e você me encontrará.
A resposta deixa João confuso.
- O que você quer? – ele pergunta.
A serpente rasteja em direção a João, e sobe pela sua perna. O jovem Príncipe sente-se assustado, mas não esboça reação. De alguma forma, ele sabe que a serpente não representa um perigo para ele. Ela dá uma volta em seu torso e descansa a cabeça em seu ombro.
- Vire-se – ela diz.
João a obedece. O salão, que antes estava vazio, agora encontra-se repleto de pessoas. Lordes, Barões e Eruditos amontoam-se lado a lado em frente ao trono. O mezanino, igualmente, está lotado de nobres. João consegue ver pessoas até do lado de fora, no corredor.
Ele olha para si mesmo e percebe que está vestindo a sua armadura. O roxo escuro do metal contrasta com os detalhes dourados. Em sua cintura, está pendurada a Espada do Renascer.
A um só tempo, como se tivessem ensaiado, todos os nobres presentes no Salão do Trono ajoelham-se diante de João.
- O que eles estão fazendo? – ele pergunta. – Onde está meu irmão?
- Seu irmão está junto de seu pai agora – diz a serpente.
João sente um frio no estômago. Durante os últimos dias, ele tem tentado se esquecer de tudo o que aconteceu no Ninho, mas os acontecimentos voltam de forma sorrateira à sua memória, forçando-o a reviver todo o terror. As palavras de Dom Eduardo, que o sacudia tentando acordá-lo naquela noite, soavam tão surreais que João achava que ainda estava sonhando.
- Eles traíram seu pai! – ele gritava, agitado. – Nós temos que sair daqui!
João só teve tempo de vestir o seu manto e afivelar o cinto que carrega a sua espada. Não houve tempo de vestir a armadura que ele tanto gosta.
- O que você quer dizer? – João pergunta à serpente. – Meu irmão tem que estar aqui. Ele é o Imperador agora.
- O Imperador é você – a serpente responde, e por um momento João tem a impressão de que ela está sorrindo. – Estes são seus súditos agora. Você decide o que fazer. – João pensa por um momento. Ele percebe que Dom Eduardo está de pé ao seu lado, mas ele não responde quando João o chama. – Não adianta chamá-lo, jovem Imperador. Você deve decidir sozinho. O que você quer?
- Vingança.
A serpente silva em regozijo e se movimenta pelo corpo de João, mirando a multidão em sua frente.
- Você terá a sua vingança, mas terá que pagar um preço.
- Que preço?
A serpente não responde. Ela se desvencilha do corpo de João, rastejando de volta ao trono. João vira-se para ela, enquanto ela retoma sua posição original no encosto do assento do Imperador.
- Que preço? – João insiste.
Novamente a serpente silva, acenando com a cabeça em direção ao salão. Ao se virar novamente, João vê centenas de corpos em decomposição, todos vestidos em armaduras esplendorosas e vestimentas finas. Ele dá um passo para trás e, pisando em seu próprio manto, cai no chão, gritando.
- Você está me ouvindo? – diz uma voz familiar e distante. – Abra os olhos! Vamos, abra os olhos!
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Das Cinzas da Era Perdida
FantasiaUma traição põe fim à Guerra dos Dois Irmãos e arrasta o Império para um novo conflito. Novas alianças se formam na luta pelo poder, enquanto outros lutam pela sobrevivência em meio ao caos.