Capítulo 3 - Alfredo - Parte 1

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Alfredo

A vela está quase se apagando, mas Alfredo não percebe. Ele já perdeu a noção do tempo, sentado em um canto isolado em uma das seções mais antigas do subsolo da biblioteca. Um imenso livro de capa de couro e páginas amareladas está aberto na mesa em sua frente, com escritos em uma língua estranha.

Alfredo vira a página. Mais essa página e termino por hoje, ele pensa. Ele tem repetido a mesma promessa há horas. A história antiga da Terra Proibida sempre o fascinou, e por isso ele a escolheu para ser seu tema de estudo. Ele pretende expor suas descobertas sobre os povos antigos no seu exame de admissão ao Conselho dos Eruditos. Em todo o Império, apenas ele entende a antiga língua dos povos selvagens.

Com olhos cansados, ele lê mais uma passagem. As cinzas de uma era perdida serão o presságio do amanhecer de novos tempos. A profecia, escrita em um antigo dialeto, é complicada e obscura. Ele a lê novamente, destrinchando a frase para ter certeza que sua tradução está correta. Ele escreve algumas notas em um pedaço de papel já tomado por anotações. A linguagem dos povos antigos dificilmente é clara, e Alfredo não tem certeza sobre a tradução de algumas palavras.

Ele resolve descansar um pouco os olhos e se debruça sobre a mesa. Sua barriga fica no meio do caminho, impedindo-o de achar uma posição confortável. Ele não havia se dado conta de como engordou nos últimos meses.

De origem pouco nobre, Alfredo nunca teve esperança de ser alguém relevante. Com seu rosto redondo, olhos pequenos como os de um roedor, nariz grande e orelhas maiores ainda, além de cabelos duros e encaracolados, nem ao menos uma bonita esposa ele tem a ambição de conseguir. Ele é esperto o suficiente para saber que isso está fora de questão.

Mas ele não se importa. Alfredo sempre gostou de ler; ele sempre teve fascinação por livros. Desde que ouviu falar dos Eruditos pela primeira vez, ele soube que este era seu destino.

Alfredo ouve um barulho e levanta a cabeça abruptamente. São passos não muitos distantes. Alguém se aproxima. Quem será a essa hora? Ele fecha o livro e tranca a fivela que liga a sua capa e contracapa.

- Quem está aí? – Alfredo pergunta.

A chama de sua vela se apaga. Alfredo sente seu coração acelerar. Seu medo é infundado, ele sabe, pois ninguém machucaria um Erudito ou, no caso dele, um aprendiz. Eruditos são inofensivos, pois a única arma que possuem é seu conhecimento.

- Quem está aí? – Alfredo repete em meio à escuridão, sua voz trêmula.

Ele vê um foco de luz entre duas estantes de livros. Uma lamparina, talvez? Ele não consegue enxergar quem, mas há uma pessoa vindo em sua direção. Quase ninguém vem nesta seção da biblioteca, onde são guardados os livros e escrituras dos povos antigos.

Das Cinzas da Era PerdidaOnde histórias criam vida. Descubra agora