Capítulo 5 - João - Parte 6

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João

Quando o céu começa a escurecer, Dom Eduardo para novamente. Ele procura a árvore mais próxima, e senta-se apoiado em seu tronco. João ajoelha-se ao seu lado, apreensivo. O cavaleiro dá um triste sorriso. Para a surpresa do Príncipe, lágrimas começam a escorrer de seus olhos.

- Perdoe-me, Príncipe – ele diz, com uma voz fraca. – Mas eu não posso mais... você vai ter que continuar sem mim.

- Não! – o Príncipe grita. – Eu não vou...

- Não grite! Alguém pode te ouvir – Dom Eduardo segura firmemente o braço de João e o puxa para próximo de si. – Escute, João. Você tem que voltar para o Punho. O seu irmão precisa de você. Você é o sucessor agora. Eu já te ensinei tudo o que eu sabia. Você não precisa mais de mim. Continue pela margem do Rio. Em poucos dias, você estará nas terras de Lorde Bainard.

- Mas você não pode... – João diz, teimosamente. – Eu te proíbo de morrer!

Dom Eduardo sorri por um momento, e fecha os olhos. Ele solta o braço de João e desaba no chão.

João corre.

Ele corre o mais rápido que pode, com sua espada na mão, cortando a vegetação à sua frente. Ele golpeia com sua espada qualquer coisa que vê em seu caminho. Ele não sabe ao certo por quanto tempo ele corre, nem para onde ele está indo. Quando finalmente para, já é noite. Ele olha em volta. A luz da lua cheia ilumina o bosque, e a grama alta movimenta-se com o vento frio que sopra suavemente.

Subitamente, João é tomado pelo medo. É como se o mundo desabasse sobre sua cabeça. Ele nunca se sentiu tão sozinho e desamparado como agora. Ele se sente pequeno, impotente. Finalmente, ele chora. O que importa se ele é sucessor do trono? O que importa se ele é bom com a espada?

Ele deixa as lágrimas escorrerem por um bom tempo, parado no meio do bosque, segurando a sua espada, sem saber o que fazer.

Quando o desespero finalmente diminui, ele esfrega as lágrimas com a manga de sua camisa. Ele observa a serpente da Família Scliros bordada em seu peito, e se enfurece. Pra que serve essa serpente estúpida? Ela não salvou o seu pai, não salvou Dom Eduardo, e não salvará ele também.

João decide voltar ao lugar onde deixou Dom Eduardo. Seu mentor merece pelo menos um enterro.

Ao dar meia volta para ir embora, no entanto, ele vê de relance algo que chama sua atenção. Por cima da copa das árvores uma coluna de fumaça se ergue em direção ao céu. Uma fogueira, ele pensa.

Ele sabe que deve fugir, mas quando se dá conta, suas pernas já estão em movimento. Ele corre na direção da fumaça sem se preocupar em não fazer barulho, sem tomar cuidado para não ser notado; sem tomar nenhuma precaução. Nem mesmo o cheiro da comida chama a sua atenção.

Ao chegar no lugar de onde vem a fumaça, João vê uma fogueira acesa no meio de uma clareira no bosque. Em volta do fogo, duas pessoas o observam com olhos curiosos e expressões de perplexidade. Uma delas é uma menina, mais velha que ele, de cabelos escuros e olhos castanhos, o rosto coberto de sardas. Ela está vestida em farrapos. João já viu centenas de meninas como ela, vagando pelas ruas da Cidade do Punho com seus olhos melancólicos. O outro é um rapaz, mais velho que sua companheira e muito parecido com ela. Seus cabelos também são escuros e seus olhos têm o mesmo tom castanho. Ele também tem um rosto fino e longo, cheio de sardas, e está vestido em roupas velhas e surradas.

Das Cinzas da Era PerdidaOnde histórias criam vida. Descubra agora