Capítulo 8 - Alfredo - Parte 5

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Alfredo

Uma mulher aparece na porta da cozinha para o salão. Olga é uma mulher alta e forte, com cabelos vermelhos que escorrem até os seus ombros e enquadram seu rosto fino, olhos azuis e nariz longo. As rugas de seu rosto indicam que ela já deve estar perto de seus cinquenta anos. Manchas de comida marcam o seu avental branco. Ela sorri quando vê Dom Aldo.

- Que grata surpresa, Dom Aldo – ela diz enquanto atravessa o salão. – Olhe para você. Maravilhoso, como sempre. Você nunca tira essa armadura, não é? Não tem problema, ela foi feita para você. Faz tempo que você não aparece por aqui.

- Temos tido alguns problemas no Punho ultimamente.

- Eu ouvi falar. Que notícias terríveis temos recebido aqui!

- Você ficou sabendo do que aconteceu no Punho? – Dom Aldo pergunta, surpreso. Geralmente, as notícias demoram um pouco para se espalharem.

- Essas chegaram bem rápido – ela diz, puxando Dom Aldo pela mão. – Venha, sente-se aqui. Eu vou lhe servir algo. Quem é seu amigo?

- Este é Alfredo. Aprendiz de Erudito.

- Prazer, Dona Olga – Alfredo diz.

- Não me chame de Dona. Só Olga está bom. Onde vocês puseram seus cavalos? – Olga vira-se para as escadas que levam ao segundo andar. – Oliver! Desça aqui! – Um menino ruivo, alto, muito parecido com Olga, desce as escadas apressadamente. – Oliver, tome conta dos cavalos de nossos visitantes. Ponha-os nos estábulos e certifique-se de que eles têm água e feno.

Sem perder tempo, o menino vai para o lado de fora para cumprir sua tarefa.

- Conte-me, Olga – Dom Aldo diz, sentando-se à mesa. – Como você ficou sabendo das notícias do Punho?

- Os homens dos Bainards me contaram tudo sobre o que aconteceu.

- Os soldados da Agulha? – Dom Aldo franze a testa. – O que eles têm feito por aqui?

- Não faço ideia. Só sei que eles têm infestado esta área. Dia sim, dia não, eles aparecem por aqui. Eu não reclamo. Eles sempre pagam muito bem. – Olga olha de relance para a porta da cozinha. – Esperem um pouco. Vou tirar uma panela do fogo, e aproveito para trazer algo para vocês comerem.

- Ouviu isso? – Dom Aldo pergunta a Alfredo quando Olga se distancia. – Homens de Lorde Bainard infestando esta área... talvez meu instinto esteja certo.

Alfredo ainda não consegue entender o que está acontecendo. Por mais que ele tente, ele não consegue juntar uma coisa com a outra. Apesar desta área não ser particularmente próxima ao Castelo da Agulha, não seria tão incomum que soldados de Lorde Bainard aparecessem por aqui.

- O que está acontecendo, Dom Aldo? – ele pergunta. – Eu não consigo entender nada. O que Lorde Feros disse que fez você querer ir até a Agulha? O que Lorde Bainard tem a ver com tudo isso?

- Às vezes, a verdade te olha nos olhos, mas você se recusa a acreditar – o cavaleiro responde. Alfredo gostaria que ele fosse mais claro. A cada momento, ele se sente mais estúpido. – Meu pai estava certo quanto a uma coisa: não adianta nada ficar procurando por respostas que, mesmo que sejam achadas, só trarão mais problemas. Nossa única esperança de corrigir essa bagunça é achar o Príncipe João, se é que os boatos sobre a sua fuga são mesmo verdadeiros.

- E você acha que se ele estiver vivo...

- Se Dom Eduardo realmente o salvou, ele é esperto o suficiente para saber que as terras de Lorde Bainard são as mais seguras para o Príncipe. E agora isso... soldados da Agulha nesta área... você não vê? Meu instinto diz que eles estão procurando por algo. Por alguém. Lorde Bainard não perderia o tempo dele à toa. Pode ser que os boatos não sejam tão infundados assim.

Olga reaparece com pratos, e uma ajudante a segue com travessas de comidas. O cheiro da comida quase faz Alfredo babar.

- Carne de javali com batatas e legumes – Olga anuncia.

- Javali? – Dom Aldo diz, surpreso. – Você nunca foi tão generosa comigo. Alfredo, acho que ela gostou de você.

Alfredo apenas acena com a cabeça, com medo de que a saliva escorra pela sua boca se ele tentar falar algo.

- Seu amigo é meio tímido, não é? – Olga diz, rindo. – Esse javali é caça recente. Rufus o trouxe semana passada. Uma baita sorte. Quase não há mais javalis por aqui.

- E onde está Rufus agora? – Dom Aldo pergunta.

- Caçando. Ele tem passado o dia todo caçando. Precisamos de bastante comida para os soldados de Lorde Bainard.

- É claro.

A comida é posta na mesa e Olga junta-se aos dois. Alfredo mal olha para cima. Seu rosto está praticamente enterrado no prato.

- Vai com calma, campeão – diz Dom Aldo. – Você vai acabar se engasgando.

- Seja sincero comigo, Dom Aldo – diz Olga. – Devemos nos preparar para uma guerra no Punho? Nós não recebemos notícias só sobre a morte dos Scliros. Ouvimos falar que os Três Conselhos não conseguem chegar a um consenso sobre a sucessão de Lorde Lucas. – Ela pausa, parecendo desconfortável. – Os soldados da Agulha também falam que Lorde Dario e...

- Lorde Dario e meu pai podem ir para guerra um contra o outro? – Dom Aldo sugere. A possibilidade de uma guerra entre os dois principais Lordes do Punho é tão assustadora que Alfredo para de comer por um momento para prestar atenção. – Eu duvido. Algo me diz que Lorde Bainard apoiaria Lorde Dario, e meu pai não conseguiria lutar com os dois ao mesmo tempo. Ele sabe disso.

- Bom, eu espero que você esteja certo. Por que se uma guerra começar aqui, eu não sei como vou fazer com a pousada. Nos últimos anos, alguns milhares de camponeses migraram do Ninho para a Agulha por causa da Guerra dos Dois Irmãos. Você não imagina as histórias que eles contam.

- Eu consigo imaginar. Vamos torcer para que não chegue a isso.

Os dois terminam de comer, e Dom Aldo pega comida para o resto da viagem. Ele dá uma Serpente Dourada a Olga como pagamento.

- Isso é muito, Dom Aldo – ela diz, olhando para a moeda em sua mão. – Eu não tenho nem como te dar troco para isso.

- Não se preocupe – diz o cavaleiro. – Não precisa me dar troco, contanto que ninguém saiba que eu e meu companheiro estivemos aqui. Será nosso segredo.

- É claro – ela diz, guardando a moeda no bolso de seu avental. – Tem certeza que não quer um quarto para passar a noite? Vai escurecer em algumas horas.

- Obrigado, mas émelhor irmos embora. Ainda temos muito chão pela frente. Vamos dormir em algumlugar no meio do caminho.

Das Cinzas da Era PerdidaOnde histórias criam vida. Descubra agora