Victoria
Victoria Petros abre as pesadas cortinas de veludo que cobrem as janelas de seu quarto, permitindo a entrada dos primeiros raios de sol da manhã. O dia amanheceu frio. A cada dia que passa, a Terra do Amanhã aproxima-se de seu rigoroso inverno.
Victoria limpa o vidro embaçado e admira o nascer do sol por alguns instantes. Ela senta-se em uma poltrona, grande demais para seu tamanho, virada para a janela. Victoria gosta de coisas grandiosas. Embora seja apenas uma visitante no Castelo do Ninho, ela fez questão de que seus aposentos correspondessem à sua grandeza. As cortinas são verdes, a cor da Família Petros, com bordados em fios de ouro. A cama foi trazida diretamente do Castelo das Mil Folhas, pois nenhuma outra é boa o suficiente para Victoria. O resto do quarto é decorado com tapeçarias, quadros e estofados, todos feitos com materiais finos e decorados com as cores da Família Petros. Apesar do clima frio e estranho da Terra do Amanhã, a decoração faz com que ela se sinta em casa.
Alguém bate na porta.
- Entre – Victoria diz, sem tirar os olhos do sol nascente.
- Imperatriz Victoria, Dom Pacros está aqui para vê-la – diz uma de suas criadas.
- Pode mandar ele entrar.
Victoria ouve os passos leves e delicados de sua criada serem substituídos pelos passos firmes e decididos de Dom Pacros.
Ela se levanta para falar com o cavaleiro, que parou em frente à lareira, com as mãos abertas sobre o fogo. A luz das chamas ressalta as rugas no rosto de Dom Pacros, assim como a enorme cicatriz que ele tem no pescoço.
- Está com frio, Dom Pacros?
O cavaleiro vira-se para Victoria e inclina levemente a cabeça, em reverência.
- Eu sempre subestimo o frio da Terra do Amanhã, Imperatriz – ele diz. O cavaleiro veste roupas leves, com blusa e calça de linho, e um manto verde escuro. – Prefiro as manhãs quentes da Terra do Verde.
Dom Pacros observa Victoria por um bom tempo. Ela já está acostumada a ser encarada por homens. A Família Petros é notória por sua beleza, e Victoria não é diferente. Seus cabelos verdes e longos correm até o seu quadril, e brilham como a água dos rios ao refletir a luz do sol. Seu rosto é fino e delicado, sua pele pálida, e o azul de seus olhos fazem uma combinação sem igual com suas sobrancelhas verdes e seus lábios vermelhos.
Victoria gosta de se vestir em roupas de seda, todas verdes, que relevam as formas perfeitas de seu corpo. Ela não se lembra de jamais ter tido uma conversa com alguém – homem ou mulher – que não passasse um longo tempo admirando sua beleza.
- Eu também sinto falta do nosso clima – Victoria diz. – Mas há outras coisas mais urgentes ocupando minha cabeça agora. Já acharam o menino?
- Não – Dom Pacros admite. Já faz duas semanas, e o cavaleiro está visivelmente frustrado. – Nós ainda estamos procurando, mas até agora não há nenhum sinal dele. Hoje eu vou lidar com os soldados que estavam de guarda nos muros do castelo e que ainda não tinha conseguido interrogar.
- E vai fazer o que com eles? Eu soube do que você fez com alguns soldados nos últimos dias. Não se esqueça que a guerra ainda está longe de seu fim. Nós vamos precisar desses homens.
- Nós vamos precisar de soldados leais e competentes, Majestade – Dom Pacros diz. – E não se preocupe, eu entendo o suficiente sobre guerras para saber o que fazer.
Dom Pacros sempre foi petulante. A esta altura, Victoria não se incomoda tanto com suas respostas atravessadas. Contanto que ele permaneça leal à Família Petros, ela está disposta a aguentar o temperamento do cavaleiro.
- E quanto ao cerco do Ninho?
- Está praticamente desfeito, embora ainda haja muitos soldados do Punho e Sulistas na Cidade da Planície. Não se preocupe. Eles não vão durar muito.
- E onde está o meu pai?
- No salão principal, quebrando o jejum com Lordes Lucas, Baliol e Soto.
- Imperador Lucas, você quer dizer.
- É claro, Majestade – Dom Pacros diz, com um sorriso debochado. – Não sou tão hábil com títulos como sou com a espada.
- Você disse que Miro Soto está com eles também? – Victoria pergunta, intrigada. – Ele já ganhou o título de Lorde?
- Sim. O Imperador disse que ele sempre cumpre a sua palavra.
- Mas o Senhor Soto não cumpriu a dele. O acordo era que teríamos a cabeça de Jonas e seu filho. Até onde eu sei, apenas metade do acordo foi cumprido.
- Não por culpa de Lorde Soto – Dom Pacros retruca. – O menino estava debaixo do nosso teto. Nós o deixamos escapar.
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Das Cinzas da Era Perdida
FantasyUma traição põe fim à Guerra dos Dois Irmãos e arrasta o Império para um novo conflito. Novas alianças se formam na luta pelo poder, enquanto outros lutam pela sobrevivência em meio ao caos.