Dom Eduardo
O cavaleiro conduz João para fora do salão e, assim que tem certeza que está longe dos olhares de qualquer nobre, o pega em seu colo. Apesar de sua maturidade e orgulho, esta é uma das ocasiões em que o Príncipe não se importa de ser tratado como uma criança. Exausto, ele rapidamente adormece.
Ao entrar no quarto, Dom Eduardo deita o Príncipe em sua cama, retira sua brigantina, e o cobre.
- Onde você vai? – ele pergunta, sonolento, quando o cavaleiro já estava se retirando do quarto.
- Seu pai ordenou que eu voltasse ao salão. Mas não se preocupe. Em breve eu volto para dormir, e vou deixar meus melhores homens de guarda na sua porta.
- Tá bom... – diz o Príncipe, fechando os olhos.
Dom Eduardo observa o jovem Príncipe adormecer. Ele aperta firmemente o punho de sua espada. Deixar o Príncipe sozinho sempre deixa Dom Eduardo inquieto. São ordens do Imperador, ele pensa. Eu não tenho escolha.
Ao sair do quarto e fechar a porta, o cavaleiro dá instruções aos soldados de guarda no corredor. Caso qualquer coisa aconteça em sua ausência, Dom Eduardo quer ser avisado imediatamente.
Ele anda apressadamente pelos corredores mal iluminados e úmidos do castelo, em direção ao salão principal. Ao chegar lá, encontra-o consideravelmente mais vazio que antes. Ele avista Rosso sentado em uma das mesas, e anda em sua direção.
- Ele pediu para você ficar também? – Dom Eduardo pergunta ao se sentar.
- Sim – Rosso responde, revirando os olhos. – Não sei por quê. Se ele quiser ganhar uma guerra ou matar alguém, eu sou o homem certo. Mas eu não sou um burocrata ou um nobre para discutir fronteiras.
- Não reclame tanto. Ele sabe que você é bom com a espada. Ele pediu para você ficar porque se sente mais seguro com você por perto. Você deveria se sentir honrado.
Desta vez, Lorde Lucas é o primeiro a se levantar para se pronunciar. As chamas das tochas que iluminam o salão tremulam em seus olhos dourados, refletidas em suas pupilas. A expressão em seu rosto, de traços pontudos e agressivos, é fria como uma rocha.
Mesmo nos movimentos mais sutis, Lorde Lucas exibe elegância única. A cada gesto, parece que cada milímetro de seu corpo se move na direção certa, como a água de um rio que corre com fluidez e naturalidade. É com esta incomparável elegância que ele ergue sua taça para mais um brinde.
- Que esse seja um recomeço para todos nós, Majestade – ele diz. – E que a paz que selamos hoje dure por milênios.
O Imperador acena com a cabeça a sua concordância e bebe da sua própria taça.
- Como sinal da minha sinceridade, ofereço um presente a Vossa Majestade. – Lorde Lucas empunha sua espada, e imediatamente todos os soldados Imperiais empunham as suas próprias espadas em resposta. Dom Eduardo e Rosso fazem o mesmo, levantando-se abruptamente com suas espadas em mãos. Lorde Lucas observa a todos com um frio olhar. Vagarosamente, ele coloca a sua espada sobre a mesa, na frente do Imperador. – Majestade, esta é a Lâmina da Razão, com a qual Lorde Petros gentilmente me presenteou no dia de meu casamento. É o que eu tenho de mais valioso, e por isso a ofereço a Vossa Majestade como sinal de minha lealdade.
Dom Eduardo suspira aliviado, embora não guarde sua espada na bainha. Rosso permanece em pé ao seu lado, também com sua espada empunhada.
- Muito obrigado, Lorde Lucas – o Imperador responde, olhando de relance para a espada posta na mesa à sua frente. – É um presente formidável.
Sem aguardar que Lorde Lucas volte se sentar, Lorde Baliol se levanta. O Imperador vira-se para ele, confuso. Lorde Baliol nada diz. Com um movimento brusco, ele tira uma faca de seu cinto.
Dom Eduardo observa, em choque, a lâmina da faca se projetar, ensanguentada, para fora do pescoço de seu Imperador. O barulho de engasgue é seguido pelo sangue que jorra em abundância da boca do Imperador Jonas Scliros.
- Majestade! – Rosso grita.
Para Dom Eduardo, o grito parece distante, como se viesse de outro mundo.
Lorde Lucas pega a espada posta sobre a mesa na frente do Imperador e, com um movimento ágil, golpeia-lhe o pescoço. A cabeça do Imperador rola sobre a mesa até cair no chão, deixando um rastro de sangue sobre o tecido de linho branco. Por um momento, Dom Eduardo tem a impressão de que os olhos dourados do Imperador estão fixados nos seus, suplicando por ajuda.
Esta é a última visão clara que Dom Eduardo tem por um bom tempo. Nas horas seguintes, o mundo parece um borrão e a única clareza vem do som das espadas colidindo uma com as outras.
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Das Cinzas da Era Perdida
FantasyUma traição põe fim à Guerra dos Dois Irmãos e arrasta o Império para um novo conflito. Novas alianças se formam na luta pelo poder, enquanto outros lutam pela sobrevivência em meio ao caos.